Atletiba, Flamengo e Botafogo, Corinthians e Santos… hoje está todo mundo comentando pelo menos um desses confrontos de ontem. Mas o Estadão do domingo deu espaço a um outro tipo de embate. Publicou uma entrevista do matemático norte-irlandês John Lennox, da Universidade de Oxford, defensor do Design Inteligente. E, apenas na internet, colocou uma “réplica” do professor Diogo Meyer, da USP, especialista em Genética.
É até possível questionar o modus operandi do jornal, que não deu tréplica a Lennox. Meu amigo Wagner fez um comentário interessante a respeito: “nunca vi esse ‘outro lado’ quando o entrevistado é alguém que defende o ateísmo”. Mas a mesa redonda fica para os comentaristas, depois. Aqui, vamos aos melhores momentos e aos lances polêmicos.
A entrevista de Lennox é mais um ataque ao ateísmo militante, o de Dawkins e companhia, e começa bem, mostrando o absurdo da pergunta “quem criou Deus?” Ora, se Deus é o “incriado” (do contrário não poderia ser Deus), a pergunta realmente não faz sentido, embora volta e meia encontremos quem não consiga compreender o absurdo da questão. Mas, quando ele tenta defender o DI dizendo “Agora, você acha que o fato do universo ser inteligível é evidência do quê? De uma inteligência superior que o criou, ou de um processo aleatório e despropositado?”, temos um carrinho no mínimo imprudente. E é esse o problema que eu vejo no DI (embora eu reconheça que preciso ler mais sobre o assunto, coisa que está na minha lista de tarefas para o futuro próximo): está mais para filosofia que para ciência exata, pois a hipótese que lança é muito difícil de ser comprovada em laboratório.
É verdade que o repórter, em alguns momentos, tem atuação apagada. Convenhamos, uma pergunta do tipo “O senhor acredita que Deus criou uma única forma de vida primordial, da qual todos os seres vivos evoluíram, ou que todas as espécies foram criadas por Deus da maneira como existem hoje?” parte para os extremos e ignora tudo que existe entre eles. Jogar pelas pontas pode funcionar no gramado, mas ficar só nisso complica o jogo.
No fim, o matemático ainda usa um lance de efeito: “sem Deus, não se pode chegar do nada a alguma coisa. Sem Deus, não se pode chegar do material ao vivo. Sem Deus, não se pode chegar do animal ao humano. Acredito nisso não por uma questão de fé, mas porque é o que as evidências me levam a crer.” Ficamos sem saber que evidências são essas. Eu até chego a concordar com a primeira e a terceira afirmações (considerando que entre o animal e humano existe uma diferença de ordem sobrenatural, e não biológica). Já a segunda afirmação (sobre a origem da vida biológica), para mim, é duvidosa. Verdade que até agora nunca se conseguiu criar vida em laboratório. Mas quem garante que isso não pode ocorrer?
A resposta de Diogo Meyer é um ataque ao DI, não à religiosidade, tanto que logo no começo o professor da USP admite a compatibilidade, embora a reconheça difícil. O texto está bem armado e, se não chega a dar um banho tático em Lennox, aproveita bem os buracos deixados pelo norte-irlandês, lembrando por exemplo que aleatórias são as mutações, e não a seleção natural em si. Meyer é cauteloso e não ataca como louco, pois evita considerações sobre a origem da vida. Reparem também que ele contesta a afirmação de Lennox de que “sem Deus (…) não se pode chegar do animal ao humano”, aquela com a qual eu disse que concordava; mas o contra-ataque de Meyer considera apenas o fator biológico.
Conclusão: gol de placa, como o da Vila Belmiro, não houve. Mas não dá pra negar que o embate é interessante.
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