Na próxima quarta-feira, o Vaticano inicia uma conferência internacional sobre o uso de células-tronco adultas que deve durar três dias e reunir especialistas na pesquisa com este tipo de células, bioeticistas, autoridades da Igreja e formuladores de políticas públicas.
Em julho, eu já havia comentado no blog sobre a parceria entre o Vaticano (mais especificamente, o Pontifício Conselho para a Cultura) e o laboratório NeoStem, que inclui até financiamento do Vaticano para o estabelecimento de uma funcação. A repórter Barbara Hagerty, da National Public Radio norte-americana, retomou o assunto entrevistando Robin Smith, CEO da NeoStem; o padre Tomasz Trafny, chefe do departamento de ciência e fé do Pontifício Conselho para a Cultura; Sean Morrison, especialista em células-tronco da Universidade do Texas; e o padre Tadeusz Pacholczyk, neurocientista e diretor de educação do Centro Nacional Católico de Bioética.
Morrison teme que a parceria entre o Vaticano e o laboratório seja mais uma ação da Igreja Católica para desmoralizar a pesquisa com embriões, que ainda não trouxe nenhum benefício concreto, enquanto as pesquisas com células-tronco adultas continuam muito promissoras, com uma série de resultados, e cita uma campanha publicitária deflagrada por católicos no estado norte-americano do Michigan quando os eleitores de lá precisaram decidir sobre a legalidade da pesquisa com embriões. Pelo que Morrison descreve, alguns anúncios eram mesmo bizarros, como o das pessoas vestidas de vaca. Mas quem realmente garante que não se criaria um mercado, ainda que clandestino, de clonagem para fins de retirada de células-tronco?
O padre Pacholczyk defende que quaisquer erros nessas campanhas devam ser corrigidos, mas lembra também que, na tentativa de levar adiante suas pesquisas, cientistas ignoram os argumentos morais. Eu acrescentaria inclusive que também recorrem à desinformação, e até mesmo à chantagem emocional: não há outra expressão para descrever a cena dos cadeirantes em Brasília durante a votação da Lei de Biossegurança no Congresso e o julgamento da ação de inconstitucionalidade contra a pesquisa com embriões, que chegou ao Supremo. Provavelmente ninguém se lembrou de dizer ao menino de 9 anos que “só pensa em jogar futebol e pular” que seu sonho, caso seja mesmo realizado, ainda vai levar muito tempo. Quem é que colocou na cabeça do menino que a cura viria de um dia para o outro? A Igreja é que não foi.
Claro, se despejarem dinheiro suficiente na pesquisa com embriões, os resultados devem aparecer, diz o padre Pacholczyk. Até por isso, “elas não funcionam” é o pior dos argumentos contra o uso de células embrionárias. A pergunta que realmente importa, afirma o sacerdote, não é “podemos fazer isso funcionar?”, e sim “deveríamos fazer isso?” É o tipo de consideração ética que os cientistas preferem enterrar, na argumentação do padre, e é justamente onde a religião mais pode colaborar com a ciência. Claro, isso onde não prevalecer um certo laicismo (que está mais para “laicinismo”) que pretende silenciar a religião na esfera pública (quanta tolerância, não?) e confiná-la aos espaços privados.
Prêmio Top Blog 2011
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