Ni Hao,
Eu tenho uma teoria de que todo o ocidental que escolhe vir morar na China não é perfeitamente normal. Não estou querendo dizer que somos loucos ou algo parecido, mas acho que todos nós temos, no mínimo, algo de não convencional.
Ou, indo ainda mais longe na minha loucura (fazendo jus ao título deste post), nós ocidentais, que estamos hoje morando aqui, somos a comprovação da teoria da seleção natural de Darwin. Já que a China dominará o mundo num futuro breve, nós e nossos filhos já estamos em processo de adaptação dos fenótipos. Daqui a milhões de anos, nossos esqueletos serão encontrados próximos a potes de macarrão instantâneo, com dois pauzinhos entre os dedos. Bom, pelo menos esta é a minha explicação para conseguirmos viver num ambiente cercado de paranoia como o que vivemos hoje em dia.
Desde que cheguei aqui, sou todos os dias advertida sobre perigos invisíveis, conspirações camufladas, segredos irreveláveis. Se fôssemos levar tudo isso a ferro e fogo, nos trancaríamos em casa para sempre e desenvolveríamos algum tipo de TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo) como, por exemplo, lavar nossos kuaizi (chopsticks) a cada cinco minutos para evitar a contaminação por alguma bactéria de olhos puxados.
A esta altura do campeonato, vocês já devem estar dizendo “Coitada da Chris! Está enlouquece no seu terceiro ano de China!” Bom, para provar que não estou maluca, pelo menos por enquanto, vou dar alguns exemplos mais comuns dos “perigos perigosíssimos” que nos cercam.
Ar
Todos sabem que o ar da China é poluído. Em dias enevoados, estamos sempre na dúvida se é poluição, excesso de umidade ou névoa mesmo. A verdade é que o céu azul do Brasil praticamente não se vê em Shenzhen. Aliás, quando chegamos aqui na época da Universiade em 2011, evento esportivo que reune estudantes do mundo inteiro, o céu estava azulzinho. Terminado o evento, uma nuvem escura tombou sobre a cidade. Na época, ouvi dizer que as fábricas tinham sido proibidas de funcionar durante os dois meses do evento para que os estrangeiros pensassem que aqui não havia poluição.
Verdade ou paranoia?
Água
Todos sabem que não é possível beber água da bica, mesmo no Brasil. Só que dizem que água da bica de Shenzhen possui níveis muito altos de metal e sal. Não sei se isso pode fazer muito mal para o nosso corpo, mas para os três peixinhos que o Luiz ganhou de aniversário foi fatal! Eles foram morrendo em sequência, um a cada dia. Para piorar um pouco a paranoia, li uma matéria na revista da comunidade de expatriados sobre um teste que foi feito com a água engarrafada que usamos em nossa casa. Todas as marcas tinham nível de sei lá o que mais alto do que deveriam. Esqueci o que era o “sei lá o que” de propósito. Para nosso consolo, uma amiga americana disse que descobriu, recentemente, que o filhinho de seis anos vinha bebendo água da bica há um tempão. O garoto parece normal. Pelo menos por enquanto.
Verdade ou paranoia?
Frutas e Vegetais
Logo que cheguei, bebia todos os dias um suco hiper saudável que aprendi no Brasil: couve, alface, salsinha e limão (devidamente adaptado já que aqui nenhuma dessas três folhas se encontra facilmente). Aí, um belo dia, a Liu foi ao médico por conta de dores de cabeça, insônia e calores (reconhecem os sintomas, amigas de meia idade?) e o médico a proibiu de tomar o suco que a maluca da patroa ocidental dava para ela. E por quê? Porque na China não se deve comer nada cru!
Quanto às frutas, às vezes compro maçãs gigantescas que me fazem lembrar um episódio dos Simpsons, quando os peixes perto da fábrica onde o Homer trabalha começaram a aparecer com três olhos. Uma amiga disse que descascou uma laranja cuja casca fedia a inseticida. Outra me advertiu sobre frutas de casca muito grossa, como a melancia, pois a concentração de agrotóxicos é imensa!
Verdade ou paranoia?
Ovos e carnes
De 2011 até hoje, já recebemos duas ou três advertências oficiais do Governo sobre o vírus H1N1ou H3N2 ou H5 x (N3 + N4) elevado a 2, sei lá. Só sei que, como aqui em Shenzhen a gente come basicamente ovo, frango e carne de porco, o negócio é dar uma rezadinha antes das refeições e entregar para Deus.
Sal
O sal daqui é um veneno para quem tem pressão alta. Um amigo piloto se viu numa situação de quase demissão por conta da sua condição de saúde. Descobriu que era o sal e substitui por um importado com menos sódio.
Pão
O Dudu fez uma experiência na Feira de Ciências da escola que consistia em deixar fatias de pão em locais diferentes para ver qual delas desenvolvia fungos mais rapidamente. Por acaso, fizemos a experiência com pão de forma chinês e pão de cachorro quente que compramos no supermercado internacional. Adivinhem? O pão chinês simplesmente não mofou! O que será que eles colocam no pão que nem fungos ousam se aventurar?
Leite
Esse é punk! Em 2008, um problema no leite chinês matou seis crianças e deixou outras 300 mil doentes. Ninguém compra leite chinês por aqui, a não ser nós. Outro dia o Luiz saiu do supermercadinho aqui debaixo com um caixa de leite nas mãos e um chinês veio perguntar se ele não tinha medo beber. Com a criançada que temos em casa, amamentada no peito até quase um ano de idade, só temos duas opçõe$: ou compramos uma vaca ou continuamos comprando leite chinês. Até porque uma chinesa me disse que, mesmo as marcas estrangeiras produzem e engarrafam o leite na China, embora na embalagem esteja escrito diferente.
Verdade ou paranoia?
Bebida alcoólica
Para piorar a situação, minha mãe volta e meia me envia matérias de jornais brasileiros sobre os perigos de se viver na China (acho que para nos convencer de voltar logo!). Uma delas era sobre bebida alcoólica contaminada. Fernando, que trabalhou em restaurante aqui em Shenzhen, nos avisou que às vezes nem o dono do bar sabe se, entre as garrafas compradas dos fornecedores supostamente idôneos, se encontram garrafas falsificadas. Para melar de vez nossos momentos de laser, outra matéria dizia que o óleo usado por alguns restaurantes de Shenzhen era retirado do esgoto. Esgoto??? Agora exagerou! Ponto para minha mãe!
Mas fora a comida, ainda somos obrigados a conviver com várias outras paranoias. Dizem que não limpam a piscina do condomínio e que já viram gente escarrando lá dentro. Bom, a foto aqui da minha varanda não parece comprovar esta teoria.
As manicures não esterilizam os alicates. Ou melhor, esterilizam do jeitinho chinês: borrifando álcool (ou água?) neles entre uma cliente e outra. Eu tenho o meu próprio alicate e não abro mão. Aliás, abro sim quando me esqueço de levar o meu. Solução: além de rezar antes de comer frango, rezo também antes de fazer as unhas.
Mas, se você ficar doente por conta dessas coisas todas, pode ir ao hospital e sair de lá cheio de remédio chineses. Nós já entendemos, empiricamente, que o remédio chinês é placebo e que o que resolve mesmo é o remédio ocidental. Os médicos chineses, que até pouco tempo atrás complementavam sua remuneração ganhando comissão sobre a venda de remédios, sempre prescrevem 3 ou 4 remédios diferentes e somos praticamente obrigados a comprá-los na farmácia do hospital. O pior é que, passada a doença, a gente não consegue se lembrar mais para que servem os remédios e muito menos ler o que está escrito nas caixas.
Para escrever este post, fiz algumas pesquisas na Internet e descobri detalhes sórdidos sobre tudo que pesquisei. Mas será que dá para confiar no que li? Será que todas essas matérias não foram censuradas? Por que o Google está tão lento hoje? Será que descobriram que eu uso um VPN?
Verdade ou paranoia?
Bem, leitores, de duas uma: ou vamos sobreviver a tudo isso e seremos o ele perdido entre o resto do mundo e a China, ou em vez de encontrarem nossos fósseis com pauzinhos nas mãos, irão encontrar ocidentais de três braços, duas cabeças e… acho que estou realmente ficando paranoica!
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