Menos salmão e mignon. Chega de nhem nhem nhem. E nem a desculpa que “se tirar do cardápio os clientes fugirão” cola. Não é bem assim. Quem cozinha tem obrigação de sair do lugar comum, sem esquecer da qualidade, claro.
Com a fama e a influência que os chefs têm hoje é obrigação apresentar um cardápio mais criativo que contribua também para melhorar o paladar e a saúde dos seus clientes. Cozinheiros e cozinheiras devem estar conectados com o que acontece no mundo.
Mais sabor
E o mundo está falando de tantas coisas que dão sabor como, fermentação, mel das abelhas nativas sem ferrão, orgânicos, produtos locais, uso de receitas clássicas, plantas alimentícias não convencionais e processos artesanais, por exemplo.
Aliás, começamos a falar nisso há cinco anos, com o projeto Gastronomia Paraná, e já tardiamente. Agora, a onda estourou na praia e vai tocando muita gente que, para a nossa salvação, começa a olhar com mais atenção para o seu entorno e para ingredientes até então menosprezados. Pessoas que olham para a história das suas vidas.
Os clientes não merecem cardápios sempre iguais, repetidos em muitos e muitos restaurantes iguais, e uma profusão de pratos com mignon e salmão. Sem falar nas churrascarias que servem sushi, de salmão, claro, ou com queijo, morango e goiabada só porque está na moda e todo mundo pede.
É preciso originalidade para chamar atenção. Também tome cuidado com a indústria, lembre-se como fomos infelizes com algumas trocas que já fizemos no passado, margarina por manteiga, só para citar uma delas.
Vilão
Não vou entrar na discussão sobre se o salmão de cativeiro é saudável. Parecem existir defensores gabaritados de ambos os lados e muitos boatos por toda parte. O problema é simples. Não existe salmão para todo mundo se não houver criadouros.
A questão é outra. Falo de monotonia alimentar. Minha colega já falou aqui. Muitos estudos mostram que uma dieta saudável será a com uma riqueza de nutrientes vindas de diversas fontes. Pode ser que o peixe de cativeiro esteja mais suscetível a doenças, que é melhor o peixe comer outros peixes e crustáceos do que ração, sem dúvida, então, se desconhecemos a origem do peixe, isso seria o ideal, pelo menos podemos variar comendo ceviche porque a acidez do limão elimina um dos parasitas encontrados no salmão de cativeiro.
Isso se aplica ao frango de granja. O problema continua sendo o sabor. Melhor não comer com tanta frequência. Daí a importância de os restaurantes oferecerem opções mais variadas.
Sem alarde
Ainda comento duas notícias recentes que nos empurram para mais reflexão sobre os nossos cardápios. A primeira sobre as emissões dos gases do efeito estufa que foi de 9% em 2016. E nós somos a única economia do mundo que aumentou a poluição e diminuiu a geração de riquezas. As causas? Desmatamento da Amazônia, produção agropecuária e o uso de fertilizantes.
Outras partes do boi devem ser valorizadas, parece uma conclusão óbvia. Saiba mais na entrevista do comentarista Bruno Blecher e do âncora da CBN Carlos Alberto Sardenberg com o coordenador do “Inventário nacional sobre o efeito estufa” Eduardo Assad. Está disponível no site da rádio para quem se interessar. Link aqui.
Assad joga um pouco de luz na questão. Hoje, produzimos numa área menor, o gado antes era abatido com quatro anos, hoje com dois, já usamos sistemas integrados que é típico de áreas tropicais, isso é, estamos plantando árvores no pasto, o que é um alento. Mas ainda temos muito a fazer.
A outra notícia nos informa que esta terça-feira é o Dia Mundial da Diabetes e que somos o quarto país com o maior número de casos, 90% dos doentes têm a diabetes do tipo 2, causadas por obesidade e sedentarismo, ou a que surge em idade avançada. São 14 milhões de pessoas, a metade nem sabe que tem. Todos comendo muito mal.
Isso sem pensar em que história queremos escrever para a geração futura. O que deixaremos para ela? Que nós sabíamos copiar? Qual é a nossa memória? Qual é a cozinha paranaense ou brasileira?
Aproveito para falar do movimento da chef Roberta Sudbrack, o que renderia muitas colunas. Já devem saber o que aconteceu com os queijos artesanais que ela usaria em um evento. Foram para o lixo. É nossa obrigação ajudar a pressionar a mudança da legislação vigente que abafa os pequenos produtores e afasta os sabores originais da nossa cozinha. Assine o manifesto aqui
E saiu um textão. As letras foram esgueirando-se, espremendo-se, virando palavras e dando um jeito de saltar num trampolim para uma piscina de águas turvas. Imediatamente, veio na cabeça o ensinamento de Carl Jung, que não custa nada repetir aqui, “… a mente criativa age sobre algo que ela ama”. Sem contraindicação e para usar quando estiver pensando no novo cardápio.
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