O governo tem indicado que, pela primeira vez em 12 anos, não vai reajustar a tabela do Imposto de Renda. Com a inflação elevada – o IPCA foi de 10,67% no ano passado e chegará perto de 7% neste ano – muitos contribuintes correm o risco de subir de faixa e pagar mais imposto mesmo sem ter aumento real em seus rendimentos.
No ano passado, o Ministério da Fazenda estimou que o reajuste das faixas de renda, que então variou de 4,5% a 6,5%, provocou perda de arrecadação de R$ 6 bilhões. Se não atualizar a tabela neste ano, portanto, o governo vai arrecadar mais.
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O governo é “sócio” antigo da inflação na questão do IR. Embora as faixas de renda tenham sido elevadas todos os anos a partir de 2005, na maioria das vezes o reajuste ficou abaixo do IPCA. Em 2015, quando o índice de preços beirou os 11%, a diferença – em prejuízo dos contribuintes – foi de quase 5%, em média, a mais alta desde 2004.
A defasagem desde 1996 passa de 70%, segundo cálculo do Sindifisco Nacional, representante dos auditores fiscais da Receita. A maior parte do resíduo é herança do governo FHC, que passou seis anos sem atualizar as faixas de renda.
7,6%
Da arrecadação tributária do país vem do IR. Nos países da OCDE, a fatia é de 24%, em média. Isso ocorre porque o Brasil tributa mais a produção e o consumo do que a renda. Com isso, os mais pobres pagam proporcionalmente mais impostos que os ricos.
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Se nas últimas duas décadas a correção da tabela tivesse acompanhado a inflação, contribuintes que hoje ganham até R$ 3.250 por mês ficariam livres do imposto. A faixa de isenção atual, no entanto, é de pouco mais de R$ 1,9 mil.
“Ao não atualizar a tabela, indiretamente o governo está aumentando a carga tributária, e sem lei”, diz o advogado tributarista André Mendes Moreira, do escritório Sacha Calmon-Misabel Derzi. Para ele, a não correção contraria a Constituição, que obriga o poder público a adequar a tributação à capacidade do contribuinte.
A questão, segundo Moreira, nunca foi analisada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF). Os precedentes são favoráveis ao governo: em pelo menos duas ocasiões, em 2011 e 2012, a segunda turma da Corte entendeu que não cabe ao Poder Judiciário impor a atualização da tabela.
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Reação
“Do ponto de vista orçamentário, a não correção da tabela tem efeito significativo para os cofres públicos. Mas, a meu ver, é uma conta que será cobrada lá na frente, porque a reação será muito forte”, diz a economista Maria Emília Miranda Pureza, consultora de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados.
O histórico recente indica que o governo terá dificuldades em levar sua pretensão adiante. No início de 2015, a presidente Dilma Rousseff vetou uma emenda que reajustava a tabela em 6,5%, acima dos 4,5% pretendidos pelo governo. Após quase dois meses de negociação, Planalto e Congresso chegaram a um meio-termo, o reajuste escalonado.
Imposto sobre lucro renderia R$ 43 bilhões
Fernando Jasper
Deixar de corrigir a tabela do Imposto de Renda é um jeito fácil de arrecadar mais. Mas estudiosos defendem alternativas capazes de aumentar a receita e de tornar o Imposto de Renda mais justo.
Uma dessas propostas, encampada pelo Conselho Federal de Economia (Cofecon), é a retomada da tributação sobre lucros e dividendos, extinta em 1995. Nas contas da instituição, uma alíquota de 15% aumentaria a arrecadação em R$ 43 bilhões.
Estudos indicam que a atual isenção provoca concentração de renda. Segundo os economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, do Ipea, 71 mil brasileiros ganham mais de 160 salários mínimos por mês. Em média, cada um paga apenas 2,6% de imposto sobre sua renda, principalmente porque a maioria recebe lucros e dividendos, livres de IR.
Enquanto isso, os contribuintes de classe média alta, com renda entre 20 e 40 salários mínimos, entregam ao Leão 10,2% de seus rendimentos. Muitas dessas pessoas obtêm a maior parte de seus ganhos do trabalho, pagando alíquotas de até 27,5%.
Para Júlio Miragaya, presidente do Cofecon, ao aumentar a carga tributária sobre a renda, o governo pode baixar os tributos sobre a produção e o consumo. “Teríamos uma distribuição mais justa dos impostos e, ao mesmo tempo, estimularíamos a atividade econômica”, diz.
O tributarista André Mendes Moreira é contrário ao fim da isenção. “É ilusão pensar que só os ricos recebem lucros e dividendos. Donos de empresas de pequeno porte também”, observa. ”Os dados comprovam que a isenção estimulou empresários a aderir à formalidade.”
NOVA ALÍQUOTA
Outra proposta para aumentar a progressividade do IR é recriar a alíquota de 35%, que vigorou entre 1995 e 1996. O pesquisador Fábio Ávila de Castro, da Universidade de Brasília, calcula que a medida teria impacto de R$ 18,6 bilhões, em valores de 2012.