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Alexandre de Moraes
Segundo juristas e a defesa do réu, além de atropelar o regimento interno do STF, o ministro Alexandre de Moraes estaria em desacordo com o CPP e com o Pacto de San José da Costa Rica| Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

Mesmo antes do fim do julgamento de um recurso da defesa, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, mandou prender o marceneiro Moisés dos Anjos, de 61 anos, no âmbito do inquérito que apura a participação nos atos do 8 de janeiro.

A ordem de prisão foi cumprida na sexta-feira (26) apesar de Moisés ainda aguardar a apreciação de um agravo regimental por parte do ministro André Mendonça.

Moisés passou oito meses preso na Papuda até conseguir a liberdade provisória mediante imposição de medidas cautelares.

No dia 7 de novembro de 2023 a maioria dos ministros do STF votou pela condenação de Moisés a mais de 16 anos de prisão. A condenação de Moisés foi formalizada com a publicação do acórdão em 16 de fevereiro de 2024.

No dia 4 de março, a defesa de Moisés entrou com embargos infringentes - recurso que pode ser usado contra acórdão não unânime - pedindo a revisão da pena. O ministro Alexandre de Moraes negou o recurso monocraticamente.

Após a negativa de Moraes, a defesa entrou com um agravo regimental no dia 25 de março. O recurso é automaticamente direcionado para apreciação dos ministros durante sessão do Tribunal. O recurso entrou para votação no plenário virtual do dia 12  a 19 de abril de 2024.

Novamente, Moraes votou contra o recurso em que a defesa pedia apenas para que os embargos infringentes (recurso anterior) fossem apreciados. Além de negar o agravo regimental, no meio do julgamento, no dia 17 de abril, Moraes expediu a ordem de prisão contra o senhor Moisés.

Acontece que dois dias antes, em 15 de abril de 2024, o ministro André Mendonça havia pedido vistas no julgamento do agravo regimental. De acordo com o regimento interno da Corte, um pedido de vistas suspende o julgamento por até 90 dias.

Ao conversar com a Gazeta do Povo, nesta terça-feira (30), a advogada Shanisys Virmond - responsável pela defesa do senhor Moisés - disse que ao determinar a prisão do réu antes do fim do julgamento do recurso, Moraes atropelou o regimento do Tribunal e o colega de Corte.

Ao pedir o relaxamento da prisão de Moisés, a advogada destacou o artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de prisão cautelar ou em virtude de condenação criminal transitada em julgado”.

Shanisys Virmond ainda explicou à Gazeta que a redação atual do artigo 283 é resultado do julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade que culminaram na soltura do presidente Lula (PT), em 2019.

Antes da alteração do artigo, a prisão antes do trânsito em julgado era permitida, mas o caso do petista mudou o entendimento sobre o tema.

O caso a que se refere a advogada se deu quando o STF derrubou a prisão após condenação em segunda instância e determinou que um condenado só pode ser preso após o trânsito em julgado, alterando um entendimento adotado pela Corte desde 2016.

Imediatamente após decisão do STF, em 7 de novembro de 2019, seis condenados na Lava Jato entraram com pedidos de liberdade. O pedido de Lula foi atendido e o petista foi solto no dia seguinte à decisão.

“Tal fato foi de elevada importância para o cenário brasileiro, pois culminaram na soltura do atual presidente da República no dia seguinte ao julgamento. A lei que tirou do cárcere um ex (agora atual) presidente da República, tem a mesma eficácia para tirar qualquer cidadão, isto que, a lei é (ou deveria ser) igual para todos, independentemente de classe social, sexo, religião ou ideologia política. A justiça, quando cega só de um lado, não é justiça”, disse a advogada no pedido de soltura de Moisés enviado a Moraes no dia 27 de abril.

Juristas consultados pela Gazeta do Povo disseram que agravos e embargos compõem o acórdão e a condenação deve ser cumprida apenas após acórdão transitado em julgado a não ser que a prisão tenha se dado por descumprimento de alguma ordem cautelar, o que não é o caso do senhor Moisés.

Um dos juristas ainda citou o Pacto de San José da Costa Rica, tratado internacional do qual o Brasil é signatário

No artigo 8º, o tratado diz que “toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa".

Neste sentido, além de atropelar o regimento interno do STF, a decisão de Moraes estaria em desacordo com o Código de Processo Penal e com o tratado internacional de San José da Costa Rica.

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