| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

A Bahia dominou por tantos séculos o cenário nacional do cacau que pouca gente sabe que a primeira muda plantada em território baiano com fins de cultivo, no século 18, veio do Pará. Ainda assim, o Pará passou décadas engatinhando na produção nacional - menos de cinco anos atrás, ainda respondia por apenas 26% do total. Neste ano, porém, por causa da seca que detonou a safra na Bahia, o úmido Pará deve assumir a dianteira pela primeira vez. Pode ser que no ano que vem a Bahia volte ao topo, mas não dá mais para ignorar a produção paraense.

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Pois cacau não é tudo a mesma coisa; chocolate muito menos. O terroir - que pode ser notado em chocolates de origem, sem misturas com amêndoas de outras terras - qualifica cada região e até microrregiões dentro dos Estados. De modo geral e simplificado, o Pará produz cacau com mais gordura e notas frutadas, enquanto a Bahia, um fruto de toques mais cítricos, explica o empresário Marco Lessa, organizador do Festival do Chocolate e Cacau, que chegou à quarta edição em Belém há duas semanas e é realizado em Ilhéus, na Bahia, desde 2009.

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Ainda é muito pequena a parte da produção processada no País como chocolate de origem - cerca de 2% no Pará e 6% na Bahia. Mas é esse o novo grito do ramo, mesmo com o cacau custando quase quatro vezes o valor do cacau comum. O movimento se iniciou em fazendas da Bahia há alguns anos, com produtores dedicados a fermentações mais longas e controladas - como João Tavares, que já ganhou prêmios no Salão do Chocolate em Paris.

No Pará, onde produtores também passaram a dar atenção a isso, marcas como De Mendes, Nayah, Amazônia Cacau e CacauWay fazem chocolate de origem. E ainda tem dona Nena (conheça a sua história e o processo de produção do seu chocolate), que vende seu chocolate para restaurantes como D.O.M. e Remanso do Bosque e é uma verdadeira chocolateira bean-to-bar: controla todas as etapas desde o plantio do cacau no seu quintal até a barra de chocolate.

Em São Paulo, é possível comprar barras como essas que chegam da Bahia, como Amma e Mendoá, e do Pará, como De Mendes, mas também tem gente daqui que traz amêndoas desses Estados para processar o chocolate em terras paulistanas, como Luisa Abram e Chocolat du Jour. A qualidade do cacau nacional melhorou tanto que até a indústria passou a investir em chocolate de origem, caso da belga Barry Callebaut, que lançou em 2015 a linha Brasil com cacau da Bahia. Cerca de cinco anos atrás, a brasileira Harald já havia lançado a linha Unique com duas barras da Bahia (de produtores identificados no rótulo, como João Tavares) e uma do Pará.

Nesses tabletes, que evidenciam a diferença do terroir, os perfis sensoriais são bem distintos. Num dos chocolates da Bahia, predominam notas cítricas de frutas vermelhas; no do Pará, notas adocicadas e florais, que lembram jasmim, conta Sheila Mattos, da Harald.

Com a evolução do setor, não dá mais para falar em chocolate “brasileiro”. Assim como no caso do café, em que origem, produtor e torrefador são identificados, também o chocolate tem uma história para contar. E hoje no Pará, diz o baiano Lessa, não é só a produção que chama a atenção. “O cacau de lá só cresce: mais produtividade, mais qualidade.”

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