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Pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo, Rubens Augusto de Miranda faz análise que deixa claro por que o Brasil produz menos sorgo do que poderia e que motivos limitam a produção e as exportações. Leia entrevista completa.

A produção de sorgo no Brasil tem sido atrelada à de milho. Porém, temos volume e padrão disponível para exportação? Falta adequar o setor produtivo ou só o escoamento e a exportação?

Atualmente, o Brasil não tem excedente exportável de sorgo. A pequena produção, inferior a 2 milhões de toneladas, é totalmente consumida internamente. Em 2014, a quantidade exportada de milho foi quase 11 vezes superior à produção de sorgo. A produção de sorgo é concentrada em Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais, que juntos respondem por 83% a 84% da produção nacional. São grandes estados produtores, mas que não são conhecidos pela facilidade de escoamento da produção agrícola. Ou seja, os gargalos defrontados pelo milho e a soja também afetarão o sorgo em eventuais exportações futuras. Portanto, para pensarmos em exportação de grandes volumes de sorgo é preciso adequar tudo, do setor produtivo ao logístico.

Um dos fatores que têm dosado o cultivo de sorgo é o custo de produção. Qual o peso desse fator na produção?

O milho, inegavelmente, possui um maior potencial produtivo que o sorgo em condições favoráveis. Além disso, o sorgo é tratado historicamente como uma cultura marginal, relegado a terras pouco férteis e baixo investimento. Entretanto, quando se trata de segunda safra, de maior risco climático, o potencial de ambas as culturas se equiparam, principalmente em plantios tardios. Situação que pode tornar o cultivo do sorgo mais atraente, principalmente no que concerne a característica de resistência a seca maior que a do milho. De forma geral, a ideia difundida de se gastar menos com o sorgo tem sido nefasta para a cultura, pois isso não é necessariamente verdade, principalmente se pensarmos em altas produtividades. Ambas as culturas são altamente responsivas, no sentido de que é preciso gastar para se produzir bem. E essa ideia de gastar menos com o sorgo leva o produtor a optar pela cultura quando ele está querendo economizar, especialmente quando os preços estão deprimidos. Assim, se gasta pouco com o sorgo, mas também se produz pouco. A ilustração disso é que nas últimas safras brasileiras a produtividade nacional do milho no inverno foi, pelo menos, o dobro da obtida pelo sorgo.

O investimento no cultivo é adequado para se alcançar a melhor produtividade?

É difícil avaliar se o custo X benefício é o adequado hoje para o sorgo, o milho, a soja, etc. Essa avaliação só é precisa quando se sabe o preço de venda do produto. Mesmo com as previsões futuras há um alto grau de incerteza. É por isso que, erroneamente, os produtores fazem o seu planejamento relativo aos custos de produção pelo preço vigente e não pela projeção, o que leva a frequentes desvios do resultado ótimo pelas condições iniciais. Em outras palavras, se o investimento é adequado ou não depende do preço. A princípio, com preços altos, normalmente é interessante gastar mais e obviamente produzir mais. Mas não podemos nos esquecer de que preços altos estimulam investimentos na lavoura, que resultam em maiores produções, mas que por sua vez engendram a queda dos preços no futuro.

O potencial do sorgo no Brasil vai até onde em termos agronômicos? Existem regiões adequadas que ainda desconhecem a cultura? Em relação à produtividade... em quanto pode aumentar o volume por hectare se as tecnologias disponíveis forem adotadas?

O sorgo pode produzir até 10 toneladas em situações excepcionais, mas na média a produtividade do sorgo é baixa. Nas últimas safras a produtividade média brasileira tem oscilado entre 2,6 e 2,8 t/ha, que são historicamente os maiores valores já obtidos no país.  Daí surge a questão das possibilidades de aumento da produtividade. O problema é que se olharmos ao redor do globo a produtividade do sorgo é baixa também, quando comparado ao milho, em todos os lugares. Os EUA é o maior produtor de sorgo no mundo, tem uma agricultura altamente tecnificada, mas produz apenas 4 toneladas por hectare, o que é 40% da produtividade do milho no país. Tudo isso é um indicativo que o potencial de crescimento da produtividade do sorgo no Brasil daqui em diante pode ter grandes limitações. Lembrando que a cultura já aumentou a sua produtividade em quase 1 tonelada ao longo da última década.

Com que perspectivas de mercado o senhor trabalham?  Estamos realmente prestes a aumentar a exportação e, logicamente, a produção? Qual o volume de sorgo que o Brasil produzirá nos próximos anos?

Entre 1994/95 e 2010/11, a produção de sorgo granífero no Brasil aumentou 850%, passando de 243 mil toneladas para 2,3 milhões de toneladas. Entretanto, após a colheita recorde de 2010/11, a produção decaiu em todas as safras seguintes, devendo-se colher 1,86 milhões de toneladas em 2014/15, segunda as últimas estimativas da Conab. Assim, a despeito das expectativas geradas pelas compras chinesas, ainda não antevejo um grande salto da cultura do sorgo no Brasil.  É preciso que ocorra algum fato novo mais palpável que o aumento das importações chinesas por si só, como um acordo comercial, por exemplo, que alavancaria a produção.

Por que a China está importando tanto sorgo?

As compras chinesas do grão totalizando 8,5 milhões de toneladas na safra 2014/15 e 9 milhões para a safra 2015/16, segundo projeção do USDA, têm resultado em uma relativa histeria em relação ao potencial do sorgo. Esse valor é maior que o volume médio histórico do comércio mundial de sorgo. Entre 2002/03 e 2011/12, a partir de 2011/12 se iniciam as compras chinesas, o volume médio de sorgo negociado no mercado internacional ficou ao redor de 6 milhões de toneladas. A exceção é a safra 2007/08, pois faltou milho no mundo, quando foram comercializados 8,8 milhões de toneladas de sorgo. Apesar desses números impressionantes, a atual conjuntura deve ser analisada com muito cuidado. A principio, a compra de sorgo pela China é explicada por elementos de política econômica e não necessariamente algo relacionado ao potencial do sorgo de substituir o milho. Em termos tarifários, a China tem uma cota de importação de milho norte-americano, na qual acima de 3 milhões de toneladas o cereal é tarifado em até 65%, o que faz o sorgo norte-americano ficar até U$ 100,00 mais barato por tonelada. Ademais, cabe ressaltar que não falta milho na China. Apesar das expectativas de que a China em algum momento se torne um grande comprador de milho, a verdade é que o país ainda produz mais do que consome e possui quase metade dos estoques mundiais do grão. A projeção do USDA é que os estoques chineses de milho chegam a 90 milhões de toneladas ao final da safra 2015/16. Assim, a razão para a importação de grãos se deve a política de preços do governo chinês, que compra grãos dos agricultores locais pagando um prêmio alto para elevar a renda dos mesmos. No final, grande parte do ônus recai sobre as empresas consumidoras de grãos, que por sua vez estão optando pela importação de sorgo.

Nesse sentido, poderíamos levantar a possibilidade de o Brasil preencher parte dessa demanda chinesa. Há vários problemas nisso, primeiro que não há excedente de sorgo no Brasil, praticamente toda a produção é consumida. Eventuais negócios podem ocorrer com chineses comprando antecipadamente de produtores brasileiros, o que eu acho difícil de acontecer enquanto os EUA estiverem dando conta do serviço, ou produtores investirem para tentar exportar adiante, assumido o risco. Lembrando também que negócios internacionais muitas vezes envolvem negociações bilaterais de comércio entre países, o que deixa os EUA em melhor situação em relação ao Brasil. Por tudo isso, ainda não vejo um futuro tão promissor do sorgo brasileiro no curto prazo, pois a demanda de importação da China pode desaparecer rapidamente com alguma mudança na política tarifária ou da política de preços internos. Obviamente não são mudanças simples, pois ambas têm um papel importante no controle do êxodo rural chinês. É importante então ficar atento às decisões do governo chinês, pois não creio que eles ficarão sem dar alguma resposta a crescente importação de sorgo.

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