A palmeira Juçara, da qual o fruto se origina, foi praticamente dizimada para o uso do tronco como palmito. Hoje só existe em áreas de conservação e está ameaçada de extinção. Por meio de cultivo agroflorestal, ela vem sendo preservada para a obtenção dos frutos e replantada. O sistema faz um arranjo de várias culturas simultâneas, para manter a biodiversidade.
Atualmente, mais de 500 famílias estão envolvidas na produção de polpa desse fruto da Juçara - o açaí da Mata Atlântica - em sete estados brasileiros, da Bahia até Santa Catarina. Com o processamento dos frutos, se obtém uma polpa rica em antioxidantes, que está sendo usada em sucos, preparações culinárias e incorporada na merenda escolar no litoral norte de São Paulo.
O controle da extração e o cultivo protegem a espécie ameaçada e ao mesmo tempo geram renda para os agricultores, sendo responsável por 20% dos ganhos das famílias.
A participação neste projeto, que já tem dez anos, foi um dos motivos da escolha do engenheiro agrônomo Pedro Brancalion para o prêmio Juventude (para pessoas com até 35 anos) da Fundação Bunge de 2018, que será entregue no dia 13 de novembro, pela atuação em pesquisas de manejo e restauração de florestas nativas tropicais.
Conhecimento e tecnologia
Formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, Brancalion atua como professor de silvicultura de espécies nativas no Departamento de Ciências Florestais. Ele coordena o Laboratório de Silvicultura Tropical (Lastrop), que pretende desenvolver conhecimento e tecnologia para manejar e restaurar florestas nativas de forma economicamente viável e com inclusão social, respeitando as particularidades ecológicas de cada ecossistema.
Com experiências comparadas e o acompanhamento do manejo na Serra do Mar, no norte do Estado de SP, entre Ubatuba e Parati, desde 2012, Brancalion comprovou que é possível recuperar matas nativas com a produção de alimentos. É um contraponto à ideia de que para recuperar florestas é preciso restringir o uso, cercar, interromper a produção.
A área recuperada pelo projeto da Juçara ultrapassa os 1.000 hectares. Uma única comunidade produz, em média, 10 toneladas de polpa, segundo o pesquisador.
“A Agricultura tem transformado muito a paisagem na produção de alimentos. Perdemos cobertura vegetal, áreas de nascentes, há um prejuízo para as pessoas e para a natureza. Perdemos coisas que interessam para a própria agricultura, como a qualidade de água, a polinização por insetos, o controle de pragas agrícolas naturais. Então, o desafio no Brasil é não apenas conservar a floresta, mas aumentar a área de cobertura de mata nativa”, afirma Brancalion.
Mas, segundo ele, a preservação por meio de reservas, com restrição de uso, gera custos que a tornam mais difícil de ser praticada. “Por mais que a preservação beneficie toda a sociedade, ela tem custos para o agricultor e proprietário rural. O desafio da minha pesquisa é transformar a recuperação da floresta em algo economicamente viável, para que haja estímulo econômico”, afirma.
“Tenho explorado estratégias para transformar a recuperação da floresta em algo produtivo, para pagar os custos e que dê mais renda que o agricultor tinha quando destinava a terra a outros uso, como por exemplo, manter um pasto”, conta.
Áreas maiores
Segundo Brancalion, a pesquisa indica que o sistema pode ser usado em áreas maiores, com solo raso ou arenoso, como as de pasto extensivo, que dão pouco dinheiro e não geram benefícios ambientais. “O agricultor não preserva por falta de opção. Este sistema é uma alternativa”, diz.
Entre os benefícios, estão a divulgação de uma nova cultura agrícola florestal, a promoção de diversidade genética de espécies e os serviços ambientais naturais, como a proteção da água, da fauna e da flora. Além desses, o cultivo da Juçara possibilita o desenvolvimento de uma nova frente de exploração culinária, em novos modelos de negócios para os agricultores, e o aproveitamento para a merenda escolar.
“A comunidade funciona também como rede de proteção. Os agricultores defendem as suas plantas contra os ladrões de palmito. A conservação pelo uso é mais efetiva que reservar uma área enorme de parque e não ter como fazer a segurança. Os palmiteiros invadem”, afirma.
“Temos grandes áreas no Vale do Paraíba que já foram usadas para café, gado e hoje têm solo degradado. Essas áreas poderiam ser usadas para recuperação de floresta nativa e uma cultura do tipo, gerando renda”, defende.
O Prêmio Fundação Bunge foi criado em 1955 como incentivo à inovação e novos talentos na cultura e nas ciências. A Bunge é uma das principais empresas de agronegócio e alimento no Brasil, atuando com grãos e oleaginosas, processamento de soja e trigo, fabricação de produtos alimentícios, açúcar, bioenergia e instalações portuárias. Pertence à holding Bunge Limited, com sede nos EUA.