Pelo modelo atual de classificação dos riscos sanitários, se ocorrer algum registro de gripe aviária ou doença de Newcasttle em granjas brasileiras de frango, o País inteiro pode perder da noite para o dia o acesso a mercados internacionais. Só se salva um cinturão de 150 km de diâmetro, abrangendo 28 municípios do Oeste de Santa Catarina, primeiro lugar do mundo com blindagem reconhecida contra doenças pela Organização Mundial de Saúde Animal (OIE).
A ideia de compartimentação das produções foi apresentada pelo Brasil, e encampada pela OIE, em 2005, depois da ocorrência de vários surtos de gripe aviária no mundo em que ficou evidente a necessidade de estratégias diferenciadas diante do papel dos pássaros migratórios na disseminação de doenças.
“A compartimentação é uma barreira geográfica invisível, como se fosse um muro fechando toda a unidade da Seara em Itapiranga. Temos absoluta rastreabilidade de tudo: sabemos que o ovo foi produzido por determinada galinha, que foi incubado em tal laboratório, gerou tal pintinho, que foi criado por tal produtor e transportado dessa maneira”, afirma José Antônio Ribas Junior, diretor de Agropecuária da Seara que também é presidente da Associação Catarinense de Avicultura (Acav).
Dentro da compartimentação de Itapiranga estão 283 granjas de frangos de corte, 21 núcleos de granjas de matrizes, dois incubatórios e o frigorífico de Itapiranga; a fábrica de rações de São Miguel do Oeste e de Itapiranga. São mais de 11 milhões de frangos em cada ciclo de produção de 60 dias (entre incubação, abate e renovação do plantel). O status sanitário diferenciado foi concedido em março deste ano, após uma década de preparação para atender todas as exigências da OIE.
A borda de segurança avança 10 km no entorno da zona blindada. Os cuidados envolvem a sanitização dos caminhões, registro de entradas e saídas, isolamento das granjas com telas, controle rigoroso de roedores e animais silvestres. Se alguém for visitar alguma unidade – mesmo os diretores da empresa – tem de estar no mínimo há uma semana longe de outros processos de produção, precisa utilizar roupas desinfetadas e responder, por exemplo, se possui papagaio ou outra ave exótica em casa.
Se na frente de produção de frangos de corte somente a Seara de Santa Catarina tem a compartimentação reconhecida – BRF de Lucas do Rio Verde (MT) está na fila – , na área de genética (granjas avozeiras e biavozeiras) o conceito já está mais avançado. No final de 2016, unidades da Cobb-Vantress genética, em São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Paraná, foram as primeiras a ter compartimentação reconhecida mundialmente. Em março deste ano a Hy-Line, de Nova Granada (SP), também recebeu o certificado.
“Na avicultura, não somos subdesenvolvidos. Somos os melhores do mundo, tanto na produção de material genético como de produção de frango. Só não exportamos nossa genética para mais países por falta de acordos sanitários, mas isso também está mudando, estamos fechando novos acordos com a China e com países da América Central”, diz Ariel Antonio Mendes, diretor de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). “Nosso plano é compartimentar todo o setor de genética. Esse é o foco, por que o Brasil é exportador e queremos ter certeza de que isso irá continuar”, acrescenta.
Na área de frango de corte, o sistema de blindagem deu frutos recentemente, em dois episódios com clientes internacionais. “Na Seara não tivemos nenhuma unidade que perdeu credenciamento para Europa, por que seguimos esse modelo. E mesmo nos embargos chineses, não fomos afetados, por que houve o reconhecimento de que é um trabalho sério e bem feito”, assegura Ribas.
O próximo desafio é expandir o conceito de compartimentação, ou de “blindagem do frango”, para toda uma região produtiva, e não apenas para um cinturão local. “Procuramos falar não mais de compartimento, mas de regionalização. Se dividirmos o Brasil em regiões, Santa Catarina, por exemplo, possui hoje um controle melhor. E o Paraná vem logo em seguida”, afirma Ribas.
A compartimentação de Itapiranga está incrustada no extremo oeste de Santa Catarina e é favorecida por duas grandes barreiras geográficas naturais. De um lado a maciça floresta nacional da Argentina, que forma uma cortina verde de proteção, impedindo contato com qualquer propriedade de frangos. Ao sul, uma barreira contínua de pelo menos 500 metros de extensão, que é a largura média do Rio Uruguai, que delimita a divisa com o Rio Grande do sul.
O secretário de Agricultura de Santa Catarina, Airton Spies, diz que governo e setor produtivo trabalham em cooperação para que a experiência de Itapiranga possa ser ampliada, mas há obstáculos. A compartimentação, lembra ele, envolve não só o fator geográfico, mas também o controle da cadeia produtiva. “Os fatores que precisam ser controlados são muitos. Dependendo da geografia, da natureza dos envolvidos, do número de agentes que operam na região, fica cada vez mais difícil a adoção do compartimento. Mas já há empresas fazendo o dever de casa para avançar nesse sentido. Nivelar para cima é sempre a estratégia mais adequada”, afirma.
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