Estado pioneiro no sistema de criação de frangos integrados – em que a indústria dá a ração e os pintinhos, enquanto o criador cuida das aves – Santa Catarina está cada vez mais emparedada pela escassez de milho para alimentar um plantel permanente de 118 milhões de aves. Atualmente o estado precisa buscar de outras regiões, e até de outros países, 65% do milho que consome como ração.
A tábua de salvação da avicultura catarinense, e também da criação de suínos (em que o estado lidera a produção no País), pode ser o mais clássico ingrediente da alimentação humana.
“O trigo pode ser, sim, a tábua de salvação para a avicultura de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, que também tem déficit na produção de milho. Se conseguirmos ocupar as terras disponíveis no inverno com algum cereal que possa ser utilizado na ração, como o trigo forrageiro, isso viabilizará a suinocultura e a avicultura por muito tempo”, diz o pesquisador Dirceu Talamini, da Embrapa Suínos e Aves em Concórdia.
Para que isso aconteça, no entanto, o pesquisador diz que será preciso investir em pesquisa de variedades específicas para ração, como acontece na Europa, onde o trigo forrageiro é largamente utilizado e chega a produzir mais de 10 toneladas por hectare – enquanto no Brasil o trigo para panificação alcança média de apenas 2,8 toneladas por hectare.
As indústrias, cooperativas e institutos de pesquisa, como a própria Embrapa, namoram a ideia de colocar o trigo na ração das aves e suínos há algum tempo. Segundo Talamini, já houve reuniões setoriais e alguns estudos que comprovam o potencial do trigo para substituir parte do milho, que hoje compõe cerca de 70% da ração. O cultivo de variedades mais produtivas de trigo forrageiro nas áreas ociosas durante o inverno, segundo cálculos da Embrapa, daria com sobra para abastecer com sobras todas as necessidades de ração animal de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Em Santa Catarina, a produção própria de milho neste ano deve fechar em 2,5 milhões de toneladas, apenas um terço da necessidade, que gira em torno de 7 milhões de toneladas.
E só o Paraná não consegue dar conta da demanda do estado vizinho, até porque tem os próprios frangos e suínos para alimentar. O estado consome 13 milhões de toneladas de milho das 18 milhões que produz a cada ano. O excedente é dividido entre outros estados e a exportação.
Os catarinenses, em contrapartida, têm de encomendar carretas de milho de mais de 2 mil quilômetros de distância, em Sorriso, no Mato Grosso. A conta é salgada. Enquanto a saca de 60 kg está cotada a R$ 23,00 em solo matogrossense, no Oeste catarinense ela alcança R$ 42,00. Ou seja, o custo do frete quase iguala o valor da carga.
O extensionista Ivan Torme, da Epagri em Chapecó, diz que a situação do abastecimento local de milho se agrava porque, diante de preços melhores da soja, não há garantia sequer de que a produção catarinense se mantenha estabilizada. “Se não tem preço mínimo para o milho, o produtor migra para onde tem preço melhor”, explica.
Na safra 2016/17, Santa Catarina estabeleceu uma política de preço mínimo do milho e conseguiu manter uma produção maior. O Programa de Incentivo ao Plantio de Milho garantiu R$ 34 por saca de milho, mas não teve continuidade na safra seguinte. “Para a safra 2018/19, há sinalização de que poderá haver novamente esta parceria entre governo estadual, cooperativas e agroindústrias para se fixar um preço mínimo para o milho. No quadro atual, nem que transformasse em ração todo o grão de milho produzido no estado não atenderíamos nem 50% da demanda”, completa Torme.