Há 22 anos a paranaense Vapza importou da França um método inovador de embalar alimentos a vácuo e cozidos no vapor que estica o prazo de validade para mais de 9 meses, sem necessidade de conservantes ou refrigeração. Apesar de a tecnologia ser relativamente difundida na Europa, a diversidade da agricultura brasileira criou para a Vapza um “oceano azul” – praticamente sem concorrentes – no velho continente e em vários outros países.
A diferença competitiva está, principalmente, na matéria-prima abundante e barata do Brasil, como mandioca, batata baroa, feijão fradinho, frango e carne bovina. “Com esses produtos, temos uma boa penetração na Europa. É um oceano azul, a concorrência é muito baixa. Já a batata inglesa acaba não sendo competitiva, fica muito cara, por que eles produzem bastante por lá e aplicam impostos sobre a importação”, aponta Enrico Milani, diretor-geral da empresa com sede em Castro, na região dos Campos Gerais do Paraná. Curiosamente, a batata foi o primeiro produto comercializado pela marca em 1996 e mantém-se no “top 10” de vendas, mas nas últimas colocações.
O próximo grande desafio para a Vapza, que faturou R$ 75 milhões em 2017 e projeta crescer 12% neste ano, são os Estados Unidos. “Os americanos ainda estão focados nos enlatados e congelados. Mas se pegarmos uma pequena parcela desse mercado gigantesco, já será um grande negócio”, avalia Milani. A empresa abre nas próximas semanas um escritório próprio em solo americano, onde até agora só tinha representação comercial. A meta é aumentar de 5% para 8% a fatia internacional de seu faturamento, ainda em 2018.
A localização estratégica, nos Campos Gerais, favorece os planos de expansão. Da linha de 30 produtos, poucos têm de ser ‘importados’ de fora do Paraná – como a ervilha, o feijão branco e a quinoa. O restante é todo produzido num raio de poucas dezenas de quilômetros, da mandioca salsa ao milho verde, do feijão preto à beterraba, passando pela canjica, a carne seca e o frango desfiado.
Suíno desfiado
No mês que vem, os carros-chefes da empresa – frango e carne seca desfiados, que representam 40% do faturamento – vão receber a companhia da carne suína. O pernil suíno desfiado, já vendido em porções maiores para lanchonetes e restaurantes (sistema food service), chegará ao consumidor em embalagens de 400 gramas. A produção começará com oferta de 12 toneladas por mês no mercado interno, mas os suínos serão comprados de fornecedores com registro do Serviço de Inspeção Federal (SIF), exigido para exportação.
No Brasil, que responde por 95% do faturamento da Vapza, a estratégia é ir além das classes A e B e atrair consumidores com poder aquisitivo mais baixo. Para isso, serão lançadas, também em março, linhas com porções pequenas, de 250 gramas, que exigem menor desembolso. A oferta de orgânicos será incrementada, com soja, mix quinoa e 7 grãos (quinoa branca, vermelha e preta, arroz vermelho e integral, linhaça e chia) – todos em porções de 250 gramas.
Como lidar com a percepção de que os produtos ainda são caros, quando comparados com os não processados? “Isso muda a partir do momento em que as pessoas percebem os benefícios de produtos que têm sempre o mesmo rendimento, com qualidade e sabor do in natura, sem precisar refrigeração, com baixo custo de armazenamento e transporte. É só abrir, esquentar e jogar o tempero de sua preferência”, afirma Milani.
“O Brasil está saindo de uma crise e isso impacta no preço de nossos produtos. Por outro lado, existe uma tendência de crescimento desse mercado express, com porções de produtos cada vez menores”, acrescenta o executivo. Ele revela que a dificuldade maior é fazer as pessoas entenderem como algo perecível, como vegetal, grão ou carne, pode durar meses sem nenhum conservante. “O produto é embalado a vácuo in natura e depois é cozido e esterilizado a vapor em temperatura acima de 125 graus. O processo elimina qualquer microrganismo, por isso pode ficar fora da geladeira”, explica.
“A Vapza aproveita o fato de o Brasil ser um país barato na área de alimentos, por causa da abundância proporcionada por um território vasto e fértil”, avalia Douglas Zela, especialista em marketing e professor da FAE Business School. O ‘oceano azul’ encontrado pela empresa na Europa não se repete no Brasil, segundo Zela, por que aqui “a grande concorrência é o próprio produto in natura”. Por outro lado, o mar é menos azulado no Brasil por que a tecnologia já é dominada por outros concorrentes, com igual acesso a alimentos baratos. Mas ter sido pioneira é um diferencial importante. “As primeiras a entrar nos mercados têm grande possibilidade de assumir a liderança, que só perdem se não continuarem buscando inovações, novos produtos, formatos e embalagens”, conclui.
* Oceano Azul é uma metáfora criada em 2005 pelos autores Renée Mauborgne e W. Chan Kim, da The Business School for the World (INSEAD), para uma estratégia empresarial de atuação em mercados únicos ou inexplorados. Pela inovação, essas empresas navegam relativamente tranquilas e evitam mercados saturados com o sangue derramado (Oceano Vermelho) nas batalhas entre concorrentes.