A disputa pelo controle da BRF, maior processadora de alimentos do Brasil, virou uma guerra aberta na qual cada integrante do novo Conselho de Administração da empresa será escolhido individualmente em assembleia no próximo dia 26.
Isso ocorreu porque o fundo britânico Aberdeen, detentor de pouco mais de 5% das ações da BRF, requisitou à empresa o chamado voto múltiplo na eleição. Com isso, as duas chapas que estavam montadas para disputar o comando da empresa deixam de existir.
Segundo a reportagem apurou, a movimentação contou com apoio dos fundos de pensão Petros (da Petrobras) e Previ (do Banco do Brasil), donos de 22% do capital da empresa.
A direção de Petros e Previ estava desconfortável com as negociações paralelas de Abilio com setores das fundações para tentar desarticular a sua chapa. Daí a decisão de pedir ao aliado Abeerden para solicitar voto múltiplo e implodir essas tentativas.
Abilio reagiu e tentou um entendimento com setores dos fundos. Os dois lados chegaram a negociar uma chapa de consenso, que quase foi aprovada. Mas, após tensas negociações, o acordo fracassou e o atual conselho, no qual Abilio tem maioria, acabou apresentando uma chapa alternativa para a disputa.
Na chapa alternativa, Cruz seria mantido no conselho, mas deixaria de ser presidente e o cargo ficaria com Luiz Fernando Furlan, ex-ministro do Desenvolvimento e um dos herdeiros da Sadia (empresa que, fundida à Perdigão, deu origem à BRF em 2009). Outros nomes já propostos pelos fundos também seriam mantidos.
Na quarta-feira (11), contudo, Cruz e outros executivos pediram à Comissão de Valores Mobiliários para que seus nomes fossem retirados da chapa alternativa, o que esvaziou a manobra de Abilio.
Com o voto múltiplo, o jogo é outro. Agora é o peso acionário de cada ator que definirá a formação do novo conselho. Na prática, é preciso ter 5% das ações para eleger um representante.
A solicitação de voto múltiplo deve piorar a percepção do mercado sobre a crise na BRF. Se cada grupo conseguir apontar alguns conselheiros, o conflito deve continuar mesmo com o novo comando.
Abilio, que possui 3,9% das ações da BRF, deverá buscar apoio no seu antigo aliado, o Tarpon, dono de 7,26% da empresa, e acionistas minoritários para tentar manter dois ou três membros no conselho.
A crise na BRF vem se aprofundando desde 2017, quando foi alvo da Operação Carne Fraca, que apurou irregularidades em seu processo produtivo e teve uma nova etapa neste ano. Além disso, houve uma série de problemas de gestão e imagem na empresa: o seu vice-presidente de Integridade, braço-direito de Abilio, teve de deixar o cargo após ser condenado por uma fraude ocorrida em outra empresa.
Dois de seus ex-conselheiros foram investigados sob suspeita de servir de infiltrados da rival JBS, visando a venda da BRF. E um outro ex-membro do conselho acabou preso na Operação Lava Jato. A performance da empresa decaiu brutalmente, levando ao prejuízo recorde e à volta do preço da ação aos patamares do começo da década.
Abilio assumiu a presidência do conselho em 2013, com apoio do Tarpon, com quem sempre manteve uma relação complicada. Em 2015, indicou Pedro Faria para o cargo de presidente-executivo da empresa, e a parceria chegou a levar a ação à casa dos R$ 70; hoje ela está em R$ 22. Faria acabou saindo da empresa no fim do ano passado, e chegou a ser detido na nova fase da Carne Fraca este ano.
Os envolvidos não se pronunciam sobre o processo.
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