No mês de março, mais de 50 mil pessoas foram detidas em operações nas fronteiras dos Estados Unidos| Foto: Divulgação/ICE

Nesta última semana, agentes federais prenderam 97 imigrantes ilegais que trabalhavam numa fábrica de processamento de carnes no interior do Tennessee, no que movimentos de direitos civis classificaram como a maior operação deste tipo em uma década e um claro sinal de que a administração Trump segue obstinada em baixar a polícia em cima de trabalhadores clandestinos.

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Segundo a Polícia de Imigração e Alfândega (ICE), dez pessoas foram presas acusadas de violar leis federais de imigração, um trabalhador foi enquadrado em artigos da lei estadual e 86 operários acabaram detidos por encontrarem-se no país ilegalmente. Advogados dos imigrantes informaram que a maioria é composta de mexicanos.

Desde que o presidente Donald Trump está na Casa Branca, as prisões de imigrantes aumentaram mais de 40% e as deportações nas áreas rurais dos Estados Unidos cresceram 34%.

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A blitz na fábrica Southeastern Provision, em Bean Station, aconteceu após uma série de prisões na 7-Eleven, uma cadeia nacional de lojas de conveniências. A determinação expressa dos oficiais de imigração é de “quadruplicar ou quintuplicar” o número de batidas policiais neste ano, para acabar com as fontes de subempregos que atraem imigrantes ilegais e punir os empregadores que os contratam.

Medo de sair de casa

“As pessoas estão em pânico”, disse Stephanie Teatro, diretora da Coalisão de Defesa dos Direitos de Imigrantes e Refugiados do Tennessee, que montou centros de informação nas igrejas locais onde as pessoas podem reportar o desaparecimento de parentes ou buscar seu paradeiro. “As pessoas estão aterrorizadas, com medo até de dirigir seus carros. Elas não querem sair de casa”.

O agente da imigração Nicholas Worsham informou que a fábrica está sendo investigada por evasão de impostos, fraude de créditos fiscais e contratação ilegal de imigrantes. A empresa deixou de recolher pelo menos US$ 2,5 milhões em contribuições obrigatórias dos holerites de dezenas de trabalhadores não documentados. Desde 2008, a fábrica paga seus empregados em dinheiro vivo e os submete a condições inadequadas de trabalho, jornadas exaustivas e exposição a produtos químicos sem EPIs.

No ano passado, a polícia de imigração auditou 1360 empresas e prendeu mais de 300 pessoas. Foram recolhidos US$ 97,6 milhões em multas e impostos federais. Militantes anti-imigração insistem para que o governo aumente as fiscalizações nos locais de trabalho e obrigue os empregadores a utilizar o sistema e-Verify, argumentando que o foco de Trump nas fronteiras não funcionará se os ilegais continuarem a encontrar empregos nos Estados Unidos.

No ano passado, o Tennessee exigiu que praticamente todas as empresas cadastrassem as novas contratações no E-Verify, um programa federal que verifica se a pessoa está autorizada a trabalhar no país.

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No mês passado, 50.308 pessoas foram presas nas fronteiras, 37% a mais do que no mês anterior, levando o presidente Trump a ordenar reforço no contingente das tropas da Guarda Nacional posicionadas entre os EUA e o México.

Reforma na lei

Defensores dos direitos civis querem que o Congresso aprove uma nova lei de imigração e argumentam que as batidas policiais causam pânico em comunidades longamente estabelecidas e em imigrantes que fazem os serviços que os americanos não querem fazer. Apesar de disparar neste mês, a detenção de imigrantes no ano passado teve o menor índice dos últimos 46 anos.[

“Esse incidente aponta, mais uma vez, para a necessidade urgente de uma reforma na lei de imigração – algo que já precisamos há décadas e que vem sendo negligenciado pelas administrações de ambos os partidos políticos”, afirmou o reverendo Chet Artysiewicz, presidente da Glenmary Home Missioner, uma entidade de apoio ligada à Igreja Católica.

No estado da Califórnia, um levantamento de 2015 aponta para a existência de 2,6 milhões de imigrantes ilegais. Assustadas com as batidas policiais, essas pessoas têm desistido de seus empregos, provocando reflexos diretos na economia, principalmente no meio rural.

No início de março, a prefeita de Oakland, Libby Schaaf, alertou a população que haveria uma batida policial contra imigrantes ilegais. Ao final da operação de quatro dias, 232 pessoas foram detidas, 115 delas com antecedentes criminais. Responsável pela operação, Thomas Homan disse que cerca de 800 criminosos estrangeiros escaparam da polícia por causa do alerta da prefeita, a quem criticou por se comportar como um olheiro do crime.

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As ações contra imigrantes na região são uma resposta direta ao posicionamento da Califórnia como um “santuário para imigrantes”, onde agências locais se recusam a cooperar com as batidas das autoridades federais.

Aumento da repressão a imigrantes ilegais traz reflexo diretos sobre a produção agrícola mais dependente de mão de obra 

Uma coisa é certa: a política anti-imigratória de Trump prejudica os negócios. Mais de 55% de 762 agricultores e pecuaristas entrevistados em outubro de 2017 disseram que metade de suas terras está desatendida, devido à falta de mão de obra provocada pela política federal contra a imigração. Dos 2 milhões de trabalhadores rurais da Califórnia, 1,5 milhão não têm documentos, segundo Tom Nassif, presidente da Associação dos Produtores do Oeste Americano (uma instituição de 92 anos que representa produtores da Califórnia, Arizona, Colorado e Novo México).

Se o Congresso aprovar uma lei para restringir a emissão de vistos de trabalho a 410 mil por ano, isso poderá significar a paralisação da agroindústria da Califórnia – avalia Nassif. A região já vem diminuindo a quantidade de terras agrícolas dedicada a culturas que envolvem intenso uso de mão de obra, como cerejas, maçãs, pimentões e “berries”, que se deslocam para fazendas no México, América Central, América do Sul e Leste Asiático.

Após registrar seis anos consecutivos de recorde de faturamento até 2015, a renda dos pomares caiu 13% em 2016, encolhendo para US$ 47 bilhões, devido “à estiagem e às mudanças das condições de mercado” – segundo Karen Ross, secretária do Departamento de Agricultura da Califórnia.

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A condição de mercado mais impactante é a falta de mão de obra, diz Arturo Rodriguez, presidente da Associação dos Trabalhadores Rurais da América, que prevê que as coisas tendem a piorar se a agência federal mantiver a pressão sobre a Califórnia.

Para cada empregado que é detido – seja de uma fazenda, de um restaurante ou fábrica – dezenas de outros ficam com medo de voltar ao trabalho. Muitos desistem do emprego depois de serem informados que o patrão recebeu aviso de auditoria federal. “É pura retaliação de um governo hostil aos imigrantes”, diz David Huerta, presidente de uma associação de trabalhadores rurais do Oeste americano. “As frutas vão apodrecer no pé este ano por causa do governo, que não entende a contribuição do trabalho dos imigrantes para toda a indústria. Por não enxergarem isso, as consequências serão inevitáveis”.