De cada quatro pãezinhos de queijo consumidos no Brasil, um é produzido com fécula de mandioca da indústria da família Pierin, em Paranavaí, no Noroeste do Paraná. A Podium Alimentos, fundada nos anos 90 pelo patriarca, Ivo Pierin, hoje é comandada pelos irmãos Paulo e Ivo Júnior.
Júnior, o caçula, mais do que um mero apreciador de pão de queijo, é um entusiasta dos usos gastronômicos e industriais da mandioca. Por onde viaja mundo afora, ele coleta produtos à base da fécula: sagu vietnamita, achiras da Colômbia, snacks indígenas bolivianos, macarrões asiáticos, sorvete, aguardente e até cerveja, em que a mandioca substitui o malte. Os produtos em seus rótulos originais enfeitam uma das salas da sede da empresa em Paranavaí.
No Noroeste do Paraná a mandioca encontrou seu ‘habitat’ ideal. Nos anos 70, o cultivo da raiz chegou à região com famílias do estado vizinho, que se radicaram na localidade conhecida como Graciosa dos Catarinenses. A expansão foi na mesma velocidade do compartilhamento de ramas para o plantio. Hoje a região cultiva 60 mil hectares com mandioca e reúne 30 grandes fecularias. Das 560 mil toneladas de fécula produzidas por ano no Brasil, 400 mil (70%) saem do Paraná, e 40% desse montante das terra vermelhas de Paranavaí. A fécula, basicamente, é o suprassumo da raiz da mandioca, a matéria-prima que funciona como commodity a partir da qual, pela modificação do amido, pode ser destinada tanto para cola industrial ou cosmético como para a mistura de pão de queijo.
Para o pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, na Bahia, Francisco Laranjeira, o sucesso da mandioca no Noroeste do Paraná é uma combinação de clima favorável com empreendedorismo dos agricultores locais. “Nas outras regiões do país existe uma concorrência maior com o costume de comer a farinha de mandioca. Aqui, 70% do que se produz vai para fécula”, destaca.
Mais de 80% da produção de fécula da Podium, ou 2.600 toneladas por mês, são destinados para indústrias de pão de queijo, principalmente para os estados de Minas Gerais e São Paulo. Não existe no país um outro fornecedor singular com tanta participação no mercado - 25% da demanda total.
Pierin é um industrial que emprega 170 funcionários, mas, antes de tudo, começou a lida na mandioca como agricultor. Ele diz que, no médio prazo e descontadas as oscilações sazonais de preço, a mandioca rende muito mais para o produtor do que a soja, queridinha de tantos. Enquanto a renda bruta com pecuária de corte é de R$ 1.851,00 por hectare e a da soja alcança R$ 3.794,00, a mandioca bateu no ano passado numa renda bruta de R$ 6.601,00. “Temos momentos de picos excelentes de preço e outros onde há uma queda muito grande, causando prejuízo aos produtores. Para o agricultor profissional e que produz todos os anos, na média não existe cultura que dê a mesma rentabilidade. O que nós precisamos é trabalhar para baixar os custos de produção via aumento de produtividade. Esse é o desafio da mandioca, aumentar a produtividade por área, como já aconteceu com outras culturas”, sublinha Pierin.
O pesquisador Fabio Isaías Felipe, do Centro de Pesquisas Econômicas Aplicadas (CEPEA/USP), confirma a ótima rentabilidade atual da mandioca para os agricultores. No ano passado, a média de preços ao produtor foi de R$ 542 a tonelada; neste ano, R$ 480. Isso contra um custo de produção total de R$ 280 – o que dá um retorno líquido de pelo menos R$ 200 por tonelada. E apesar do aumento da demanda pela fécula, pelos seus usos cada vez mais diversos, o volume de produção não tem crescido na mesma proporção.
“O fato é que vêm ocorrendo sucessivas quedas de produção. Em 2015, produzíamos por volta de 23 milhões de toneladas. Agora, em 2018, o IBGE sinaliza algo inferior a 20 milhões de toneladas. Já fomos os segundo maior produtor mundial de mandioca, hoje estamos no 4º ou 5º lugar”, aponta Felipe. Para o pesquisador, a explicação está na concorrência com outras culturas. “Nos países asiáticos como Tailândia, Camboja e Vietnã a mandioca não tem tantas culturas concorrentes. Mas no Brasil há concorrência forte com grãos, com pastagens e citrus. Tem um pessoal que entra e sai da atividade”, salienta.
Mandioca imperial
Durante a Feira Internacional da Mandioca, que acontece nesta semana em Paranavaí, Ivo Pierin Jr, o “rei do pão de queijo” no Brasil se encontrou com Walter Toshio Saito, o “rei da cebolinha” na província de Saitama, no Japão. Saito foi um dos palestrantes convidados do evento. Há dez anos ele se tornou agricultor por acaso após o estouro da bolha imobiliária americana estragar o negócio de agenciamento de mão de obra que mantinha no país asiático.
O dekassegui, natural de Terra Boa, no Paraná, decidiu então cultivar hortaliças no sistema meeiro, desconhecido até então no Japão. Atualmente, Saito é conhecido como o “rei da cebolinha” e fatura mais de US$ 3 milhões por ano. O próximo reinado de Saito em terras orientais deve ser no cultivo da mandioca: “Se eu vou produzir mandioca, eu vou ser o melhor. Vou produzir o máximo, a melhor mandioca, na maior quantidade”. No Japão, diga-se de passagem, o preço do quilo da mandioca in natura é de US$ 7,50 ou cerca de R$ 30,00 – dez vezes mais do que o preço no Brasil.
* O repórter viajou a Paranavaí a convite da organização da Feira Internacional da Mandioca (FIMAN)
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