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Chefs se mobilizam contra “PL do Veneno” que afrouxa a lei dos agrotóxicos
Não é de hoje que chefs usam as redes sociais para se posicionar politicamente. Em maio, as linhas do tempo tiveram maior presença de opiniões dos cozinheiros profissionais sobre o modo de produção de alimentos no Brasil. Isto porque a Câmara dos Deputados colocou em votação, após adiar três vezes, o projeto de lei 6299/02, apelidada de “PL do Veneno” por setores da sociedade civil que são contra sua aprovação.
Grandes nomes da cozinha nacional, como Bel Coelho (Clandestino, São Paulo), Alex Atala (D.O.M. e Dalva e Dito, São Paulo), a culinarista e apresentadora Bela Gil manifestaram contrariedade ao projeto de lei. A voz mais forte entre os cozinheiros é a de Paola Carosella, chef do Arturito e da La Guapa Empanadas (São Paulo) e jurada do MasterChef Brasil. A argentina tem usado sua presença nas redes sociais Twitter e Instagram há mais de dois anos para defender a produção agrícola de orgânicos e de pequenos produtores.

“Ninguém aqui está questionando se o agronegócio é ou não bom para o país, ninguém aqui apresentou um projeto para os agrotóxicos acabarem amanhã. Se manifestar contra este PL é se manifestar contra mais venenos dos mais de 200 que já são utilizados”, escreveu Paola em seu Instagram.
A votação foi adiada para terça, 29 de maio, e até lá os chefs continuam a usar as redes sociais para pressionar os parlamentares a votarem contra o projeto de lei 6299/02 e mobilizam os seguidores para votarem na enquete.
“A mobilização dos chefs pelas redes sociais é extremamente importante. No momento em que a Bela Gil alertou sobre o projeto e divulgou a enquete, a quantidade de votos subiu. Infelizmente no Brasil as ONGs têm baixa capilaridade e o apoio dos chefs ajuda a divulgar”, avalia Victor Peláez, professor do departamento de economia da Universidade Federal do Paraná, coordenador do Observatório da Indústria do Agrotóxico e pesquisador do tema há dez anos.
De Curitiba, Lênin Palhano, chef do Nomade, se posicionou contra o “PL do Veneno” e divulgou o site chegadeagrotoxicos.org.br em seu perfil pessoal no Instagram. “O PL 6299/02 privilegia uma camada elitizada da agricultura, que não está pensando em diversidade e saúde. Se houvesse investimento em agrofloresta os resultados seriam mais ricos em diversidade e economicamente. É possível ter alimento o ano todo por um sistema que concilia mata, agricultura e manejo animal”, defende o chef, que tem fornecedores de hortifruti nas hortas comunitárias com 100 hortelões no bairro Tatuquara, em Curitiba e produtores agroecológicos na região de Morretes e Antonina, no litoral paranaense.

O conteúdo do site Chega de Agrotóxicos foi produzido por 15 entidades de mobilização ambiental, como Greenpeace, Agrotóxico Mata, Associação Brasileira de Saúde Coletiva, Fundação Oswaldo Cruz, Instituto de Defesa do Consumidor, Associação Brasileira de Agroecologia e Slow Food Brasil.
Pontos criticados do “PL do veneno”
Os pontos mais criticados pelos chefs no PL 6299/02 são a mudança da palavra agrotóxico para “defensivos fitossanitários”; a possibilidade de aprovação de substâncias teratogênicas, carcinogênicas e mutagênicas dentro de um “risco aceitável”, além de deixar a avaliação e aprovação dessas substâncias apenas com o Ministério da Agricultura. Atualmente, além do MAPA, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) também têm papel deliberativo no processo.
Segundo relatório publicado pela Câmara dos Deputados em 2005, no final dos anos 1990, “setores organizados da agricultura” também haviam tentado retirar dos órgãos da saúde e do meio ambiente do processo de registro de agrotóxicos.
A proposta, de autoria do ministro da agricultura Blairo Maggi, reúne mais de uma dezena de projetos de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que pretende alterar a Lei 7.802/89. “Alterar a legislação é um retrocesso. A análise de perigo que o Brasil prevê atualmente só foi adotada em 2015 pela União Europeia. Isso é uma grande evolução em termos regulatórios que os Estados Unidos, por exemplo, não têm”, destaca Peláez.
Chefs em defesa do PNaRA
No dia 16 de maio, Paola Carosella esteve na Câmara dos Deputados para apresentar seus argumentos contra o projeto de lei 6299/02 e pressionar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a tramitação de outro projeto de lei, de iniciativa popular, o PL 6670/2016, Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRA).
O PNaRa traça diretrizes para a diminuição do uso de agrotóxicos, maiores incentivos à agroecologia e a criação de zonas de uso restrito e outras livres de agrotóxicos e sementes transgênicas, entre outros pontos.
Na quarta, 23 de maio, o deputado federal Alessandro Molon foi eleito presidente da comissão que analisa o PNaRA antes de seguir para o plenário.