Produtos & Ingredientes
Semente de papoula, queridinha dos chefs e confeiteiros, some da culinária brasileira
A última fornada de bagels com semente de papoula que o chef Luiz Santo, do New York Café, em Curitiba, preparou aos seus clientes, foi há quatro anos. O produto era um campeão de vendas, mas foi retirado do cardápio. O motivo é que um de seus ingredientes, a semente de papoula, sumiu do mercado formal.
“Para essa última fornada, paguei R$ 800 o quilo da semente, a uma pessoa que trouxe de fora para mim”, conta o chef. “Ou seja, o produto se tornou artigo de luxo, além de difícil de encontrar, o que inviabiliza o seu uso nos restaurantes”, comenta.
Mas por que o produto desapareceu do mercado formal? Para entender, é preciso voltar a sua origem. Utilizada milenarmente no Egito, Pérsia e Índia, a planta é natural do Oriente e não tem produção no Brasil. Portanto, a única maneira de a semente ser utilizada no país é por meio de importação.
Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), importar, comercializar e consumir sementes de papoula não é proibido, pois as mesmas não são entorpecentes. O cultivo da planta (Papaver somniferum L.), entretanto, é, pois dá origem a algumas drogas, como o ópio. Por isso, o extremo cuidado na comercialização.
Aí entra o excesso de burocracia na importação das sementes, o que desanimou os empresários do setor, tornando o produto praticamente restrito ao mercado informal.

“Há seis meses, paramos totalmente com a importação das sementes de papoula, porque a documentação exigida é imensa, burocrática, difícil de atender”, afirma o engenheiro de alimentos da importadora curitibana Cipria, Carlos Toazza, há nove anos no mercado.
Ele relatou que o potencial de vendas do produto era muito grande e que a procura pelo mesmo continua existindo. “Clientes, chefs e restaurantes nos pedem com frequência”.

Uso culinário
O chef Washington Silvera, professor de gastronomia do Centro Europeu e estudioso de especiarias, também lamenta a ausência do produto no mercado e comenta que o mesmo é utilizado em larga escala em diversos países do mundo. Como exemplo, Silvera cita as hamburguerias norte-americanas, que costumam trocar o gergelim do pão por semente de papoula.
Por suas características, a semente é especialmente utilizada na confeitaria. “50% dela é gordura, portanto, podemos extrair óleo com a sua prensagem”, ensina. Segundo o professor, ela é utilizada para espessar, aumentar a textura e o sabor. “Crocante, lembra noz ou castanha”, diz.
O professor fala ainda sobre as diversas receitas austríacas, alemãs, polonesas e russas que utilizam o ingrediente. “Há também muitas iguarias tradicionais indianas e da cultura judaica que contam com a semente em seu preparo”.
Para o chef Luiz Santo, substituições da semente de papoula em receitas tradicionais até são possíveis, mas não ficam à altura. No preparo do pão judaico Challah, por exemplo, ele já trocou a semente de papoula por chia ou gergelim preto, mas o resultado não é o mesmo. “A papoula traz sabor especial e crocância para pães, bolos, pratos quentes e saladas”, explica.
Segundo o chef, o ingrediente faz muita falta no mercado nacional. “É um tempero a menos e que poderia estar sendo muito utilizado no Brasil”, comenta Santo. “A gastronomia perde com a sua ausência”.
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