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Confira um breve histórico da vida de Bukowski
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Reza a lenda que Charles Bukowski começou a escrever poesia aos 35 anos, após ser internado com uma forte hemorragia num hospital público de Los Angeles. Devido aos excessos etílicos, Bukowski vomitava sangue continuamente. Após ficar três dias à beira da morte, finalmente recebeu uma transfusão sanguínea e algum tempo depois teve alta.

Ao sair do hospital, conta que sua percepção parecia alterada, de certa forma ele se sentia numa estranha calmaria. Conforme se sentava na frente da máquina de escrever, percebeu que subitamente o que ele escrevia não seguia mais até o limite da página e virava linha, como em uma narrativa. As linhas agora se quebravam antes, orientando-se por outra pulsação, ritmo ou arritmia. Não era mais prosa o que ele escrevia e, sim, o começo de sua poesia. E assim, depois desse dia dramático em que quase morreu, Bukowski subitamente passou a escrever mais e mais poesia.

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Reza a lenda que para qualquer poeta que se preze, pouco importa se a lenda é apenas lenda ou pura verdade. O que importa, e você há de concordar comigo, leitor, é que é uma boa história. E boas histórias não faltam na biografia e obra do velho Buk. Até esse dia, o então jovem Buk tinha publicado não mais que dois ou três contos em revistas literárias da época, tais como Story e Portfolio, quando tinha 24 e 26 anos, respectivamente. Depois dessas publicações, abandonou a escrita por dez anos, intervalo de tempo em que passou a se dedicar a tarefas, segundo ele mesmo afirma "sem qualquer sensação de glória", tais como beber, sair com mulheres loucas, uma após a outra, e viajar pela América. Conforme conta numa entrevista publicada na London Magazine em 1974, a respeito daquele período: "Beber e morar com mulheres se tornou a minha forma de arte".

Após esse episódio da hemorragia, ocorrido em abril de 1955, o fato é que Bukowski passou a escrever poesia de forma compulsiva. A experiência de quase morte certamente refletiu em sua escrita, desencadeando uma fase bem produtiva. Tanto que ao longo dos anos e em paralelo à publicação de seus livros de prosa, isto é, os seis romances e as diversas coletâneas de contos, o autor publicou mais de vinte livros de poesia. Hoje Bukowski é considerado um dos poetas mais influentes da América e certamente um dos escritores contemporâneos mais conhecidos pelo grande público.

Não é de surpreender que a sua obra poética encontre grande receptividade entre os leitores mesmo tantos anos após sua morte. Após a estreia no verso em 1960, com Flower, Fist and Bestial Wail, Bukowski passou a desenvolver uma poesia cada vez mais voltada ao cotidiano, que falasse diretamente do dia a dia de pessoas comuns. De fato, é da complexidade incomum das relações afetivas que se desenvolvem entre essas pessoas, tornadas personagens, que Bukowski arquiteta o esqueleto de sua poética. Ou seja, o mundo real não era excluído de sua poesia, mas sim objetivado.

Desde o início de sua trajetória, o autor não escondia seu desapontamento com a tendência da poesia tradicional a preciosismos. Demonstrava sua desaprovação, posicionando-se contra a ornamentação excessiva da arte poética. Em certo ensaio, referindo-se aos autoproclamados "poetas" de sua época, afirma sua insatisfação: "As coisas mais ordinárias e reais são inconcebíveis para eles".

Dessa forma, de 1960 a 1990, Bukowski procurou desenvolver uma poesia sensivelmente comunicativa que falasse do cotidiano e da vida real e que, sobretudo, falasse diretamente a qualquer pessoa, sem afetações, preciosismos ou acrobacias inúteis devido a experimentos vazios de linguagem. Não é à toa que o autor se referisse à poesia como "a ma­­neira mais curta, mais bonita e mais explosiva". É dessa intersecção en­­tre beleza e con­­ci­­são que vem a explosão da poesia bukows­­kiana.

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Essa explosão desencadeada em mais de 20 livros de versos, encontra ressonância nos tempos atuais por tratar de temas imperecíveis, tais como o relacionamento entre homem e mulher, pais e filhos, uma infância torturante, a proximidade da morte, tanto a própria morte vivenciada e pressentida, como a de um amor, ou a das várias vidas desperdiçadas em sua busca pelo sonho americano.

Pelo que presenciei ao organizar e traduzir a antologia poética Essa Loucura Roubada Que Não Desejo a Ninguém a Não Ser a Mim Mesmo Amém, posso dizer que as ondas de choque dessa explosão ainda se encontram em expansão entre nós. A cada verso simples, intenso e liricamente desafiador que encontro nos poemas do velho Buk, é que percebo o quanto essa obra poética ainda irá nos instigar, provocar, fazer respirar e significar.

Fernando Koproski é autor de Nunca Seremos Tão Felizes como Agora (7 Letras, 2009), entre outros livros.