Não há muito mistério. Logo na entrada de mais uma mostra com obras apreendidas pela Polícia Federal na Operação Lava Jato, está a gravura de Joan Miró que causou estardalhaço quando o último lote dessas peças chegou ao Museu Oscar Niemeyer (MON), em Curitiba, em março do ano passado.
Desde então, a peça ficou guardada no museu, tendo só aparecido numa reportagem de televisão e em reproduções nos jornais. Agora, meio alienígena no conjunto de obras de artistas brasileiros contemporâneos que integram a mostra, ela se torna o grande chamariz da remontagem da exposição aberta ao público nesta terça.
Reforçando a lógica da corrupção como espetáculo que norteia a mostra, o museu em Curitiba parece querer aproveitar o escândalo envolvendo a Petrobras para turbinar seu número de visitantes. De abril a novembro do ano passado, quase 200 mil pessoas viram 48 das mais de 260 obras apreendidas em casas de ex-diretores da estatal.
Muitas das mesmas peças, entre elas uma tela de Daniel Senise e uma fotografia de Vik Muniz, estão de volta. Inéditos, o Miró e uma série de peças de Nelson Leirner, que antes aparecia só com um trabalho na primeira montagem da mostra “Obras sob a Guarda do MON”.
Enquanto o museu exibe as obras, peritos da Polícia Federal ainda trabalham para averiguar a autenticidade das peças e seu valor de mercado, informação que mais interessa aos investigadores para ver quanto pode ter sido desviado da Petrobras em obras de arte ou mesmo entender como essas peças foram usadas em supostos esquemas de lavagem de dinheiro.
Dado o valor das obras em questão -a gravura de Miró, por se tratar de um múltiplo e não uma peça única, valeria no máximo algo em torno de US$ 50 mil e não milhões de dólares que poderiam ser pagos por uma pintura do surrealista-, a hipótese de que esses trabalhos foram usados para lavar dinheiro parece mais plausível do que a tese de que elas teriam sido usadas só como pagamento de propina.
No ponto que mais interessa o visitante de museu, no entanto, algumas obras merecem mais a atenção do que outras. O conjunto de fotografias realizadas por Miguel Rio Branco em Nova York nos anos 1970 é um dos bons momentos da mostra, assim como uma pintura de Anna Maria Maiolino.
Mas nesse contexto de obras apreendidas pela polícia, é difícil não enxergar outras camadas de significado ali. A série de montagens fotográficas de Pedro Motta, por exemplo, em que imagens de paisagens são emolduradas em caixas de vidro cheias de areia de verdade dão a sensação do tamanho do mar de lama que envolve a Lava Jato.
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