Para alguns de nós que ficaram com a sensação de que só oito filmes da saga “Harry Potter” não eram o suficiente, a perspectiva de um novo filme, com uma história anterior aos acontecimentos da saga principal, trouxe um comichão de antecipação misturado com pânico. Para os nerds fãs de “Potter”, talvez já seja o suficiente voltar ao mundo dos bruxos só para mais algumas horas de escapismo. Mas será que é demais ter esperanças de que o filme pode acabar sendo bom de verdade?
Como descobrimos, “Animais Fantásticos e Onde Habitam” é muito melhor do que as baixas expectativas que a maioria de nós criamos, graças a um roteiro ao mesmo tempo engraçado e assustador, de autoria de J. K. Rowling, e a direção confiante do veterano David Yates, que lidou com maestria com os últimos quatro filmes da saga “Potter” e que conseguiu contornar vários desafios aqui.
Trama
Ambientado na Nova York da década de 1920, “Animais Fantásticos” deriva o seu título de um dos livros didáticos ensinados na escola de Hogwarts e tem como seu herói o autor desse livro, um certo Newt Scamander (Eddie Redmayne). Newt é um bruxo inglês e pesquisador de criaturas mágicas. Quando o conhecemos, ele está a caminho do estado do Arizona, onde planeja soltar um animal mágico, um Pássaro-trovão com o nome de Frank, de volta ao seu habitat natural.
A primeira metade do filme se desenrola como um jogo de “Pokémon Go”, conforme Newt tenta recuperar alguns animais adoráveis e/ou assustadores que escaparam para as ruas de Manhattan do zoológico portátil que ele carrega consigo numa valise mágica sem fundo.
Herói
Tímido, cheio de tiques e difícil de entender – mesmo quando não está entoando encantamentos em pseudolatim –, ele é também, como ele próprio se descreve, uma figura um pouco antipática (a maioria das pessoas, diz Newt, “me acha irritante”).
Redmayne tem um grande problema nas mãos com a estreia desse novo personagem: deixá-lo não só palatável ao público, ao cabo dessas duas horas de duração, mas indispensável. Afinal, o filme já conta com quatro sequências no papel.
Essa transição não é rápida, mas prossegue sem maiores complicações. A primeira metade do filme se desenrola como um jogo de “Pokémon Go”, conforme Newt tenta recuperar alguns animais adoráveis e/ou assustadores que escaparam para as ruas de Manhattan do zoológico portátil que ele carrega consigo numa valise mágica sem fundo (que nem a bolsa de Hermione, encantada com um Feitiço de Extensão “Capacious Extremis”, capaz de carregar quase qualquer coisa).
Antes da ação principal sequer começar, a sequência de abertura solta o nome de um personagem pequeno, porém significativo, dos livros da saga “Potter”, que você precisará conhecer para o final fazer sentido. E isso em cima de todas as outras coisas com as quais o roteiro de Rowling espera que você já tenha alguma familiaridade, como o conflito entre bruxos e trouxas.
Iniciados
Isso me leva ao meu próximo ponto. Se esta última frase não fez o menor sentido para você, então é provável que você terá um pouco de dificuldade para entrar no clima do filme. Antes da ação principal sequer começar, a sequência de abertura solta o nome de um personagem pequeno, porém significativo, dos livros da saga “Potter”, que você precisará conhecer para o final fazer sentido. E isso em cima de todas as outras coisas com as quais o roteiro de Rowling espera que você já tenha alguma familiaridade, como o conflito entre bruxos e trouxas (pessoas incapazes de fazer magia), chamados aqui pela termo norte-americano de “no-majs” (“não mágicos”).
Esse conflito é o que molda a tensão dramática central em “Animais Fantásticos”. A ação durante a primeira hora do filme, nesse espírito do temos-que-pegar, é uma graça – e o bestiário em CG, que inclui criaturas já familiares como pelúcios e tronquilhos, foi muito bem feito –, mas não há muita coisa em jogo, o que evoca o teor mais leve dos primeiros filmes da saga “Potter”, antes de chegarem o Lorde Voldemort e os Comensais da Morte.
A ação durante a primeira hora do filme, nesse espírito do temos-que-pegar, é uma graça, mas não há muita coisa em jogo. Uma hora, no entanto, “Animais Fantásticos” engata um tom mais sério e mais satisfatório.O caldo engrossa, junto com a tensão emocional, o que, muito mais que os efeitos especiais deslumbrantes, sempre foi a melhor parte do universo “Potter”.
Reviravolta
Uma hora, no entanto, “Animais Fantásticos” engata um tom mais sério e mais satisfatório.
Como assistente de Newt na busca pelas criaturas desaparecidas, temos uma auror, um tipo de membro da polícia da magia, que atende pelo nome maravilhoso de Porpentina Goldstein (Katherine Waterston), junto com sua irmã excêntrica, que tem o dom de ler pensamentos (Alison Sudol), e um “no-maj” que acaba sem querer envolvido com eles (Dan Fogler, num papel divertidamente atrapalhado).
Logo mais, essa carrocinha mágica terá coisas mais importantes do que murtiscos perdidos e seminvisos invisíveis para se preocupar. E assim um enredo mais sombrio vai se desenrolando e tomando conta, que envolve Percival Graves (Colin Farell), um colega suspeito de Porpentina que trabalha para uma agência policial chamada de Congresso Mágico dos Estados Unidos da América (MACUSA, na sigla em inglês), e um jovem misteriosamente intenso (Ezra Miller) que foi adotado por uma fanática numa cruzada contra os bruxos (Samantha Norton).
O caldo engrossa, junto com a tensão emocional, o que, muito mais que os efeitos especiais deslumbrantes, sempre foi a melhor parte do universo “Potter”.
Ao final do filme, é provável que, assim como acontece com Porpentina (como era de se esperar), o espectador passe também a criar alguma simpatia por Newt. Como provou Rowling com seus sete livros da saga “Potter”, planejando com anos de antecedência seus enredos complexos e interligados, a autora tem um grande talento para histórias longas. O envolvimento dela não se limitará a esse único filme – e, a julgar pelos prazeres que “Animais Fantásticos e Onde Encontrá-los” oferece ao espectador, o nosso também.
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