Se é verdade que Curitiba é a Seattle brasileira, como cravou a revista ShowBizz nos anos 1990, é de se esperar uma multidão alucinada rumando em direção ao Cinemark do ParkShopping Barigüi nesta quinta-feira (18) e no sábado (20). O aguardado e polêmico documentário “Kurt Cobain: Montage of Heck” será exibido somente em duas sessões na cidade.
O desafio do diretor Brentt Morguen (que ficou oito anos debruçado sobre o material concedido pela família Cobain) foi fugir de um possível filme chapa branca sobre a vida e principalmente a morte de alguém tão popular e controverso. Em 2 horas e 15 minutos, imagens e registros sonoros inéditos, documentos, cartas, versões de músicas do Nirvana e animação conduzem a trajetória de um dos sujeitos mais influentes da história do rock, que viveu sempre em rota de colisão com o mundo.
“Montage of Heck”, título de uma fita cassete gravada por Kurt em 1988 em que há músicas e depoimentos, não se propõe a justificar o suicídio de um artista. Mas o explica sem forçar a barra, com a ajuda de uma elegância estética e de uma montagem inteligente. Depoimentos da mãe Wendy, da irmã Kim, do amigo (e baixista do Nirvana) Krist Novoselic, da madrasta Jenny, da primeira namorada Tracy e de Courtney Love, sua Yoko Ono, criam um espectro trágico de Kurt Cobain. É meio assustador. Ainda mais quando juntamos algumas peças.
Serviço
Dia 18 às 21h; dia 20 às 22h30
Cinemark ParkShopping Barigüi (R. Professor Pedro Viriato Parigot de Souza, 600)
“Não sabia o que era me apaixonar”, diz Wendy no começo do filme. “Com o pai de Kurt, só troquei alianças.” Nascido em uma quase-família, aos 10 anos Kurt Cobain era “uma pessoa muito preocupada com outras”. Mas, nessa idade, também desenhava coisas como o Snoopy sendo estrangulado por Charlie Brown.
Kurt conviveu com a separação dos pais e não tinha um lar fixo. Sua vida sempre foi um eterno improviso – a biografia “Mais Pesado Que o Céu”, de Charles R. Cross, sugere inclusive que ele tenha dormindo na rua por algum tempo. “A família inteira o rejeitava”, diz a madrasta Jenny. “Como alguém pode conviver com isso?” Ninguém pode.
Se a vida pouco significava, houve a música. Kurt Cobain teve sempre a certeza de que seria quem foi. Rabiscos e anotações em cadernos colegiais mostram listas de “coisas para comprar para a banda”; e uma carta aos próprios colegas de grupo, quando o Nirvana ainda tocava “Love Buzz” num quarto para duas pessoas, atestava: “Uma banda precisa ensaiar ao menos cinco vezes por semana.”
O documentário reforça a impressão que sempre tivemos. Para Kurt, o sucesso foi um paradoxo. “Como o Nirvana fez tudo isso e porque eles odiavam o que estavam fazendo?”, questiona uma publicação musical da época.
Dois pontos polêmicos na biografia do artista são revisitados com imparcialidade – na medida em que ela existe. Uma é a tentativa de suicídio após um show em Roma, quando Kurt tomou 67 comprimidos depois de desconfiar da traição de Courtney. “Não era tão monogâmica quanto ele”, diz a vocalista do Hole (que informação!). Outro é a gravidez de Courtney Love que, como o marido, era viciada em heroína.
À época, a revista Vanity Fair publicou uma reportagem sobre o nascimento de um “bebê viciado”, o que acabou por destruiu Kurt um pouco mais. No filme, imagens mostram o casal em momentos muito íntimos, inclusive brincando com a filha Frances Cobain e fazendo troça do que foi publicado. Isso enquanto estão chapados de heroína.
O final de “Montage of Heck” é paranoico. Kurt Cobain sempre se relacionou com a morte, de alguma forma. Nos últimos dias de vida (ele se suicidou em 5 de abril de 1994, aos 27 anos), falava mais sobre o assunto. Queria que o disco “In Utero” (1993) se chamasse “I Hate Myself and Want to Die” (“me odeio e quero morrer”). “É uma piada”, desbaratina, letárgico, em uma entrevista. A sentença virou o nome de música. E o lema de alguém que nunca se sentiu bem neste mundo, apesar de se tornar porta-voz de algumas gerações, que ainda existem e sentem sua falta.
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