Na quinta-feira passada se encerrou um ciclo virtuoso da boêmia curitibana. O Wonka Jazz Project, a clássica jam session semanal no porão da Rua Trajano Reis se despediu do público. Foram oito anos e meio e quase 500 quintas-feiras ininterruptas de música de alto nível.
"Penso que se há de ter coragem para iniciar um projeto, há de se ter mais coragem ainda para, por conta própria, encerrá-lo", resume Ieda Godoy, dona do Wonka e da ideia do projeto.
Ela disse que o estalo para criar a jam session surgiu assim que visitou o porão do imóvel um espaço escuro e apertado, verdadeiro inferninho, ideal para se tocar e ouvir essa música diabólica.
Desde então, o jazz das quintas foi uma opção certeira para locais e estrangeiros de passagem pela cidade. "Era comum receber telefonema ou e-mail de um estrangeiro ou de um músico de outro canto do Brasil, dizendo: Soubemos que vocês são um bar de jazz muito legal...estamos indo tocar em Curitiba e gostaríamos de saber se podemos dar uma canja", conta Ieda.
Foi talvez o palco mais cacifado para receber de improviso qualquer bom improvisador do mundo. "Começamos num momento em que a cidade estava carente de um lugar que tocasse jazz. Agora que inspiramos muitos lugares a fazê-lo partiremos para outro projeto."
Ieda faz questão de agradecer aos parceiros que a ajudaram a "incendiar" o porão: Helinho Brandão, em um primeiro momento, e Jeff Sabbag, nos últimos quatro anos.
Instada a escolher alguma noite memorável, Ieda lembra com carinho especial de quando fez "Uma Noite no Saul Trumpet Bar". "Havia 200 pessoas na casa e relembramos os 13 anos das loucuras na Cruz Machado, onde o jazz comia solto até as 6 horas da manhã. O Saul, no Wonka, tocou e contou histórias. Naquela época, o Jeff tocava lá... eu frequentava.. e o Saul era o dono. Naquela noite no Wonka, nos juntamos pra lincar com essa história de música. Foi lindo demais", afirma Ieda.
O horário das quintas será ocupado pela banda de blues Mr. Jack. Para 2014, Ieda diz estar trabalhando em alguma coisa "muito legal que ainda não posso contar".
Um ciclo termina, outro recomeça
De tudo o que aconteceu na chamada "área cultural" em 2013, o mais importante para mim foi a redenção da Cinemateca de Curitiba. Nos últimos tempos, a última sala de rua da cidade estava escanteada: programação obtusa e esparsa e estrutura abandonada.
A nova gestão da FCC tomou uma medida simples: criou um conselho de programação com caras que entendem e têm paixão pelo cinema. Voltaram os grandes filmes e com eles, o público. Prova de que havia demanda reprimida por cinema bom e barato.
Tive grande alegria indo à sessão de Fitzcarraldo, de Werner Herzog, um filme excepcional, porém longo e de digestão complicada. Sala lotada, gente nas escadas, como nos bons tempos.
Me fez voltar no tempo (para meados dos anos 1990) quando batia ponto na Cinemateca para ver filmes, matar as tardes de adolescente desocupado, me esconder da chuva, tentar encontrar garotas ou falar com o saudoso Paulo Friebe.
Pois, o bom uso do espaço público exige constância. Temos de saber que a Cinemateca está lá aberta. A luz está acesa e é só chegar. Para ficar perfeito, só falta instalar um bom café/bar na casa há espaço ideal para tanto. Seria bom para a produção do cinema local. É na mesa do café que surgem as ideias e as grandes parcerias. Outra boa pedida seria estender os horários: quem sabe uma sessão à meia-noite, aos sábados.
De qualquer forma, é muito bom poder contar com a velha Cinemateca. E com essa me despeço por um tempo: pausa para as férias. Muito obrigado e um bom final de ano para todos.
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