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Todos os curitibanos têm um pouco de Paulo Leminski. Às vezes encontramos verdadeiros cachorros loucos por aí – vá atravessar a rua, mesmo na faixa, e diga se você não se sente ameaçado. Vez em quando somos poetas maiores e fazemos haikais tão impressionantes quanto as fotos que rodaram de novo pela internet, depois da Virada Cultural, mostrando que, incrível, ninguém pisa no jardim em frente ao Paço da Liberdade.

Paulo Leminski, que não por acaso tem um livro chamado Caprichos & Relaxos, escreveu tanto bobagens legais quanto obras extraordinárias. "Ameixas/ ame-as/ ou deixe-as" exemplifica o primeiro caso (é bobo, mas é divertido). Catatau, o segundo (definido como romance-ideia, é um livro ousado que até hoje encafifa estudiosos da literatura). Era, em suma, um típico curitibano, que de certa forma simbolizava a sua própria cidade: tinha estalos de gênio, atuava em várias frentes, mas nunca foi unânime. Há ao mesmo tempo uma aura messiânica em torno de si, que inclui poetas que o imitam até no fio do bigode, quanto uma descrença em relação à parte de sua obra, muito por conta de sua figura exótica e quase sempre alterada por algumas doses a mais. Para Curitiba, vale o mesmo.

Mais um exemplo dessa, digamos, inconstância dos pinheirais: semana passada houve uma homenagem a Paulo Leminski, que morreu há 22 anos. O espetáculo Essa Noite Vai Ter Sol, parte do projeto Música no Paiol, uniu Estrela Leminski, sua filha caçula, cantora e compositora; uma banda sensacional formada por Téo Ruiz (violão e voz), Estevan Sinkovitz (guitarra), Mariá Portugal (bateria) e Clara Bastos (baixo); e José Miguel Wisnik, um polaco patrimônio da cultura nacional e ex-parceiro de Leminski.

O sol apareceu em vários momentos, mas as "ameixas" também estavam lá. Estrela tem uma postura quase amadora no palco. Foi sublimada pela apresentação da banda, impecável. Entrou no palco na hora errada, ao confundir uma música com outra. Não foi um crime e isso passou batido, até porque o show tinha mais cara de confraternização de amigos do que qualquer outra coisa. Seria até estranho se tudo ficasse nos trilhos.

Foi um show de curitibanos para curitibanos. Improviso e insegurança andavam juntos, assim como momentos sublimes, aqueles estalos – houve uma versão inesquecível de "Luzes", com a participação afinadinha de uma plateia tímida.

No dia anterior, aconteceu um bate-papo com Wisnik no Conservatório de MPB. Ao final, alguém matutou: como seria o comportamento de Paulo Leminski se ele estivesse vivo? Escreveria haikais no Facebook, tuitaria poesias com até 140 caracteres, manteria o bigodaço, traduziria, além do grego, também mandarim?

Ainda na metáfora sobre a cidade e seu poeta, luzes e sombras, altos e baixos, penso o que ele diria, por exemplo, ao ler a notícia de que a sua Curitiba, toda toda nos anos 1970, já não é mais reconhecida pelo que um dia foi. No 18.º Congresso Brasileiro de Transporte e Trânsito, realizado em outubro, ao invés de receber elogios, a cidade foi alvo de críticas. Referenciada como sinônimo de problemas, foi chamada de "desatualizada" por um dos grandes do evento.

Porque esse era um dos trunfos da cidade. Curitiba se vendia assim, era isso que fazia brilhar olhos alheios. O Catatau que um dia fomos, ao menos nesse quesito, virou ameixa podre. Espera-se, então, um novo estalo genial, uma poesia arrebatadora, uma obra surpreendente para que novas luzes surjam sobre a cidade. Que apareçam mais sinais de caprichos do que indícios de relaxos. Porque de poeta e cachorro louco, sabemos, todo curitibano tem um pouco.

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