Faria muito sentido se o premiado filme O Som ao Redor permanecesse eternamente na Sala VIP do Espaço Itaú. Seria como uma metarreferência irônica. Um apêndice casual e externo à obra, mas não desprovido de significado.
Mas, para alegria dos bolsos de mortais e jornalistas, o filme de Kleber Mendonça Filho migrou para a sala plebeia. A obra expõe, de forma visceral, a nova classe média da qual fazemos parte. E se deparar com ela, assim, é engraçado, perturbador e desesperançoso.
Kléber resume boa parte do Brasil em uma rua de Recife. Primeiro, o que salta aos olhos é a quantidade de grades que existe em portas e janelas daqueles prédios e casas sufocante. Depois, a relação definida e imutável entre patrão e empregado. Parece até novela de Aguinaldo Silva. A diferença está na profundidade da abordagem, que vai da rotina de um entregador de água que também é traficante ao simbolismo de um engenho de açúcar o filme é, enfim, um pequeno estudo sobre o ser brasileiro.
Uma das cenas mais marcantes de O Som ao Redor acontece em uma reunião de condomínio, um grande evento antropológico. O síndico está cansado e não vê a hora de acabar com aquilo, "ir para casa, tomar banho". A senhora, com um quê de nova perua, reclama da revista Veja, "que está chegando sem o plástico". É de rir, também. Mas, na reunião, é preciso resolver a pauta do dia: o porteiro, idoso e veterano, dorme em seu posto de trabalho. Há provas contra o velho dorminhoco: um garoto gravou seu sono tranquilo, provavelmente com um iPhone.
O feito do filme é tratar dessas idiossincrasias muitas delas minhas e suas de uma forma inteligentemente sutil. É como se o preconceito, a subjugação, e a diferença entre quem manda e quem obedece fosse um pano de fundo para toda a narrativa, que envolve também a relação de um jovem bon vivant com uma garota apática e a chegada de um grupo de seguranças particulares na rua em questão, mote principal do filme que está, ao mesmo tempo, expondo e dilacerando preconceitos.
Com orçamento de R$ 1,7 milhão, o primeiro longa de Kleber Mendonça Filho estreou em 13 salas de cinemas de um país que tem cerca de 2,3 mil delas. No primeiro fim de semana de exibição, atingiu a marca de 840 espectadores por sala, mais do que o blockbuster nacional De Pernas para o Ar 2 (em 718 salas com média de 718 espectadores). O filme também está entre os melhores de 2012 na lista do turrão crítico A. O. Scott, do New York Times.
Além de enterrar (um pouquinho) a ideia de que brasileiro não se interessa por filmes nacionais, o segredo do sucesso do filme parece ser algo básico: olhar para o lado, olhar ao redor. E simplesmente perceber.
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