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Era um jogo de armar, com suas colunas, arcos, telhados, fachadas, com que eu montava minha fortaleza. Depois, espalhava em volta meu batalhão de soldadinhos e também os cavaleiros. Daí pegava o canhão, que eu tinha feito pregando um canudinho de metal numa ripa, onde amarrei em dois pregos um elástico. Enfiava no canudo um lápis e depois a bolinha de rolimã, esticava o elástico e o lápis era projetado canudo adentro, lançando a bolinha. O lápis não ia junto porque tinha uma tachinha no cabo.

Assim eu ia bombardeando e derrubando a fortaleza. Algum cavaleiro resistia, até que eu conseguia derrubar com um tiro enfim certeiro. Então montava tudo de novo, para novamente bombardear, narrando em voz alta a batalha. Durante mais de ano guerreei assim, até que enjoei, mas guardei o jogo de armar e os soldadinhos durante muito tempo. Joguei fora num dia em que resolvi limpar gavetas e armários. Que arrependimento. Se tivesse guardado, os netos hoje estariam brincando – ou seria politicamente incorreto brincarem com armas, mesmo minúsculas?

Na verdade e no fundo, eu não brincava com armas, brincava com a imaginação.

Num Natal, ganhei um tanque de guerra movido a pilha. Roncava e piscava, e, se fosse colocado sobre uma mesa, não caía: quando as duas rodas dianteiras ficavam no ar, saindo da mesa, o tanque inclinava para a frente e uma rodinha transversal tocava a mesa, fazendo o tanque virar para o lado, continuando a rodar pela beirada da mesa. Era um artifício simples e brilhante, mas, quando se gastaram as pilhas, não troquei, nem sei que fim levou meu tanque de guerra. Afinal, ele era muito engenhoso e, por isso mesmo, não precisava de mim.

Agora os netos vêm brincar aqui na chácara e têm um baú de vime cheio de brinquedos e jogos de armar. Mas o que mais gostam é de brincar com vassoura, rodinho e mangueira no terraço. Molham os ladrilhões do piso, e passam rodinho e vassoura, "trabalhando" como faz a vó, depois se lançam de barriga, escorregando, e riem que dá gosto ver. Repetem isso infinitas vezes, até surgirem vergões na barriga, aí mando parar, obedecem cansados e satisfeitos. E toda essa brincadeira, que durou mais de hora, custou só um pouco de água.

Pergunto o que estavam fazendo, dizem que estavam trabalhando. Mas como, pergunto, escorregando no chão, que trabalho é esse?

– Ah, não, vô, aí a gente era peixe!

Estão começando a subir em árvores. Dalva diz que não devemos ajudar, ou perderia a graça para eles. Ainda não passaram do primeiro galho, mas chamam orgulhosos:

– Olha, vô, onde a gente subiu!

– Agora eu era macaco, vô!

E essa brincadeira também não custa nada. Não tem pilha, nem plástico nem metal. E se renova sempre, embora seja tão ancestral. Nós perdemos a preensibilidade dos pés quando deixamos de viver nas árvores. Os macacos continuam podendo prender os pés nos galhos, porém não têm isso que conseguimos desenvolver tanto, e que tanto bem nos faz, a imaginação.

– Olha, vô, a gente tá voando!

Na verdade, estão deitados no assoalho, cada um com a barriga sobre almofada, pernas e braços abertos.

– Tá vendo, vô, a gente tá voando!

Digo que estou vendo, sim, e aplaudo. "Que beleza", digo. "Dois aviões no meio da sala!"

– A gente não é avião, vô, é passarinho!

Confesso minha ignorância, não tinha percebido. Dois passarinhos, quem diria. Aplaudo, eles continuam a voar felizes, rindo, até que cansam, ficam deitados de barriga para cima, olhando o teto, esperando novo comando da velha imaginação.

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