Sou fascinada pelo abacateiro da rua Amintas de Barros. Ele tapa a frente de uma casa antiga quase na esquina com a Dr. Faivre, erguendo tão alto seus galhos a ponto de assistir lá de cima anos de peladas de futebol no pátio da Universidade Federal do Paraná. A árvore nasceu em um terreno, espalhou os galhos para a área do vizinho e também adiante, sombreando a calçada. Não há nada debaixo dela que possa quebrar quando caírem um por um seus frutos – tampouco para amaciar a queda deles. Vão rachar no concreto e nós só poderemos invejar o banquete dos pássaros.
Algumas quadras dali, tenho uns seis caroços de abacate germinando na sala de casa. Estão posicionados acima de um copo ou pote plástico cheio de água, apoiados na borda com palitos de dente. Gosto de olhá-los e imaginar que crescer invencíveis, feito um baobá. Devaneio, às vezes de boca aberta. Em seguida me sinto ridícula e dou um google para relembrar qual a dimensão real de um abacateiro: bem maior que meu senso de ridículo (quem sabe uns dez metros a mais). Esta meia dúzia remanescente foi precedida por outra, devidamente distribuída para conhecidos que nos prometem retribuir se ainda nos conhecermos até lá: estas mudas levarão no mínimo oito anos até nos brindarem com as primeiras porções de guacamole.
Faz um ano que eu e meu namorado (um chileno; chilenos são movidos a abacate; deixo a matemática para vocês) passamos pela Amintas toda semana e suplicamos mentalmente: até um verdolengo nos alegraria. É impossível conseguir um abacate da árvore vizinha sem a ajuda de uma escada ou de uma vara para cutucá-los. Qualquer uma destas opções, reconheço, seriam de uma rudeza sem igual para o dono do terreno em que vive a árvore. Nunca me atrevi a tocar a campainha (se é que há uma), nem trepei no muro para alcançar um galho. Não olhei portão adentro, nem sondei o carro que entrava na garagem. Não fiz mais que olhar para o pé de abacate fixamente do outro lado da rua ou mirar um de seus frutos como se com a força do pensamento pudesse fazer a árvore me nocautear, acertando um abacate maduro bem no meio testa.
Mas esta não é uma anedota sobre uma briga contra a natureza. É uma história sobre a sua generosidade estrábica. Tanto desejamos que, numa manhã nublada, subindo em direção ao Alto da XV, ventou rapidamente. Rápido o suficiente para notarmos que o tempo mudaria. Plof, abacate na sarjeta. Atravessamos a rua correndo, embasbacados: nosso primeiro presente foi um fruto estuporado e imaturo. Em um dia – período milagroso para um abacate amadurecer – estava no ponto.
Pelas minhas pesquisas, chamaria de antilhano ou da variedade quintal ou fortuna. A polpa é um pouco aguada (que pena), com degradê do verde para o amarelo quando está no ponto (que lindo) e com uma casca que se desprende facilmente (que ótimo). Muito gracioso aquele fruto bojudo com pescocinho característico e um caroço pré-histórico.
Ganhamos mais um abacate duas semanas depois, caído há não sei quantos minutos. Catamos de qualquer maneira. Depois disto, nunca mais.
Não me furto a pensar: quantas vezes, desavisados, não teríamos perdido por W.O.?
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