As teorias da conspiração se propagam porque são muito mais interessantes do que a dura realidade. Mesmo assim, me surpreendo no ônibus com o tema do momento: as artimanhas por trás da Nota Paraná. Era de se pensar que, em tempos de crise, qualquer troco recebido no fim do ano seria bem-vindo. Mas não.
“É um jeito de o governo controlar o que a gente gasta”, avisa um passageiro. “Ah é? Não tinha pensado nisso. Bom saber”, comemora a cobradora. “Se você ganha R$ 500 e gasta R$ 600, vão querer saber como é que está fazendo”, explica o prestativo viajante.
O grande irmão olha sobre nós, diria George Orwell. Claro que a bisbilhotice nas contas do cidadão até poderia ser feita, mas, como lembra o colega Fernando, fonte de informações constante para essa coluna, “eles têm mais com que se preocupar”.
O Fernando é quem lança essa explicação convincente que me ocorre aplicar a fenômenos brasileiros como a Revolta da Vacina. “A conspiração é bem mais atraente do que a realidade.”
O ano era 1904 e a varíola matava a rodo. O Rio de Janeiro, um grande polo urbano. Acreditar que se tratava realmente de uma campanha de imunização (ideia do sanitarista Oswaldo Cruz) não dava muito Ibope. Fazia mais sentido desconfiar do conteúdo das seringas – na época, os agentes entraram à força na casa das pessoas, e a revolta fez 30 mortos. O resultado foi, sim, imunização, mas a um grande preço social.
Outros exemplos mais leves mostram a preferência nacional pela imaginação. Como disse a Joana, contando das séries que assiste em casa e não a deixam estudar: “É a ficção nos ajudando a levar a vida”.
Realmente, nada como uma boa história. E as narrativas artísticas estão mais do que nunca misturadas à vida real. São personagens que levam os nomes dos atores que os interpretam. Shows e mais shows biográficos. Universos fictícios que servem de base para a criação de novas histórias – como acontece no filme “O Pequeno Príncipe”, em cartaz nos cinemas. Ali, uma menina conhece o aviador de Saint-Éxupery e depois o “PP” já numa versão adolescente, numa criativa intertextualidade.
Quem reclama de o longa não ser “fiel” ao livro talvez não imagine que Shakespeare partiu de narrativas existentes à época para vesti-las com sua poesia. Quer dizer que originalidade ou a tal “fidelidade” não são sinônimos de, para rimar, qualidade. Aliás, diz que o bardo se baseava muito em notícias reais para seus escritos.
O que eu sei que é bem real são minhas férias, e é pra lá que eu vou. Aviso assim meus 10 leitores. Viu, Élcio?
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