Ravengar (Abujamra) e Valentine (Tereza Rachel) na coroação do mendigo Pichot (Tato Gabus)| Foto: Cedoc / TV Globo

Reprise

Que Rei Sou Eu?

De segunda a sexta, à 0h15, no Canal Viva (com reapresentação ao meio-dia)

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No ar há dois anos, o Canal Viva já se consolidou como uma das melhores opções da tevê a cabo com uma receita simples: tirar do baú atrações que deixaram saudade na tevê brasileira. E um dos grandes trunfos tem sido a escolha das novelas reprisadas – Vale Tudo, Roque Santeiro, Vamp, O Rei do Gado, Quatro por Quatro e Top Model, por exemplo.

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A partir da década de 80, as melhores histórias têm sido reapresentadas. Faltava a novela definitiva de Cassiano Gabus Mendes – e talvez a melhor trama de época já levada ao ar na tevê brasileira: Que Rei Sou Eu?, exibida originalmente pela TV Globo de 13 de fevereiro a 16 de setembro de 1989, em 185 capítulos.

No início de 1989, a Nova República de Tancredo Neves tinha virado pó sob os escombros dos planos econômicos do governo Sarney, a inflação estava fora de controle e a corrupção corria solta, mas o país vivia a euforia da primeira eleição direta para presidente, depois de quase 30 anos.

Nesse contexto, a refinada comédia de costumes de Cassiano Gabus Mendes caiu como uma luva: ele usou o fictício reino de Avilan, no século 18, para fazer uma paródia do Brasil do final dos anos 80, com todas as suas mazelas: miséria, corrupção, instabilidade econômica, desemprego, excesso de impostos, ineficiência do poder público, desconfiança da população.

O autor colocou o dedo na ferida com leveza e descontração, como convém a uma novela das sete. Ele usou os conselheiros da Rainha – vividos magistralmente por Jorge Dória, Oswaldo Loureiro, John Herbert, Laerte Morrone, Carlos Augusto Strazzer e Daniel Filho – para fazer uma alusão aos ministérios e ao Congresso Nacional, com seus lobbies, comissões e maracutaias. A única exceção era Bergeron Bouchet, personagem de Daniel Filho, o bem-intencionado político responsável pela economia.

E as citações à conjuntura da época eram muitas: preocupado com a inflação e a perda do poder aquisitivo do povo, Bergeron propõe o congelamento de preços e a moratória da dívida externa. Em resposta, e para não perder as "boquinhas" com os fornecedores do reino, os conselheiros corruptos estimulam o desabastecimento – numa ilustração do que ocorreu com o Plano Cruzado, em 1986. Mais adiante na trama, o autor recorreu a Chico Anysio para fazer graça com Naji Nahas, o empresário libanês apontado como responsável pela quebra da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, em 1989.

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Além do texto primoroso, Que Rei Sou Eu? deve ao elenco estelar e ao capricho da produção o seu status de obra-prima da teledramaturgia brasileira. A trama reuniu gigantes como Gianfrancesco Guarnieri, Tereza Rachel, Antônio Abujamra, Stênio Garcia, Marieta Severo, Fábio Sabag e Edson Celulari, entre outros, sendo que alguns deles fizeram aulas de esgrima, malabarismo, linguagem e gestual da época da Revolução Francesa. Tereza Rachel e Antônio Abujamra, aliás, até hoje são lembrados pela Rainha Valentine e o bruxo Ravengar, respectivamente.

Mas é triste constatar que, passados 23 anos, a maioria dos problemas expostos na novela continua atormentando os brasileiros. Mudaram os reis, mas o povo continua sendo feito de bobo. A turma do Cachoeira que o diga...