Entre a classe artística, o assunto mais comentado nas últimas semanas tem sido a proposta de fusão das secretarias estaduais de Cultura (Seec) e Turismo (Setu). No final de setembro, o governador Beto Richa anunciou a medida que integra um "pacotão" para corte de gastos. Entidades, como o Fórum de Entidades Culturais (FEC), os integrantes do Conselho de Cultura e outros grupos que se formaram, rapidamente se organizaram para repudiar a medida.
Boa parte das pessoas que entrevistei nas últimas duas semanas me disseram que ficaram chocadas com o anúncio. E essa surpresa veio porque nenhuma entidade, seja representante do Turismo e da Cultura, foi consultada para, ao menos, opinar. Pior: o anúncio do governador foi feito poucos dias depois do término da 3.ª Conferência Estadual de Cultura que discute, justamente, a formulação de políticas públicas de cultura no estado.
Os setores são unânimes: acreditam que a junção será prejudicial, e que as demandas das pastas vão se sobrepor.
Apesar de parecer óbvio que as perdas serão maiores do que os ganhos resolvi tirar a dúvida e consultei a coordenadora do Setor de Estudos de Política Cultural da Casa Rui Barbosa, no Rio de Janeiro, Lia Calabre, uma das maiores estudiosas do assunto no país. O que ela me disse é que em geral, as junções trazem, sim, danos para alguma das partes ou para ambas.
Ela exemplificou: "Se isso estivesse proposto hoje para o Rio de Janeiro seria um grande risco. Pois, na certa, significaria investimentos para ampliar o potencial do turismo cultural, privilegiando os grandes eventos. E os resultados obtidos seriam contabilizados para o turismo, porque aí estão as taxas de ocupação de quartos de hotel, refeições etc".
Política de eventos
Lia tocou num ponto interessante que também é abordado pela área cultural local. Quando se fala em cultura, estados e municípios geralmente privilegiam as ações de entretenimento. Não acredito que não sejam válidas, pelo contrário. É justo que o estado organize uma Virada Cultural em que uma pessoa sem condições de pagar um show consiga ver grandes medalhões da MPB de graça. Em Curitiba, já se provou que os eventos públicos dão certo, e que o curitibano, acusado de sisudo e de não gostar de rua, assimilou muito bem a ideia.
O que não pode é ficar apenas focado nas ações "de impacto" e esquecer outras que dão resultado em longo prazo. De esquecer que um teatro público tão importante como o Guaíra precisa de investimentos pesados. Que é preciso, o quanto antes, pensar em uma sede única para a pulverizada Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap), entre outras tantas demandas que poderia listar.
Grace Filipak Torres, do Grupo Fato, que trabalha com cultura em Curitiba há quase 20 anos, diz que a cidade e o estado já tiveram dias melhores, mas reconhece que muitos gestores e funcionários da Seec "fazem milagre" com o que existe de recurso. E questiona: "Por que cortar justamente um setor penalizado?"
Faltam explicações. Lia Calabre é clara: no caso de uma secretaria única, os níveis de investimentos para os dois setores não podem ser reduzidos, e as pastas precisam ter equivalência de poder e autonomia. Isso será garantido?
Em tempo: nos bastidores da Assembleia Legislativa do Paraná comenta-se que o governador pode voltar atrás na decisão o projeto que exclui a Seec e a Setu e cria uma pasta única (o PL 428/2013) está em análise em comissões da Alep.
Enquanto não se sabe o que vai acontecer, a classe artística continua mobilizada. Amanhã, na área externa do Museu Oscar Niemeyer, a campanha #contrafusão realiza uma ação lúdica no piso de vidro, com música, improvisações performáticas e gravações de depoimentos para a campanha. Um abaixo-assinado contra a proposta também foi organizado pelo grupo, e já angariou mais de 1 mil assinaturas. Para quem se interessar, o link da petição é http://bitly.com/1ajp1dc.
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