"O último a morrer apague a luz", diz a publicidade do filme de Alfonso Cuarón, "Children of men", mas o irônico humor mexicano não alivia a realidade mostrada na tela: um mundo sem esperança governado pela violência e pela angústia.
O filme foi exibido neste domingo no Festival de Veneza. Após a seção, Cuarón conversou com a imprensa. O diretor disse que, ainda que a ação se passe no ano de 2027, a obra representa o presente, porque "o futuro está no passado". A idéia se repete na tela quando numa seqüência se ouve um locutor que diz: "Vocês estão ouvindo uma canção de 2003, quando não queríamos nos dar conta de que estávamos às portas do futuro".
Em 2027, as mulhres não podem ter filhos e quase todos os Estados estão se fundindo. O único que se mantém a duras penas é a Grã-Bretanha, para onde milhões de pessoas de todo o mundo emigraram. Ali, só os cidadãos britânicos podem andar mais ou menos tranqüilos, protegidos pela polícia e pelo exército, enquanto os imigrantes são levados a campos de concentração ou de extermínio.
Perante esse Estado, uma espécie de resistência violenta busca a igualdade de direitos entre imigrantes e britânicos. Nesse mundo apocalíptico, uma mulher africana, Kee (Claire-Hope Ashitey), engravida - é a primeira vez que isso acontece nos últimos 19 anos em todo o mundo.
Kee está protegida primeiro por Julian (Julianne Moore), líder da resistência, e depois por Theo (Clive Owen). O objetivo deles é chegar, em meio ao caos e à anarquia, a um lugar conhecido como "The Human Proyect".
Rodado com técnicas de documental, o filme usa símbolos "que estão na consciência atual e que foram geradas pelos meios de comunicação", afirma Cuarón. Entre essas seqüências aparecem campos de concentração nos quais há presos encapuzados sendo brutalmente golpeados ou ameaçados com cachorros, imagens que nos lembram as fotografias das torturas impostas pelos marines americanos na prisão iraquiana de Abu Ghraib ou em Guantánamo.
"Children of men" alcança seu maior grau de realismo quando, numa batalha entre o exército e a resistência, o sangue salpica a câmera, que continua manchada até o fim da cena. Ainda que Cuarón reconheça que foi uma casualidade, ele diz que é este o "milagre da filmagem". De fato, o efeito faz crer que a cena está acontecendo realmente naquele momento, como se fosse uma notícia na televisão.
Outras cenas lembram filmes de ficção, como os campos de concentração, que se parecem com o mundo de "Vingador do futuro", de Paul Verhoeven, também presente no festival. O "Human Proyect" não deixa de ser a terra que Kevin Costner procura em "Waterworld".
A única esperança no filme é salvar o bebê que Kee leva no ventre, porque apesar do pessimismo que se respira na tela, o mundo pode se salvar "pela evolução do ser humano", explica Cuarón, algo que "é mais fácil que aconteça com as novas gerações". E aí está sua contradição, porque "Chilren of men" são os filhos dos homens, os mesmo homens que criaram o mundo de caos e violência. E Kee quer educar sua filha na África, o berço do ser humano, fechando o ciclo, então, onde tudo começou.
O festival de Veneza apresentou neste domingo também o alemão "Fallen", da diretora Bèrbara Albert. O filme permite comprender a alma alemã, mas pode ser também uma produção que só fale da dolidão num mundo sórdido, do capitalismo selvagem.
O filme fala de cinco amigas que, depois de anos de separação, se reencontram num funeral e continuam sua reunião num casamento. A festa, porém, parece muito mais triste que o enterro.
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