[Do lat. fonte.] S. f. 1. Nascente de água. 2. Bica de onde corre água potável para uso doméstico, etc. 3. O depósito para onde corre. [Dim. irreg.: fontainha, fontícula.] 4. Chafariz (1). 5. Pia batismal. 6. Fig. Aquilo que se origina ou produz; origem, causa: a fonte do mal; "o seu gênio poético [de Tennyson] foi uma fonte de emoções e uma fonte de receita." (Constâncio Alves, Figuras, p. 161). 7. Fig. Procedência, proveniência, origem: "eram afirmações sem provas, e vinham de fontes suspeitas." (Bulhão Pato, Memórias, II, pp. 143-144). 8. Fig. O texto original de uma obra. 9. Quem dá informação sobre determinado tema. 10. Anat. Cada um dos lados da cabeça que formam a região temporal: "a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe" (Machado de Assis, Várias Histórias, p. 14). 11. Art. Gráf. O conjunto de caracteres tipográficos de uma mesma família, que compõem uma caixa tipográfica ou uma matriz de máquina compositora. 12. Eletr. Circuito capaz de fornecer energia elétrica, em condições controladas, a outro circuito; fonte de alimentação. 13. Eletrôn. Eletrodo de um transitor de efeito de campo que fornece cargas (elétrons ou buracos) ao canal (10). 14. Expl. Dispositivo pirotécnico constituído de um bastão oco carregado de composição pirotécnica, a qual, inflamada, lança chuva de lágrimas coloridas. 15. Fis. Ponto ou região em que um fluido penetra num sistema; região através da qual há um fluxo de fluido do exterior para o interior de um sistema...
Fonte: Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa.
Os dicionários são como a crase: estão aí e, como se diz, não "querem" humilhar ninguém. Dicionários são trampolins para algo (muito) mais. O poeta gaúcho Fabrício Carpinejar acredita que, a partir do levantamento de sinônimos, "a função dos dicionários é mostrar o quanto cada palavra é insubstituível".
Mas, fato consumado, os dicionários não atraem a atenção das pessoas como as obras de Stephenie Meyer, Dan Brown, Augusto Cury e Ana Maria Braga. Ao contrário. O escritor gaúcho Altair Martins, vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura, é professor e enuncia uma verdade que poderia constar no banco de dados IBGE: o brasileiro não usa dicionários.
"Há, entre nós, a presunção do 'já sei'. Somos um país de especialistas. Parece que, embora em vias de desenvolvimento, já sabemos de tudo e, por isso, não temos necessidade de abrir dicionários", diz Martins.
O ponto de vista do jovem prosador encontra ressonância na fala do filólogo Evanildo Bechara, integrante da Academia Brasileira de Letras (ABL). Bechara tem 82 anos, leciona desde os 18, e durante a sua trajetória constatou que o chamado "homem comum" tem um vocabulário restrito e costuma se contentar com esse (limitado) repertório. "Às vezes, dependendo da profissão, falta estímulo para o sujeito procurar mais palavras, e ele (o sujeito) se acomoda", afirma Bechara.
Antônio Houaiss (1915-1999) costumava dizer que o "brasileiro comum" vivia e morria sem utilizar mais do que três mil palavras, e o idioma português oferece algo em torno de 400 mil palavras, um descompasso infinito.
Janela e academia de ginástica
Um dicionário pode ser um trampolim e mesma uma janela para o acesso às inúmeras maravilhas que um idioma certamente tem. Humberto Werneck conta que, quando vai ao dicionário, e ele faz isso diversas vezes todos os dias, nunca se limita a conhecer apenas a palavra que o impulsionou à consulta. "Dou uma sapeada geral, lambisco, me meto em labirintos verbais, vou tão longe que chego a esquecer o que me fez iniciar a consulta", afirma o jornalista e escritor, autor de O Pai dos Burros, Dicionário de Lugares-Comuns e Frases Feitas.
Pai dos burros, expressão que se tornou sinônimo de dicionário, em alguma medida foi responsável por afastar os moços, senhoras e estudantes de aurélios e houaisses. Afinal, há quem diga (e muitos repetem) que consultar o dicionário é revelar ignorância. Carlos Alberto Faraco observa que nenhum falante conhece, nem jamais conhecerá, todo o idioma. "Por isso, consultar um dicionário não pode ser motivo de vergonha, nem é sinal de ignorância. Bem ao contrário: é uma atividade normalíssima para quem lê ou escreve", afirma o professor titular (aposentado) de Língua Portuguesa da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
As ideias de Faraco vão ao encontro (e não de encontro, que seria discordar, e isso o dicionário pode esclarecer) às do escritor mineiro radicado em São Paulo Luiz Ruffato, autor da série de romances Inferno Provisório. Ruffato analisa que consultar dicionários é a prova cabal de que a pessoa é, no mínimo, curiosa. E a curiosidade, diz o prosador, é uma forma de inteligência. "Uma pessoa com vocabulário rico é potencialmente alguém que pode ocupar um lugar ao sol na sociedade, no mercado de trabalho", argumenta.
Humberto Werneck inventou ele mesmo um sinônimo para dicionários: uma caixa de primeira socorros. Mas ele também enxerga em um dicionário um manacial para quem queira explorar as virtualidades da língua. Um exemplo: em meio a suas incontáveis expedições, páginas e mais páginas lidas, viradas, manuseadas, Werneck encontrou uma palavra que jamais leu fora de dicionários. Trata-se de amaxofobia, que é o medo de se encontrar ou viajar num veículo. Curioso? "No mínimo, diferente, mas também muito interessante, não é mesmo?", diz, em tom de pergunta, o curioso prosador.
Carpinejar, por sua vez, diz pegar os dicionários para sonhar. "Gosto de ler palavras que nunca vou usar, e sonhar seus significados. Dicionário é o cemitério para quem parou de sofrer. Para mim, é academia de musculação imaginária", diz, fazendo poesia, o poeta gaúcho. Já o escritor pernambucano Marcelino Freire conta que faz ficção apenas com verbetes de dicionários (leia mais na outra matéria publicada nesta página).
Os dicionários, mais que trampolins, caixa de primeiros socorros ou eventuais academias de musculação imaginárias, podem ajudar as todos os que falam e escrevem a dizer e a escrever, e a viver, mais prazerosamente.