Aos 25 anos, 14 de carreira, ele já havia vendido 100 milhões de discos e se convertera no maior fenômeno da música pop na história. Até por isso, em 1991, a Sony não hesitou em lhe pagar US$ 1 bilhão em troca de um contrato de exclusividade. As coisas com Michael Jackson foram sempre assim, superlativas. Ninguém bateu recordes como ele no mundo da música.
Mas o Michael Jackson que criou o passo que chamou de "moonwalker", o caminhante da Lua, impôs para si mesmo o mais difícil dos caminhos. Negro, decidiu que queria ser branco. Fez todo tipo de cirurgia para afinar o nariz, amendoar os olhos, corrigir os lábios, clarear a pele. Escolhendo a musa Diana Ross como modelo, fez do próprio corpo cobaia de experiências para celebrar sua androginia. Para complicar, Michael, que segundo várias biografias não autorizadas seria virgem, gostava de ir para a cama com garotinhos em seu sítio sugestivamente chamado de Neverland (A Terra do Nunca). Não faria nada, apenas gostava de dormir juntinho.
Suas incursões pelo cinema foram desastrosas, ou quase. O remake de O Mágico de Oz, com Diana Ross, por Sidney Lumet - O Mágico Inesquecível -, foi um fiasco. Moonwalker, de Jerry Kramer, Jim Blashfield e Coklin Shilvers, consegue ser pior. Começa com o vídeo de Man in the Mirror e depois parte para uma edição de videoclipes da carreira do astro. Bad vira uma paródia interpretada por crianças e, na sequência, Michael persegue o vilão Mr. Big, interpretado por Joe Pesci. A participação em Homens de Preto 2, de Barry Sonnenfeld, é só aquilo que se chama de "cameo". O que seria seu grande filme, resultado do desejo de interpretar Peter Pan, nunca se concretizou por falta de acerto com o diretor Francis Ford Coppola.
Os filmes podem ter sido ruins - menos Men in Black II -, mas Michael é fundamental para a civilização da imagem, porque foi ele, ou em torno dele, que se iniciou uma nova era e uma nova linguagem para a música pop - o vídeo rock. Seus clipes fizeram história. Billie Jean, dirigido por Steve Barron; Thriller, por John Landis; Bad, por Martin Scorsese; Black and White, de novo por Landis; e They Dont Care about Us, por Spike Lee.
ÊXITO
Thriller fez sensação e permanece até hoje como um dos vídeos mais vistos da história com suas imagens de Michael Jackson dançando com zumbis. Bad mostra o garoto que sai do gueto, mas não consegue se integrar numa escola de riquinhos. Na cena famosa, Michael é perseguido por uma gangue sob a neve, numa rua deserta.
Black and White custou US$ 6 milhões em 1991, o mais caro clipe já feito. Começa com uma tomada aérea simulada por um computador e que termina dentro de uma típica casa de subúrbio americana. No andar de cima, um garoto - Macaulay Culkin, da série Esqueceram de Mim - ouve rock no último volume. Repreendido pelo pai, ele se vinga despachando-o para o espaço. O pai vai parar na África, no meio de uma caçada aos leões e entre nativos seminus, impecável na sua camisa de seda branca, surge... Michael Jackson para uma volta ao mundo, dançando com uma indiana, uma tribo de índios dos EUA e um grupo de russos. Nada faz sentido, mas é tudo muito elétrico.
O caso de They Wont Care about Us virou emblemático. Michael Jackson quis ambientar nos morros cariocas o visual da música que lamenta a falta de atenção para as crianças. Um juiz do Rio conseguiu interditar a filmagem, acusando o astro e o diretor escolhido, Spike Lee, de querer projetar uma imagem negativa do País para o mundo. A dupla foi parar em Salvador, onde o clipe foi filmado no Pelourinho. Michael Jackson veste camiseta do Olodum e, após executar seu passo famoso, arranca o cassetete de um policial. Mas a coisa não terminou ali e ele rodou cenas adicionais no Morro Dona Marta. Na época, a imprensa comentou que a equipe teria feito um acordo milionário com o tráfico para autorizar a filmagem.
Em se tratando de Michael Jackson, não seria de admirar, mas o que fez sua força e o mito talvez tenha sido essa vida em permanente mutação - e ele viveu aos olhos do mundo. De garotinho a caminhante da Lua, foi tudo, menos banal, como sugere que teria sido aquela simulação computadorizada que um site promoveu no ano passado, para comemorar seus 50 anos.
Um Michael Jackson negro, certinho? O sorriso franco da imagem projetada carrega certa tristeza. Michael Jackson, como Howard Hughes, não seria feliz, de qualquer maneira. Foi um louco, um visionário, uma cobaia de si mesmo. Foi Narciso e Peter Pan. É difícil, senão impossível, entender os gênios. Ao fazê-lo, quase sempre os apequenamos, ao tentar reduzi-los aos limites da normalidade (mas o que é isso, normal?). Steven Spielberg, seu amigo, talvez tenha matado a charada ao dizer que deveria ter sido em sua casa e não na de Elliott (Henry Thomas) que seu alienígena bonzinho deveria se ter escondido.
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