Em 1596, William Shakespeare e seus atores tiveram de deixar o teatro isabelino The Theatre, localizado em Shoreditch, em Londres, até então o recanto da dramaturgia inglesa.
O período de 21 anos de concessão do terreno ao ator e empresário James Burbage havia chegado ao fim, e o senhorio exigia as terras de volta. Desolados, Shakespeare e os homens de sua companhia, Lord Chamberlain’s Men, se uniram para roubar o teatro – tábua por tábua, prego por prego – e reconstruí-lo em outro lugar.
A história ocorrida em 28 de dezembro de 1598 não é inédita e consta em diversas biografias de Shakespeare.
De acordo com a transcrição do processo judicial de 1601, Shakespeare, seus atores e amigos foram “violentos” em uma ação “desenfreada” que destruiu o The Theatre.
Até então guardado em segurança pelo National Archive, o arquivo do Reino Unido, o documento é uma das peças que serão exibidas ao público no centro cultural londrino Somerset House, a partir de fevereiro de 2016, ano em que se completam quatro séculos da morte do bardo. O evento é promovido pelo arquivo nacional inglês e o London Shakespeare Centre, braço da King’s College London para pesquisas e estudos da obra de Shakespeare.
“Estamos fazendo a montagem e a curadoria dos documentos para mostrar o drama dos eventos originais, a maneira pela qual eles foram passados às gerações ao longo do tempo”, diz Gordon McMullan, professor de língua inglesa do London Shakespeare Centre.
Além da transcrição da justiça sobre a ação da “gangue” de Shakespeare – que nunca foi julgado por isso –, há outros documentos do século 17 que rastreiam a vida do dramaturgo, desde os dias em que era pobre demais para pagar impostos – antes de cair nas graças do rei Jaime VI da Escócia e I de Inglaterra como o melhor dramaturgo da corte – até o testamento, em que lega à família bens de um homem em situação financeira confortável.
“O testamento joga luz sobre as relações familiares e sociais de Shakespeare”, diz Gordon McMullan, professor de língua inglesa do London Shakespeare Centre. Uma delas é a ligação conflituosa com a primeira mulher, Anne Hathaway, a quem deixou sua “segunda melhor cama e mobília”. Muito se especula sobre o significado disso, mas, de acordo com o National Archive, isso significa que os filhos de Shakespeare ficariam com os melhores legados, enquanto à mulher caberia o que viesse depois.
Deixou, ainda, um grande valor – mas não especificado em cifras no testamento – à filha mais velha, Susannah Hall. À mais nova, Judith, coube a quantia de 300 libras – corrigido, o valor hoje seria superior a 50 mil libras, ou R$ 295,8 mil.
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