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Zagueiro Jeci acredita na manutenção da boa fase contra o Paulista, a partir das 16h deste sábado | Albari Rosa / Gazeta do Povo
Zagueiro Jeci acredita na manutenção da boa fase contra o Paulista, a partir das 16h deste sábado| Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo

O passado no cinema

• Na Arena – No épico Gladiador, de Ridley Scott (que no passado também dirigiu os ótimos Blade Runner – O Caçador de Andróides e Thelma & Louise), Russell Crowe vive o comandante do exército romano Maximus, que após a morte do imperador Marcus Aurelius (Richard Harris) é condenado à morte pelo ambicioso Commodus (Joaquin Phoenix), mas consegue escapar com vida, apesar de perder sua família. Vendido como escravo, Maximus deve lutar na arena até conseguir a sua vingança.

• Espartanos e persas – O filme 300, dirigido por Zack Snyder e baseado nos quadrinhos de Frank Miller, retrata a luta entre os espartanos, tendo à frente o rei Leônidas (Gerard Butler), contra os persas, que pretendem conquistar a Grécia, comandados pelo exótico Xerxes (Rodrigo Santoro, irreconhecível). Alguns críticos apontam a relação entre o contexto do filme e a complicada relação entre Estados Unidos e Islã.

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Quando Ridley Scott lançou seu filme Gladiador, em 2000, todos os olhos de Hollywood se voltaram a ele. O motivo principal da agitação se dava pelo fato de que há quase três décadas não se produzia um filme épico e ninguém podia prever com muita segurança qual seria a aceitação. Lembro-me que, na ocasião do lançamento do filme, fiquei muito curiosa em saber o resultado, pois como estudiosa do Império Romano e, em especial das lutas de gladiadores, chamou-me a atenção o fato de escolherem um gladiador como protagonista do filme, em um contexto muito diferente do momento da produção do clássico Espártaco de Kubrick.

Fui, então, ao cinema e fiquei impressionada com o resultado: embora o filme tratasse de lutas de gladiadores, algo tão distante do cotidiano brasileiro, as pessoas torciam e se emocionavam a cada gesto ou fala de Maximus, o gladiador interpretado por Russell Crowe. A experiência me fez refletir sobre um aspecto da História de Roma, que até aquele momento havia me passado despercebido: sua vivacidade, ou seja, como um período tão distante no tempo e espaço ainda chamava tanto a atenção no nosso mundo contemporâneo.

Essa inquietação me levou a prestar mais atenção ao meu dia-a-dia e fui percebendo, enquanto escrevia minha tese de doutorado, que os mundos dos romanos e dos gladiadores estão bem mais presentes do que pode parecer a uma primeira vista. Games como Age of Empires, o cinema com os clássicos da década de 1960 ou os novos filmes produzidos a partir de 2000, as séries da Discovery Channel ou, mais recentemente, o seriado Roma, tem aumentado a popularidade do mundo romano junto a um público diversificado e esta mistura de História e ficção tem produzido novas maneiras de relação com o passado romano.

O estudioso inglês Richard Hingley afirma, em diversos livros e artigos publicados, que a capacidade de Roma promover imagens para o mundo moderno é quase ilimitada e se tornou uma fonte rica para dar sentido tanto à História como à política, à identidade, à memória ou mesmo aos desejos. Muito embora suas reflexões sejam específicas e versem sobre as maneiras como as imagens dos romanos foram utilizadas na concepção da identidade inglesa no final do século 19 e início do 20, Hingley nos ajuda a pensar a riqueza das representações da sociedade romana no imaginário dos modernos de diferentes nações.

Neste sentido, o sucesso do filme Gladiador pode ser entendido em um contexto mais amplo. Mais do que tentarmos separar o que é verdade do que é ficção no filme, é interessante perceber a recepção deste fenômeno na sociedade brasileira e como os gladiadores atravessam nosso cotidiano em campos inusitados.

Só para refrescar a memória do leitor, basta nos dirigirmos às narrativas esportivas. Durante a Copa do Mundo de 2002, não era difícil encontrar comparações de Kahn, o goleiro da seleção alemã da época, com um gladiador. No mundo dos esportes contemporâneo, essas comparações aparecem com uma certa freqüência: enquanto muitos atletas são comparados a gladiadores ou heróis míticos, os torcedores, em geral, são vistos como os romanos comuns que freqüentavam as arenas ou corridas de bigas.

As comparações não se restringem ao futebol, mas a toda uma gama de esportes que inclui até o surfe, já que muitos surfistas, por encararem desafios no mar, são comparados aos corajosos gladiadores do tempo dos romanos.

Mas, se no cinema e no mundo dos esportes a presença dos gladiadores é relativamente comum, o livro de Hyrum Smith, autor norte-americano de vários best sellers, leva o gladiador a um mundo muito particular, o empresarial. Com o curioso título O Gladiador Moderno, o best seller de Smith compara o guerreiro antigo ao moderno empresário. Contrapondo a arena antiga ao que denomina arena moderna, Smith usa de uma linguagem dos jogos de gladiadores para explicar ao empresário a importância do treinamento e uso de instrumentos apropriados para vencer as batalhas do moderno mundo corporativo empresarial.

Cinema, esporte e competitividade empresarial, três universos totalmente distintos que se entrecruzam por meio das comparações com as arenas romanas. O que, a princípio, pareciam comparações inconcebíveis, acabam constituindo parte de um imaginário contemporâneo e fazem pensar como estes sujeitos históricos, os gladiadores romanos, são relidos e transformados em poderosas metáforas de coragem e auto-realização em diferentes mídias.

Seguramente, o perfil do gladiador que surge nesses discursos não é fundado na especificidade histórica romana, mas pelo contrário, é construído a partir de generalizações e da homogeneização da sociedade romana, criando uma ponte segura entre passado e presente, baseada em princípios eternos e universais e não nas particularidades de cada momento.

Assim, as imagens que circulam pela mídia nos apresentam gladiadores adaptados aos valores modernos para atender ao mercado de consumo de massa, indicando que Roma segue viva e importante para a constituição de visões de mundo modernas. Perceber este fenômeno é instigante, na medida em que nos convida a estudar o passado e refletir sobre o nosso presente.

Renata Senna Garraffoni, professora de História Antiga na Universidade Federal do Paraná.

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