O sucesso de uma piada é diretamente proporcional à quantidade de verdade contida nela – daí vem a identificação por parte do público e as risadas que lavam a alma do autor da tirada. Shakespeare ensina isso em suas peças. Sejam cômicas ou trágicas, trazem um bobo da corte que denuncia hipocrisias, casos amorosos e recebe em troca tapinhas condescendentes ou um punhado de moedas, dependendo do interlocutor.

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No Brasil do século 21 temos até um palhaço que se elegeu parlamentar dizendo o que a maior parte da população queria ouvir: "Alguém aí sabe o que faz um deputado federal?"

Tendo desfrutado de tamanha liberdade a partir da redemocratização, o humor brasileiro passa por um momento delicado. Os casos recentes em que comediantes deixaram um pouco de lado a realidade e partiram para o choque puro e simples e para ofensas pessoais, sacudiram de tal forma a opinião pública que eles agora discutem o retorno da censura.

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"Precisamos tomar cuidado para não transformar o humorista em algo venenoso", alerta Marco Zenni, organizador do festival Risológico, realizado no começo do mês em Curitiba. "Vai começar assim; do humorista vai passar para o músico, depois para o jornalista, e daqui a pouco estaremos com a censura de volta."

Em vez de contar com uma cartilha sobre o que pode e o que não pode ser dito, os profissionais do humor apostam no tino pessoal para evitar novos deslizes. Diogo Portugal, pioneiro do stand-up comedy em Curitiba, se baseou na opinião do público e em várias referências para construir seu estilo próprio. Dos Estados Unidos, ele trouxe as piadas sobre o cotidiano, tais como os jargões de determinadas profissões, muito usados por Jerry Seinfeld. No Brasil, se inspirou em José Vasconcellos – humorista morto na semana passada, aos 85 anos. "Foi o precursor do one-man show", diz Diogo. Acrescentando pitadas de Jô Soares e Chico Anysio, em que via uma linha tênue entre a piada e o texto autoral, Diogo foi testando seu humor em palcos de bar.

Na tevê

"Naquele início, a gente sentia [até onde podia ir] com a plateia. Ninguém ainda estava na mídia", relembra, destacando que é diferente avançar o sinal do politicamente correto numa piada feita num local fechado e em canais abertos de tevê.

Foi o que sentiu na pele quando passou a integrar o time de humoristas do Fantástico. "O texto é mais limpo, porque é um horário que ainda pega crianças acordadas" Em shows ao vivo, ele sente ter liberdade para falar "um monte de coisas".

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Diogo, Zenni e vários outros comediantes ouvidos pela imprensa nas últimas semanas concordam que as piadas-escândalo de Rafinha Bastos foram sem graça e exageraram ao fazer ataques pessoais. Mas todos pedem a união dos artistas para não deixar que "vire perseguição", nas palavras de Diogo. "Daqui a pouco nós [os humoristas] vamos ter que fazer queixar de bullying. Humorista cria piada, não polêmica."