O dono do estacionamento queria saber sobre o que era a peça. “Bom”, pensei, “o que eu poderia dizer para atrai-lo a ir ver por si mesmo?” Acabei dizendo que eram várias histórias, o que não deixa de ser verdade. Mas o sujeito não se contentou e até demonstrou tino para o contemporâneo. “Hum... e elas se misturam no final?”

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As três tramas de Declínio do Capital Amoroso Enquanto Sarabanda são inspiradas em quatro filmes do cineasta sueco Ingmar Bergman (Persona, Vida de Marionetes, Cenas de um Casamento e Sarabanda). Mas apenas personagens e linhas gerais de suas trajetórias são utilizadas, ficando o restante a cargo da imaginação do dramaturgo Lucas Komechen e de posicionamentos feministas do grupo.

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Declínio do Capital Amoroso Enquanto Sarabanda

Teatro Falec (R. Mateus Leme, 990) (41) 3352-2685. Direção de Cris Betina Schlemer. 5ª a sáb. às 20h e dom. às 18h e 20h. Até 22 de março. R$ 20 e R$ 10 (meia-entrada). Classificação indicativa: 12 anos.

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Uma senhora de 60 anos visita uma advogada e mais tarde revela quem realmente é; uma atriz tenta engolir o fim da carreira após o nascimento de uma filha temporã, justo no auge da temporada em que estava brilhando como Nora, de Casa de Bonecas. A peça do norueguês Henrik Ibsen, de 1879, é alvo de um feliz resgate nos diálogos de Declínio. Longos diálogos, numa homenagem à obra dos dois escandinavos. Por fim, a atriz também visitará a advogada.

Sim, as histórias de misturam! O que requer a mente atenta aos diversos relatos e saltos no tempo.

Com cenário, figurino e sonoplastia inicialmente soturnos e discretos, a peça deixa bastante espaço para o trabalho das duas atrizes. Já nos primeiros segundos, Ludmila Nascarella demonstra que aproveitará muito bem a oportunidade, com exuberância e ironia tanto na tensão quanto na comédia. Atenção, olheiros da Rede Globo, que tal uma passada no escondido Teatro Falec?

Carolina Rodrigues também segura todas as petecas que a colega joga e desabrocha na segunda parte do espetáculo, quando entra em cena a comédia.

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O segundo capítulo traz as duas atrizes numa demonstração de maturidade profissional, quando mudam a chave para o humor. Internada na maternidade, a atriz Irina conversa com a enfermeira Pietra. O misto de adoração e rejeição ao bebê que poderia ser confundido com depressão pós-parto ganha uma carga pesada em vídeos repletos de sangue. A alusão ao aborto cai como uma pedra sobre o palco, misturada ao abandono de Nora aos filhos nas citações a Casa de Bonecas. Provoca uma certa indigestão, tal como a peça de Ibsen causa até hoje. Ecoa ainda o filme Persona, em que uma atriz emudece e questiona a maternidade.

O único senão – à parte a sanguinolência, cuja apreciação dependerá do estômago e do posicionamento de cada um sobre a interrupção da gravidez –, seria que as narrativas caminham para o nada, sem um desfecho que parece desejável.