Maior clássico da música paranaense, a canção As Mocinhas da Cidade foi “resgatada” por uma decisão judicial pela família Graciano, herdeira do espólio da obra da dupla Nhô Belarmino & Nhá Gabriela que fez sucesso no pais inteiro entre as décadas de 1940 e 1980.
A canção havia sido usurpada há cerca de dez anos pela banda baiana de forró Arriba Saia. Com o nome de “Enche Bailão”, a canção teve a letra original de Salvador Graciano (nome real do Nhô Belarmino) alterada e foi editada como sendo de autoria de Roney Brasil líder da banda de forró.
A música foi gravada no disco Libera o Toim de 2005 e se tornou um grande sucesso no circuito de shows do Nordeste. A notícia do furto da canção chegou em 2006 aos ouvidos do musico Ivan Graciano, (filho de Nhô Belarmino) através de fãs da música de seu pai.
“As pessoas viajaram para o Nordeste e ouviram e me ligavam. Este pessoal simplesmente pegou a música do meu pai, modificou a letra colocando alguns versos de mau gosto. E fizeram muito sucesso”, conta Graciano. “Em parte, tinha um lado benéfico, pois fez o povo cantar novamente a música. Se eles tivessem me procurado, eu teria autorizado com prazer como fiz nas outras diversas gravações da música”, observa. “Mas não foi isso que aconteceu, eles omitiram a autoria do meu pai e isso é inaceitável, ainda mais uma música como essa que não é pertence só ao Nhô Belarmino, o aos seus herdeiros, mas ao estado inteiro”, concluiu.
Em 2007, o advogado José Alexandre Saraiva entrou com uma ação na 20ª Vara Cível de Curitiba e conseguiu uma decisão liminar que impedia o grupo baiano de continuar tocando a música e s gravadoras a retirar os CDs que contêm a música de todas as lojas e rádios. Depois de nove anos de tramites processuais, na última segunda-feira saiu a a sentença definitiva da ação condenando o Roney Brasil a pagar uma indenização por danos morais à família Graciano.
“Eles editaram a música como própria de uma maneira brutal, deturpando o lirismo original que a colocou no imaginário de várias gerações”, observa Saraiva.
Ele conta que esta ação foi uma das que lhe deu maior alegria em toda a carreira pois “resgata um patrimônio cultural paranaense e uma espécie de hino popular do estado”.
Saraiva disse que pretende recorrer da decisão, pois a sentença não inclui a gravadora como corresponsável apenas o musico usurpador. Ele explica ainda que a decisão a estipulou o valor do dano moral (cerca de R$ 40 mil), mas os danos materiais serão calculados durante a fase de liquidação da sentença. “Na época do lançamento do disco, a banda deu declarações públicas que vendeu mais de 1,5 milhão de cópias e isto foi comprovado nos autos”, ressalta.
Para Ivan Graciano, a indenização vale menos do que o acerto de contas com a memória do pai. “Para nós da família, o mais importante é dar uma resposta para os fãs de Belarmino e Gabriela de que há uma sentença judicial decidindo a questão”, afirma. Para Graciano, que é presidente da Ordem dos Músicos do Paraná, a sentença também pode servir como base legal para outros casos semelhantes.
“Serve para restabelecer uma relação de respeito que deve existir no mercado musical. Meu pai me ensinou que música é um trabalho sério como qualquer outro e é preciso ser feito com responsabilidade”, disse.
As Mocinhas da Cidade, maior sucesso da dupla Nhô Belarmino e Nhá Gabriela quase não foi gravada. “Esta música foi composta por ele ainda no tempo de solteiro (Salvador e Julia Graciano se casaram em 1939). O pai já a cantava antes formar a dupla com a mãe quando ainda se apresentava como Belarmino e sua trupe”, explica Ivan Graciano.
Ele conta que o pai considerava a música “muito simples poeticamente e achava que ela cabia melhor nos espetáculos de circo que eles faziam”. Tanto que apesar de estar no reportório de Belarmino há anos, a música não entrou nas primeira gravação feitas por eles na antiga RCA no Rio de Janeiro no início dos anos 1950.
A música só foi registrada por insistência da Nhá Gabriela em 1959 como lado B da moda Paranaguá. Em 1961, a música foi incluída no primeiro LP da dupla e desde então é o seu maior sucesso projetando o nome dos dois em todo o Brasil. “A musica era perfeita para o tipo de show humorísticos que eles faziam em dupla e virou uma referencia da musica paranaense desde então”.
Anos depois, Belarmino compôs uma resposta à canção chamada” As mocinhas do sertão”. “As Mocinhas da Cidade” já teve mais de cem gravações inclusive em países como Alemanha, Portugal, Paraguai e Argentina.
Escute abaixo a versão original de As Mocinhas da Cidade e e a versão “roubada”do grupo de forró Arriba Saia com as respectivas letras:
As mocinhas da cidade (Nhô Belarmino)
As mocinhas da cidade
São bonitas, dançam bem
Eu dancei uma vez
Com uma moreninha
E já fiquei querendo bem
Embora seu pai não queira
Que eu me case com você
Só depois de nós casado
Ele vai nos compreender
Fui na casa da morena
Pedir água pra beber
Não é sede, não é nada, moreninha
Eu vim aqui só pra te ver
E o sol já vai entrando
E a saudade vai atrás
Vou casar com aquela linda moreninha
Pra nós dois viver em paz
Enche Bailão
Arriba Saia, meu bem
Arriba Saia,
Arriba Saia tá gostoso pra danar
Arriba Saia, meu bem
Arriba Saia,
Arriba Saia que o forró vai começar
As mocinhas da cidade são bonitas e dançam bem (bis)
Eu dancei com uma linda moreninha
Já fiquei querendo bem. (bis)
Fui na casa da morena, pedi água pra beber. (bis)
Não é sede, não é nada, moreninha. Vim aqui só pra te
ver (bis)
Embora seu pai não queira que eu me case com você
(bis)
Eu te levo pra Bahia, moreninha, lá eu caso com você
(bis)
Estava eu e ela só, no jardim do amor
Eu beijava a boquinha dela, quando o pai dela chewgou
E ela então me disse, não me beije mais (bis)
Olhe para o lado, que lá vem meu pai (bis)
Eu fiquei nervoso, meio atrapalhado (bis)
Quando eu queria correr, o velho já tinha chegado.
(bis)
Rosa, Maria e Aurelina, eu vou dançar com essas três
meninas (4 vezes)
Arriba Saia, meu bem
Arriba Saia,
Arriba Saia tá gostoso pra danar
Arriba Saia, meu bem
Arriba Saia,
Arriba Saia que o forró vai começar