Fabrício Carpinejar teve de morrer para escrever “Todas as Mulheres”, livro de poesia que ele lançado nesta segunda-feira (9). A obra – um poema único separado apenas por marcações gráficas – tem como narrador um poeta que, do outro lado da vida, observa o próprio velório.
O espírito do poeta passa os olhos pelas mulheres presentes na cerimônia derradeira, ele tenta responder (sem sucesso) a uma questão fundamental: “Quem mais me amou?” Percebe, contudo, que a pergunta essencial é “quem eu mais amei?”. “A ideia é abordar o narcisismo, o querer ser amado”, diz Carpinejar.
A inversão retórica, para o escritor, faz toda a diferença.
“Todas as Mulheres” encerra um jejum de oito anos sem poesia, desde “Meu Filho, Minha Filha” (2007). Nesse período, Carpinejar lançou coletâneas de crônicas como “Para Onde Vai o Amor”, deste ano, e “Canalha!”, que arrebatou o prêmio Jabuti na categoria Contos e Crônicas em 2009. Enquanto publicava sua prosa, dedicava-se à poesia na miúda: passou todo esse tempo escrevendo a obra que agora apresenta.
“Poesia é rigor; é não apenas encontrar a palavra certa, mas o silêncio exato”, diz Carpinejar sobre o hiato. “Em poesia não tem como errar – ou melhor, a poesia tem de ser o seu erro preferido.”
LIVRO
Fabrício Carpinejar. Bertrand Brasil. 112 pp. R$ 25.
Machadiano
A morte do poeta-narrador não foi uma escolha casual – a exemplo do Brás Cubas de Machado de Assis, cujas memórias haveriam de existir apenas depois do fim, Carpinejar teve de matar a si mesmo para enxergar suas vísceras.
“Imaginei que só poderia ser realmente cruel comigo mesmo se eu estivesse morto”, afirma.
Carpinejar acredita que a morte – ainda que encenada, emprestada ao narrador – garante o distanciamento necessário para não corromper o objeto observado: neste caso, as entranhas sentimentais. “Querer ter posse das coisas faz com que você contamine as coisas com o próprio desejo.”
O exercício de morrer, segundo o escritor, mudou seu conceito sobre a morte. “O que agora me atormenta é não haver imaginação na morte. Resta apenas a crueza da memória [dos outros]”, afirma.
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