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Nos relatos, homens estão em primeiro plano, porém são reféns dos desejos das mulheres, ou da impossibilidade masculina em compreendê-los.

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O título, “Homens Sem Mulheres”, é surrupiado de Hemingway (1899-1961), cuja segunda coletânea de contos (1927) trazia, além dessa coincidência, o célebre “Colinas como Elefantes Brancos”, no qual um casal discute a possibilidade de um aborto. Certo clima desse relato, dos poucos do autor norte-americano protagonizado por uma mulher, impregna o novo livro de Haruki Murakami, primeiro de contos dele publicado no Brasil.

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O protagonismo da mulher na história de Hemingway, estruturada sobre diálogos repletos de pausas, pode ser deduzido ao final: apesar de eivada de ironias, é evidente que a vontade dela prevalecerá, e não a do homem que deseja que ela se opere.

Nos relatos de Murakami, homens estão em primeiro plano, porém são reféns dos desejos das mulheres, ou da impossibilidade masculina em compreendê-los.

Na primeira história, “Drive My Car”, o viúvo de meia-idade Kafuku contrata uma moça para conduzi-lo diariamente ao trabalho. É um ator, e em pouco tempo passa a confessar à motorista suas dúvidas em relação à finada mulher, ela também atriz. Ambos perderam o filho ainda criança, e a partir do incidente ela passou a traí-lo com outros homens, em geral atores com quem contracenava. Kafuku fazia suas vontades, mesmo assim era traído, e não compreende o motivo.

livro

Homens sem Mulheres

Haruki Murakami. Tradução de Eunice Suenaga. Editora Alfaguara. R$ 42,90. 240 págs.

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A resposta, tão elíptica como nos contos de Hemingway ou nos de Raymond Carver (1938-88), notórias influências do autor japonês, está na algo máscula Mazaki, a motorista, e em suas buscas pessoais.

Talvez esteja também no fato de que Kafuku seja alguém pouco atraente quando não está nos palcos, e um tanto vazio. Essa indecidibilidade provocada pela confusão entre causa e efeito, ampliada pelos finais abertos, em abismo, fornece aos contos de Murakami sua maior qualidade, resultante da permanente inquietação dos personagens.

Vítimas de sua ignorância afetiva, ou do medo de amar, os homens desses contos encontram sua mais bem acabada encarnação no doutor Tokai, do longo “Órgão Independente”.

Cirurgião plástico e solteirão convicto, ele se apaixona pela primeira vez na vida por uma jovem mulher casada. Quando ela o rejeita, ele se recusa a comer e morre de inanição. É uma perfeita metáfora para a triste masculinidade tornada emblema pelo título do livro.