Tinha hipster catando milho em máquina de escrever? Tinha. Aspirante a escritor fantasiado de dândi, esperando baixar o espírito de Faulkner? Também. Gente fazendo selfie a dar com o pau (de selfie) com escritores que jamais leram ou lerão? Pode apostar que sim. Rodas de escritores enchendo a cara de cerveja e cachaça Maria Izabel e falando mal de colegas ausentes? Vi acontecer diversas vezes. Assim como esbarrei e me esgueirei entre vendedores de bugigangas, repentistas, índios, bichos grilo de todas as origens, vendedores de cocada, atores, grupos de aposentados, poetas diletantes e sabe-se lá o que mais no meio das cerca de 25 mil pessoas que passaram pela Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) 2015.
Há também, é claro toda a programação oficial e extraoficial da maior festa literária do país , inspiração para as dezenas que rebentaram no país desde 2003, quando ocorreu a primeira Flip.
Neste ano de crise econômica, dólar alto e outras adversidades, a incerteza de uma Flip sem grandes estrelas da literatura internacional foi quebrada por alguns acertos notáveis da curadoria. Como uma boa seleção de convidados em ascensão, caso de Matilde Campilho, a escolha de temas como literatura erótica, matemática, e das estrelas da festa que, se não tinham tanto nome, conquistaram “em campo” o status como o dramaturgo inglês David Hare, verdadeiro showman, e a argentina Beatriz Sarlo, que deu aulas diárias de integridade pessoal e intelectual ao circular por Paraty.
O diretor-presidente da Casa Azul, Mauro Munhoz, destacou a presença de mais espaços gratuitos – neste ano aumentou o número de telões para acompanhar os eventos da programação oficial e mesmo quem não pagou teve direito a um fone para ouvir as traduções simultâneas.
Com tudo isto à mesa, uma pergunta logo surge: E há também leitores no meio desta massa? Duas respostas possíveis são: “certamente” e “nem tanto”.
Em final apoteótico, Wisnik lê o Brasil refletido em Mário de Andrade
Aplaudido de pé durante minutos , o sociólogo José Miguel Wisnik encerrou a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip)
Leia a matéria completaAmbas podem ser fundamentadas com os dados fornecidos por Rui Campos, um dos sócios da livraria da Travessa, há três anos a loja de livros oficial da Flip. Segundo Campos, foram vendidos cerca de 20 mil títulos nos cinco dias da festa. É pouco ou é muito? Campos explica que o número é cinco vezes maior que os números alcançados por sua loja mais rentável (no bairro Leblon, no Rio de Janeiro). É certo também que a Travessa não era a única loja de livros, aliás, há mais de 50 pontos vendendo obras de todos as cores e tamanhos. Esta questão menor cabe dentro de uma mais ampla: para que servem festas literárias?
O escritor Marcelino Freire “aposta que é para colocar a literatura no centro da discussão nem que seja por poucos dias no ano”. Como muitas pessoas que frequentaram Paraty se entusiasmaram com a noticia de que o livro de cartas de Mário de Andrade superou as vendas do livro para colorir “Jardim Secreto”. Uma notícia que era repassada como senha para regozijo nas esquinas da Flip como uma vitória da literatura. “Os escritores que eu amo me causam desconforto, me levam para longe do mundo colorido. Até para o lado das trevas, que é onde agente se descobre. Mário de Andrade descoloriu o mercado da literatura esta semana”, disse Freire.
1º - “Jóquei”, de Matilde Campilho
2º - Box de Mário de Andrade: “Amar, verbo intransitivo”, “Macunaíma” e “Contos novos”
3º - “Limiar: Uma década entre o cérebro e a mente”, de Sidarta Ribeiro
4º - “Amor e Matemática: O Coração da Realidade Escondida”, de Edward Frenkel
5º - “Brasil: Uma Biografia”, de Lilia Moritz Schwarcz e Heloisa Murgel Starling
6º - “O Brilho do Bronze”, de Boris Fausto
7º - “Gomorra”, de Roberto Saviano
8º - “A Ilusão da Alma”, de Eduardo Giannetti
9º - “Agora Ninguém Precisa de Si”, de Arnaldo Antunes
10º - “Sonhos em Tempo de Guerra”, de Ngugi wa Thiong’o
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