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Por que devo ler uma novela de 155 anos de um autor chamado Ivan Turguêniev? Ele publicou “Primeiro Amor” em 1860 na Rússia, um país secundário na época.

A obra de apenas um núcleo narrativo e cem páginas tem edição bem cuidada e, talvez pelo texto ser de domínio público, é baratinha.

Porque ele é um clássico, me dizem os editores, então devo lê-lo, mesmo neste mundo transbordante de narrativas.

Se concordo com Ítalo Calvino quando ele diz que “os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram”, posso deduzir que “Primeiro Amor” de alguma forma já se encontra em mim. A leitura seria então releitura, o conhecimento, reconhecimento.

Três amigos contam como conheceram o primeiro amor. Um deles narrará a história de seu amor pela filha de uma nobre decadente, vizinha da casa de campo de seus pais. Ele, um menino de 16 anos, às voltas com a “princesinha” Zinaida, cinco anos mais velha. Ela manipula uma corte de pretendentes, levando-o a se morder de ciúmes. O final seria surpreendente se mantivesse em dúvida com quem ela ficava. A revelação enfraquece um pouco o livro.

“Primeiro Amor”

Ivan Turguêniev. Tradução de Rubens Figueiredo. Companhia das Letras, 112 pp., R$ 24,90.

Turguêniev foi o primeiro escritor russo traduzido para o francês. Mudou-se para Paris e se tornou queridinho de Flaubert, para quem “suas descrições pensam”.

No “Primeiro Amor”, muitas vezes os nobres se comunicam em francês – o que revela uma desconexão da realidade social. Cadê os escravos, cadê os servos russos?

Em uma cena, rara, um servo velho e mal vestido espera deitado no chão do quarto o jovem apaixonado chegar para ajudá-lo a tirar a roupa.

É justamente essa ausência que grita nas duas narrativas.

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