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Não seria exagero afirmar que “O Adolescente” fecha um capítulo fundamental na recepção das obras do escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881) no Brasil. Coroando um esforço iniciado na virada do milênio, agora os cinco grandes romances do autor estão em português, vertidos por um mesmo tradutor, Paulo Bezerra, e publicados pela mesma editora, a 34.

Criada para difundir as produções literárias dos países da antiga Cortina de Ferro, a Coleção Leste da 34 acabou completamente dominada pela Rússia. Nessa trajetória, a editora veio a estabelecer paradigmas de excelência graças, entre outros fatores, a uma afiada equipe de revisores capazes de cotejar as traduções com o original.

O salto qualitativo partiu do pressuposto de que traduções a partir de versões em outras línguas mais acessíveis, como o francês ou o inglês, não seriam mais toleradas. A 34 incorporou a seu catálogo o “pai fundador” da tradução russa no Brasil, Boris Schnaiderman e, a partir de “Crime e Castigo”, em 2001, adotou Paulo Bezerra como responsável pelas mais volumosas criações dostoievskianas.

O Adolescente

Fiódor Dostoiévski. Tradução de Paulo Bezerra. Editora 34, 624 pp., R$ 84.

Embora seja o autor russo mais conhecido no Ocidente, Dostoiévski não constitui unanimidade em sua terra natal. De Nabókov a Sorókin, não faltam compatriotas para questionar seu estilo.

Em “O Adolescente” – como em suas outras traduções –, Bezerra não “embeleza” nem “amacia” a escrita dostoievskiana, mantendo as repetições, digressões e volteios que constituem sua força e motivo de incômodo.

Pela boca de um personagem, Dostoiévski encerra o menos conhecido de seus grandes romances com uma autoanálise crítica, na qual o define como a história de uma “família casual”, que se funde na “desordem geral e no caos”.

Ao adotar como protagonista um bastardo que deseja se tornar “um Rothschild”, Dostoiévski reflete a respeito das vertiginosas mudanças sofridas pelo país a partir da década de 1860, com a aceleração do desenvolvimento capitalista. Não por acaso, vários pensamentos parecem ecoar as atividades jornalísticas de “Diário de um Escritor”.

Conflito de gerações, romance de formação, história de adultério: a partir de modelos e referências díspares e contraditórias, Dostoiévski urde uma trama tortuosa, entremeada de discussões filosóficas e episódios paralelos – na terceira parte, ele faz a criada Lukéria narrar um vigoroso conto de aldeia que, se publicado de forma autônoma, possivelmente seria tido como um dos melhores exemplos da prosa curta do escritor.

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