| Foto: Divulgação /

Além de conhecimento técnico, bom gosto e alguma cara de pau, é necessário coragem para colocar jazz, punk, brasilidades, referências japonesas e aparatos eletrônicos na mesma música. O desafio é criar algo minimamente original num momento em que influências e estilos se misturam meio que sem razão.

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Guilherme Mendonça, o Guizado, arriscou. Se o trompetista trabalha com gente como Karina Buhr, Nação Zumbi, Cidadão Instigado e Curumin, tem em Miles Davis e Dizzy Gillespie suas principais referências. Se foi chamado de “erudito contemporâneo”, dá um rolê de skate em São Paulo. E por isso faz, desde a estreia com o elogiado “Punx” (2008), um tipo de música “urbana” muito atual: experimental e instigante na mesma medida.

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“O Voo do Dragão”, lançado em dezembro, é o terceiro disco do trompetista. Dessa vez, Guizado se inspira na cultura oriental – a arte da capa é do artista japonês Atsuo Nakagawa. As oito músicas fazem do álbum uma viagem a um mundo em que Thelonious Monk e Daft Punk têm olhinhos puxados e convivem numa boa.

 

“Sete Lâminas” homenageia o jazz-soul de grupos nu-jazz como Menahan Street Band, antes de um trompete voar baixo por batidas eletrônicas (e como Guizado toca bem, rapaz). Em “Cachorro na Estrada”, o clichê das flautas japonesas é equilibrado por um groove insinuante e frases distorcidas. “Rompe, desce e olha/ toda sua história/ o seu jeito de viver”, “canta” Guizado num pequeno manifesto pelo desprendimento musical. Pois é isso que o paulista é: um libertário.

O Voo do Dragão

Guizado. Independente. Preço médio: R$ 21,90 (disponível no Spotify).

O punk surge em “Ah-Hey”, faixa dividida em três partes, recheada de pequenos improvisos em que a bateria urgente se destaca. O trunfo de Guizado aqui foi encaixar um trompete tão afiado e explosivo quanto a base construída por Allen Alencar (guitarra), Thiago Duar (sintetizador/baixo), Thiago Babalú (bateria) e Caetano Malta (sintetizador).

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“Voo do Dragão” (homenagem ao filme de Bruce Lee de 1972) tem a elegância de uma trilha de Ennio Morricone repaginada – apesar da rebeldia, Guizado gosta mesmo dos clássicos. O disco encerra com “Luzes”, música imagética e de melodia assoviável.

Com “Voo do Dragão”, Guilherme Mendonça mostra que é possível aliar diferentes interesses estéticos e musicais num trabalho consistente e com identidade própria. Porque ouvimos Guizado e sabemos que é ele, além de todo o resto.