Notícias de um país distante

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No dia 9 de janeiro finalmente estréia nos cinemas brasileiros Desejo e Perigo, longa-metragem do taiuanês Ang Lee, vencedor do Leão de Ouro no Festival de Veneza em 2007. O cineasta já havia levado o mesmo prêmio dois anos antes pelo polêmico O Segredo de Brokeback Mountain, western sobre o caso de amor entre dois caubóis que lhe rendeu o Oscar de melhor direção.

Não menos controverso, Desejo e Perigo fez enorme sucesso na Ásia, onde também causou escândalo por seu alto teor erótico. Conta a história de Wang Jiazhi (a ótima estreante Wei Tang), jovem chinesa que entra na faculdade durante o período de ocupação japonesa, na Segunda Guerra Mundial. Na universidade, ela participa de um grupo de teatro patriótico, tornando-se rapidamente a atriz principal. No entanto, os planos da organização são mais ambiciosos: pretendem assassinar Yee (Tony Leung , grande astro do cinema oriental), colaborador dos japoneses. Wang, então, se transforma em Mak, fictícia esposa de um mercador. Sua função é se tornar amante de Yee e sua missão, matá-lo.

A aproximação entre Wang e Yee resulta num ambígüo jogo de sedução apimentado por cenas de sexo de fazer suar o espectador. 2009, portanto, vai começar bem.

Ang Lee, apesar de ter formação em Cinema nos Estados Unidos e de ser um nome consagrado em Hollywood, pertence a uma geração de realizadores chineses que legaram ao cinema mundial alguns dos títulos mais significativos produzidos nos últimos 30 anos. E, para compreender a evolução dessa produção, é imprescindível conhecer um pouco da história tanto da China, como de Hong Kong e Taiwan, no século 20.

China Continental

Os chineses costumam dividir seus diretores em gerações: a primeira é formada pelos pioneiros que levaram o recém-nascido cinematógrafo para o país e dedicaram-se mais a registros mudos da realidade local; a segunda, influenciada pelos vizinhos soviéticos, como Eisenstein, tinha identificação com a estética do realismo socialista. A chamada terceira geração foi impossibilitada de estudar cinema formalmente por causa da Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945) e da ocupação japonesa. A quarta foi composta pelos primeiros a estudar na Academia de Cinema de Pequim antes da Revolução Cultural (1966), mas não pôde ingressar na indústria até seu fim (1978), porque o governo comunista fechou a instituição. Em 1981, a escola foi reaberta, formando 2.100 alunos em áreas como atuação, direção, fotografia, engenharia de som e artes gráficas.

A partir da reabertura da Academia de Pequim, surge a quinta e mais significativa leva de diretores do cinema produzido na República Popular da China. Envolve cineastas formados pela faculdade despois de 1982.

Ao buscar uma linguagem mais voltada ao mercado e menos à serviço do Estado, a quinta geração deixou de lado temas "coletivos", alinhados com a idealogia socialista, para concentrar-se, sobretudo, em filmes sobre traumas individuais vividos durante a Revolução Cultural, muitas vezes abordados por meio de alegorias.

Marco

O longa-metragem Terra Amarela (1984) é considerado um marco na história do cinema chinês contemporâneo, sobretudo porque resulta do encontro dos dois principais nomes da quinta geração: Chen Kaige (de Adeus, Minha Concubina), que dirigiu o longa, e Zhang Yimou (leia quadro ao lado), que o fotografou.

A história de Terra Amarela se desenrola em uma província pobre às margens do Rio Amarelo. Em 1937, um soldado comunista chega à região com o intuito de coletar canções folclóricas e reescrevê-las para glorificar os ideais da revolução, que iria acontecer em 1949. Ele acaba inspirando uma jovem camponesa que decide resistir à imposição de um casamento sem amor com um homem bem mais velho, arranjado pela família.

O filme é uma crítica disfarçada à Revolução Cultural, que limitou as liberdades individuais, inclusive as manifestações políticas. A protagonista seria o símbolo dessa revolta e dessa imobilidade. Foi a primeira produção da quinta geração a alcançar sucesso e repercussão internacional.

Em 1993, Chen Kaige chegaria ao topo. Com Adeus, Minha Concubina, venceu a Palma de Ouro em Cannes (empate com O Piano, da australiana Jane Campion). O filme foi sucesso internacional, indicado ao Oscar de melhor produção estrangeira, porém proibido em sua terra natal. Não é difícil entender por quê.

Adeus, Minha Concubina narra a saga de Douzi e Shitou, dois atores da Ópera de Pequim formados pela Academia Toda Sorte e Felicidade desde crianças.

Depois de chegarem ao estrelato como protagonistas da ópera Adeus, Minha Concubina, eles caem em desgraça ao serem impedidos de atuar pelo regime de intolerância imposto pela Revolução Cultural, que proibiu as expressões culturais seculares do país, antes consumidas e patrocinadas pelas classes dominantes.