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A criação, paginação e edição da "literatela" têm que ser pensadas para a leitura em computador, internet, e-readers, ipads e ipods da vida. Deve-se ter em mente a arquitetura da construção tecnológica e todas as suas possibilidades. Nada impede, por exemplo, que em um determinado momento haja uma ilustração, que pode ser animada e com som. Esse é um passo mais à frente e então já começamos a falar na literatura feita especificamente para o computador e não mais para o livro impresso. Mas é uma possibilidade, mais que isso, é o futuro que já chegou.

O escritor japonês Ryu Murakami lançou o livro " A Singing Whale" exclusivamente para iPad, iPhone e iPod Touch - o que significa venda exclusiva na loja da Apple, a iTunes. A história sobre baleias jubarte que cantam juntas num estilo parecido com o canto gregoriano, descobertas no Havaí, se passa em 2022 e o livro tem ilustrações animadas, além de música do compositor japonês Ryuichi Sakamoto.

O clássico "Alice no País das Maravilhas" também ganhou uma versão especial para o iPad. Uma versão animada. Melhor do que explicar, é você poder clicar em http://bit.ly/9QLYk5 para ter uma ideia melhor.

Ah, as crianças vão adorar esta nova possibilidade. Há outros exemplos de livro infantil, como este Grimm's Rumpelstiltskin for iPad que você pode dar uma olhada lá no YouTube: http://bit.ly/c1FDlU.

Também há problemas que permanecem em qualquer uma das formas. A Apple, que representa a vanguarda tecnológica, é muito conservadora em questões morais. O livro Ulisses, clássico escrito por James Joyce no início do século passado e que chegou a ser proibido na Inglaterra quando do seu lançamento, por causa das cenas mais picantes, sofreu neste ano mais um episódio de censura, em tempos de iPad. Um desenvolvedor criou um aplicativo (um programa de computador especial para o tablet) que apresentava o livro em versão de quadrinhos, chamado Ulysses Seen. A Apple, depois de aprovar o aplicativo o proibiu porque mostrava cenas de nudez. Só depois de canceladas estas cenas é que o aplicativo foi novamente colocado à disposição do público. Você pode ver na internet no seguinte endereço encurtado (clique aqui).

A "literatela" encontrará sua forma própria. E será de grande ajuda sempre que um autor colocar no seu texto um trecho de música (pense que alegria ler Alta fidelidade, de Nick Hornby podendo, a um clique, escutar as músicas que fazem parte das listas dos personagens) ou uma referência a um lugar (que tal um passeio com Leopold Bloom pelos locais descritos em Ulisses, de Joyce?), ou a menção a um outro autor (as obras filosóficas se transformariam em verdadeiras enciclopédias), ou ainda referências a obras de arte (características e detalhes de uma pintura e seu autor, ou passeios virtuais a museus).

Democraticamente, estará à disposição de autores venerados e inseridos no cânone da crítica e também daqueles que não ganham boas apreciações críticas, mas em contrapartida, são adorados pelos leitores (pense nas possibilidades em livros como O código DaVinci ou Harry Potter).

As objeções

É claro que a objeção mais fácil de se fazer é que ainda não inventaram nada mais prático do que o livro para se ler. Concordo. No entanto já não falo mais em apenas ler, mas também em ver, ouvir e, mais à frente - quem sabe quando? -, em cheirar, tatear, lamber. Outra objeção - que aceito, assim como também aceito a evolução inevitável - é que não há nada mais criativo e cativante que a literatura tradicional. Por mais explícito que seja o escritor, tudo é montado na mente do leitor e na sua capacidade de imaginação numa espécie de jogo que o aproxima muito de ser também um criador na hora em que lê. É um sentimento diferente do cinema ou do teatro em que pouco sobra para ser completado pela imaginação de quem assiste (televisão, então, nem se fala). Nesse sentido, a literatura é mais próxima da música, por mais paradoxal que seja - em que se despertam sentimentos sem que haja a necessidade da palavra. Ela depende e é bastante auxiliada pela intuição e imaginação de quem recebe, quase tanto quanto de quem a produz.

Já o cinema ou o teatro seriam formas de recepção mais passivas - e aqui eu falo da representação teatral e da projeção do filme, pois as duas artes também têm suas versões impressas, sejam nos textos das peças ou nos roteiros dos filmes, aí então comparadas à literatura tradicional, apesar das suas especificações de signos, pois são escritos - isso quando não adaptados de textos puramente literários - para serem montados em um outro tipo de linguagem.

A "literatela" poderia vir a ser também uma forma mais passiva, pois é mais explícita ao mostrar ao alcance de um clique coisas que poderiam ser imaginadas. Ela ficaria mais informativa e menos imaginativa. Pode ser, mas quem disse que cinema e teatro são menos arte ou artes menores? A "literatela" também não o será quando encontrar seu caminho e afastar-se mais da literatura tradicional.

Ainda quanto às objeções acima, pode-se alegar que é desconfortável ler textos longos em um computador. Pode ser, mas para uma geração de crianças que cresce em frente a essa maquininha, é a coisa mais normal do mundo.

Talvez seja mais fácil para eles ler algo em um computador do que em um livro. Há também que se considerar que inúmeras pessoas, sejam executivos, professores, intelectuais, jornalistas e até mesmo escritores já passamos mais tempo em frente a um computador do que em frente a um livro. Significa que, querendo ou não, já lemos muita coisa nas telinhas, talvez até mais do que em veículos impressos.

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