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Lá em casa tinha um single com "Disparada", a música que – aposto – todo brasileiro um dia cantarolou. A gente ouvia bastante. E ouvia também um sonoro pschiiiiit a cada vez que o Jair Rodrigues aparecia no programa de tevê O Fino da Bossa, ao lado da Elis Regina. "Já repararam como o tio José imita o Jair?", dizia minha mãe. É verdade – José, um português, se naturalizou brasileiro imitando os trejeitos do cantor e compositor que ele tanto amava.

Acho que o Jair só deixou de ser uma entidade hiperlocal – tão reverenciado em nossos domínios familiares quanto o Menino Jesus, Santo Antônio e a Senhora de Fátima – no dia em que entrei na faculdade de Belas Artes. Uma professora, iconoclasta, disse que achava "chata" a fase da Elis girando os braços, como se fosse alçar voo, tendo a seu lado um histriônico Jair Rodrigues. Fechei com ela e risquei o ídolo de infância do meu caderninho.

Anos depois – pelos meus cálculos, 1995 – já trabalhando como repórter do Caderno G da Gazeta do Povo, ficamos sabendo que o Jair Rodrigues estava na portaria do jornal. Em geral é o jornalista que tem de correr atrás do artista, mas estávamos falando de um copernicano. A visita, óbvio, foi uma festa. Vi mais gente emocionada do que no dia em que o Dedé Santana, de Os Trapalhões, cruzou a redação, esbanjando simpatia.

O Jair Rodrigues, com perdão ao trocadilho infame, não era de passar em branco. De cara, perguntou onde ficavam as zeladoras. Queria ir até lá. E lá era uma salinha, atrás do parque de máquinas, onde naquela hora as "tias da limpeza", como dizíamos, almoçavam suas marmitas. "Prepare o seu coração, pras coisas que eu vou contar..." cantou, na porta do departamento. Era o início de seu show particular, para as tias. Se bem lembro, a canja incluiu um trecho de "Deixe que digam, que pensem, que falem...".

Tudo terminou em abraços – lindo de ver. "Meu Deus, é o Jair Rodrigues, aqui com a gente..." diziam a Maria mãe da Izilda; a Maria que limpava a sala do doutor Francisco, a Dorvalina – irmã da Maria; a Cida, grande amiga; a Matilde e uma outra de quem miseravelmente esqueci o nome. Foi um daqueles momentos em que a gente entende o artista sem precisar de entrevista, entende?

Certo estava o tio José, em imitar o Jair Rodrigues. Fez a coisa certa. Schiiittt.

Lembranças

Música e (só) amizade

Foi ao lado da amiga Elis Regina que Jair Rodrigues ficou conhecido como um dos grandes nomes da música brasileira, nos anos 1960. A dupla apresentou, entre 1965 e 1967, o programa O Fino da Bossa, na Record. Os famosos duetos com a "Pimentinha" renderam três volumes do disco Dois na Bossa. Além das gravações, os dois viajaram juntos pelo país para shows, e, ao longo da carreira, Jair sempre incluía alguma canção de Elis no repertório de suas apresentações.

De pernas pro ar

"Se eu não for o homem mais feliz deste planeta, eu sou um deles." Jair Rodrigues fazia jus a esta declaração, feita na última entrevista que concedeu à Gazeta do Povo, em 24 de março. O bom-humor era uma das marcas do artista, inclusive em suas performances no palco. Quem esteve na Virada Cultural em novembro de 2011 (foto) deve se lembrar: o cantor brincou com o público e fez todo tipo de estripulias no Palco Riachuelo: plantou até bananeira.

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