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Crianças na Escola do Balé Teatro Guaíra: além das aulas de dança, técnicas de improvisação | Walter Alves / Gazeta do Povo
Crianças na Escola do Balé Teatro Guaíra: além das aulas de dança, técnicas de improvisação| Foto: Walter Alves / Gazeta do Povo

Com um pouco de sacrifício, Dora de Paula Soares pode trazer um bailarino de renome internacional para dançar em um espetáculo do Studio D1, que criou há 33 anos. Mas ela não teria recursos para fazer o mesmo convite a uma celebridade qualquer de capa de revista. Não que pretenda fazer isso.

A ex-bailarina de 76 anos, que dá aulas diárias a uma turma de mais de 60 alunas de todas as idades, usa o exemplo para explicar por que a dança clássica já não parece tão atrativa para as garotas quanto no passado. "A não ser que ela tenha uma vocação irresistível", diz.

Como teve Patrick Lorenzetti, de 16 anos, filho de um funcionário da escola. Ele começou a dançar ali, primeiro hip-hop, depois balé clássico, até ser convidado para fazer parte do elenco do Balé Teatro Guaíra. "Hoje ele tem contrato e ganha um salário, mas isso não é tão sedutor para uma menina de classe média alta", analisa Dora.

Por verem na dança um meio de ascensão sociocultural, jovens de baixa renda parecem se dedicar com mais afinco à dança. "Consequentemente, os resultados apresentados ao final de sua formação são melhores do que outros", explica Cesar Lima, da Escola do Teatro Bolshoi no Brasil. Ele lembra de diversos ex-alunos que hoje estão empregados e bem-sucedidos no mercado de trabalho. "Posso citar Rafaela Fernandes, que está no Grupo Corpo, de Belo Horizonte, e muitos outros bailarinos empregados em companhias no exterior."

Nas academias, não há escassez de meninas matriculadas. Pelo contrário. Mas quantas se tornam bailarinas de fato? Muito poucas. E isso não acontece porque a sociedade atual parece dar mais valor aos 15 minutos de fama de um Big Brother do que ao prestígio conquistado com sangue, suor e lágrimas por um bailarino.

Dançar exige não somente sacrifício, mas todo o tipo de aptidões, do imprescindível talento às formas físicas adequadas. Dora conta que, a cada mil garotas que passam pelo Studio D1, uma se destaca. "Tenho uma aluna de 12 anos com todas as qualidades para se tornar uma bailarina. E ela ainda conta com o apoio dos pais, o que é raro", conta. Além do talento, condição primeira, para ter futuro como bailarino é preciso ser aplicado, disciplinado e, como se tudo isso não bastasse, ter um corpo esguio e longilíneo.

Há quem tenha se lembrado, ao ler estas linhas, do sofrimento vivenciado por Nina, protagonista de Natalie Portman no filme Cisne Negro (leia texto na página 3), uma bailarina que enlouquece em seu desespero para desempenhar com perfeição tanto o Cisne Branco quanto seu duplo maligno.

Dora discorda de que a opressão sentida pela personagem faça parte do universo do balé. "Essa moça é um tratado de patologia: é anoréxica, esquizofrênica, se automutila, tem uma mãe opressora e um diretor abusado. Não seria bem-sucedida em profissão alguma", opina.

Eleonora Greca concorda. "As dificuldades enfrentadas por um bailarino são as mesmas de qualquer profissão", diz.

Sim, um bailarino enfrenta horas de prática, por vezes, engolindo a dor, em sua busca pela perfeição. "A dança é como um esporte de ponta. Só não ganha em nível de exigência da ginástica rítmica e artística", analisa Dora. "As escolas de dança são muito duras, e isso é necessário, pois não vai persistir quem não tiver autodisciplina. Quantas vezes um bailarino dança machucado e precisa estar firme?", diz Eleonora.

Para Cesar Lima, em todas as áreas de atuação existe o caráter seletivo. "Nem todos podem tudo. O nível de exigência requerido para a formação de um bailarino profissional é altíssimo. E, quanto maior a exigência, maior a qualidade. Vide as grandes escolas do mundo, dentre elas, a Escola do Teatro Bolshoi da Rússia", diz.

As academias, na opinião de Eleonora, deveriam realizar uma avaliação prévia para verificar o perfil dos possíveis alunos e fazer com que os pais sejam corresponsáveis. "Eles não podem querer ser mais que os filhos. Às vezes, a família impõe a dança, e ela se torna um fardo grande para a criança, assim como é muito comum ver pais médicos ou advogados que querem que os filhos sigam sua profissão", analisa. Para a bailarina, também falta um olhar mais atento do professor para o aluno especial e vocacionado.

Corpos democráticos

Quando Dora, que foi bailarina e professora no Teatro Guaíra, abriu sua escola, em 1978, não havia a exigência de um físico perfeito. "Meu lema era: ‘O balé é para todos’, e isso encheu a academia. Hoje, nomes consagrados como a russa Tamara Toumanova e a brasileira Bertha Rosanova não poderiam dançar. Parece que o poder de emocionar está abaixo da necessidade de ser como um junco: forte, longilínea e magra", critica Dora.

A professora não incentiva dieta entre suas alunas. De fato, na turma da noite fotografada para esta reportagem, havia crianças, adolescentes e adultas das mais diversas faixas etárias e tipos físicos. "Mas é claro que, se a menina tiver a aspiração de se tornar uma bailarina profissional, tem de estar com físico adequado", emenda.

A idade também é outro fator restritivo na dança clássica. "Há casos especiais, de pessoas que começaram tardiamente. Mas se tratam de casos extremamente específicos, em que talento e condições físicas e psicológicas eram absolutamente especiais e propiciaram o pleno desenvolvimento das capacidades do bailarino", diz Cesar Lima. Mas nada impede que um aluno dedicado, que comece a dançar mais tarde, possa se tornar um excelente bailarino contemporâneo. Mais magro ou mais gordo, mais velho ou mais novo, as novas linguagens também vêm para ajudar a romper preconceitos. "Hoje, a dança permite que haja corpos democráticos, e as academias devem estar antenadas às novas tendências de dança, preparar seus alunos para o mercado de trabalho", diz Eleonora.

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