Existem algumas formas de prolongar a existência de um espetáculo cênico: fotografar, filmar, escrever uma crítica. Sobre um momento da cena teatral local, pode-se publicar um livro. Todas deixam no ar a sensação de se ver o espectro de algo que só esteve vivo no palco.
Por isso é empolgante que duas jovens tenham escolhido pesquisar o teatro curitibano para inseri-lo num formato inovador.
O recorte das jornalistas Larissa Mayra de Lima (também atriz) e Halanna Aguiar (também musicista) foi a presença da mulher nos grupos, na direção, iluminação, cenografia, figurino e sonoplastia em Curitiba. E a mídia escolhida, um site com o perfil de sete dessas mulheres, entrevistas em vídeo com cada uma delas e três webdocumentários criados a partir do contato com elas.
“Nosso objetivo não era falar das fragilidades do meio teatral curitibano, e sim apontar o legado delas, por entender que falta um registro histórico”, contou Larissa à reportagem.
Ao longo do processo, elas aprenderam com a atriz Rosana Stavis a necessidade de encarar o teatro como profissão, não simplesmente um lugar para alguém fazer “terapia”. A figurinista Amábilis de Jesus, com seu jeito sério e doce, contou do parco acesso ao teatro no interior. Guênia Lemos transitou, tanto pelo mundo quanto pelas diferentes técnicas cênicas, e traz seu olhar peculiar resultante.
Cantora daquelas que gostam de uma bela performance em cena, Karka Izidro tem criado sonoridades principalmente para a Cia. do Abração. A diretora Ana Rosa Tezza trouxe sua “complexidade simples” para as entrevistas, falando muito da ligação pessoal e familiar com o teatro. No mesmo caminho, Olga Nenevê, atriz, diretora e dramaturga aborda a experimentação com a escrita que surgiu em meio a criações mais voltadas para o corpo – e da anestesia de sensibilidade que ela vê no mundo atual.
Iluminadora por acaso, Nádia Luciani dá um dos depoimentos mais tocantes, quando conta da sutil discriminação de que foi alvo no início da carreira, quando havia poucas mulheres subindo em escadas para afinar a luz de holofotes. “Me diziam ‘a, uma mulher iluminadora não deve ser tão mulher assim’”, relembra.
Eduardo Coutinho
Essa confissão perturbadora é o ponto de partida para o vídeo “Gênero em Cena”, que integra a sessão Discursos e Afins do site. O webdocumentário homenageia o filme “Jogo de Cena” (2007), de Eduardo Coutinho, em que as histórias de mulheres comuns são contadas por atrizes como se fossem depoimentos seus.
No vídeo de 16 minutos de Larissa e Halanna, quatro atores foram convidados para interpretar trechos das entrevistas das mulheres de teatro – com alguns resultados bem interessantes.
Outros vídeos mostram os bastidores das conversas e fazem um convite para que o “público assuma seu lugar na plateia”.
“Historicamente, o palco é um espaço artístico de discussão sobre as práticas sociais. Apesar dessa importância, a trajetória da mulher de teatro transita por períodos de proibição e emancipação profissional. O objetivo deste registro audiovisual é reforçar a ideia de que a arte é um segmento que deve ser parâmetro para a discussão sobre a liberdade”, explicam as criadoras.