Fabiula Nascimento em cena de “Velho Chico”| Foto: Caiua Franco/TV Globo/Divulgação

O diretor Luiz Fernando Carvalho fazia pesquisa de locações na cidade alagoana de Pão de Açúcar quando foi interpelado por moradoras locais interessadas no novo projeto, “Velho Chico”, próxima novela das 21h da Globo, que estreia em março. Em poucas palavras, ele resumiu a trama sobre o rapaz obrigado a assumir a fazenda da família após a morte do pai e a enfrentar a mãe, que não aceita seu casamento. “Ah, uma história de amor”, suspiraram as mulheres, satisfeitas.

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A reação aumentou a confiança de Carvalho. “O público gosta de sagas familiares, puxadas pela emoção”, comenta ele em conversa com o jornal O Estado de S. Paulo, após um longo dia de gravações, no interior da Bahia. “Uma boa história de novela é uma grande fábula subterrânea, na qual habitam os conflitos primitivos que geram o drama.” Em outras palavras, o bom e velho melodrama.

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Velho Chico marca o reencontro de Carvalho com diversos artistas que lhe são muito caros. A começar pelo autor do folhetim, Benedito Ruy Barbosa. Juntos, já trabalharam em Renascer, O Rei do Gado, Esperança e Meu Pedacinho de Chão. Entre eles, há a conexão perfeita entre texto e imagem. O diretor volta a se encontrar ainda com o ator Rodrigo Santoro, com quem trabalhou em projetos memoráveis como Hoje É Dia de Maria.

Apesar de preso às gravações da série americana Westworld, Santoro ganhou da HBO uma liberação de dois meses, o que possibilitou participar da novela. Assim, ele estará apenas nos primeiros 24 capítulos, quando a história se passa no fim dos anos 1960. Ele vive Afrânio, filho do coronel Jacinto (Tarcísio Meira), homem rico e arrogante, que controla quase tudo na fictícia Grotas de São Francisco.

Com a morte do pai, logo no primeiro episódio, Afrânio é obrigado a deixar as delícias de Salvador e assumir a fazenda - não apenas financeiramente, mas também o seu antiquado modus operandi, ou seja, um regime quase escravagista.

Afrânio herda também uma rivalidade de sua família com a do Capitão Rosa (Rodrigo Lombardi), homem de conduta humanista. E, no meio das diferenças, surge o Rio São Francisco, cuja sobrevivência não é valorizada pelo clã de Afrânio, ao contrário de seus rivais. “Benedito trata desse assunto como um misto de melodrama e lirismo”, observa Luiz Fernando Carvalho. “Velho Chico vai conversar com o gênero humano. Vejo nesse texto as características de um clássico, em que o barroco se une à atualidade, época da segunda fase da novela.”

Arquiteto de formação, mas profundo conhecedor da literatura, Carvalho tornou-se o ourives de um estilo peculiar e precioso. Por causa disso, decidiu que toda essa primeira fase seria gravada em áreas verdadeiras, o que o levou a filmar em Mossoró (RN), Delmiro Gouveia (AL) e em um portentoso casarão histórico, do século 18, com suas palmeiras imperiais, na ilha de Cajaíba, próxima ao município baiano de São Francisco do Conde.

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Em todos os lugares, a equipe técnica da Globo recriou os detalhes perdidos com o tempo, permitindo que os atores fizessem uma espécie de viagem no tempo. “É possível se sentir mesmo naquela época”, conta Julio Machado, o capataz Clemente. “E, como Luiz gosta de improvisar a qualquer instante, é preciso estar sempre preparados, dentro do personagem”, completa Selma Egrei, que vive Encarnação, mãe de Afrânio.

De fato, a mente do diretor está em eterna ebulição criativa, vislumbrando na hora cenas que não constam no roteiro. Isso só é possível porque ele domina totalmente o enredo. “A novela tem elementos shakespearianos, pois Afrânio é como Hamlet, o príncipe dividido entre ser ou não o herdeiro do pai, além de se apaixonar por uma mulher que seria sua Ofélia”, comenta. “Na primeira fase, a novela é um retrato idílico do que perdemos e, na segunda, o que sobrou depois de tanta agressão ao rio.”