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 | Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo
| Foto: Rodolfo Bührer/Gazeta do Povo
  • Carlos Coraiola (à direita) com o filho, César: paixão por carros é herança

O pai de Carlos Alberto Coraiola nunca teve um Ford, embora tenha passado boa parte de sua vida voltando para casa impregnado da graxa, oriun­­da da oficina mecânica em que trabalhava, especializada em carros da montadora norte-americana. O filho o acompanhava. Vez em quando até atendia aos pedidos esperados de "me passe tal ferramenta". Então, quando questionado sobre o primeiro momento em que a paixão por automóveis surgiu, o Coraiola filho, hoje, lembra do ronco da­­quele motor V8. Único e inesquecível para uma criança com 10 anos de idade.

Apesar do momento pouco amistoso para os automóveis – em termos éticos, talvez, já que na questão econômica tudo vai bem, obrigado –, parece que em alguns casos é uma relação genuína e passional a marca característica da ligação entre homem e carro. Em especial entre os colecionadores, que em alguns casos chegam a dedicar seu tempo mais aos carros do que à família. Ou a dizer que "desaparecem junto" se porventura algo acontecer a seus pupilos motorizados.

Coraiola, curitibano aposentado, tem 11 carros em sua casa. Em maioria, carros Ford, de épocas em que o automóvel era mais pensado como utensílio funcional do que como ostentação pública. São fordinhos 1936, 1948, 1951, 1956, 1975...

Em sua adolescência, quando o sonho de guiar um carro ganhava corpo, somente um "madeireiro rico de São José dos Pinhais" desfilava com um Ford Crown Victoria. Aquele carrão, que ontem balançava nos paralelepípedos da Avenida Rui Barbosa, hoje está estacionado em sua garagem particular. Mais do que um sonho real – que envolvia, sim, o simbolismo, seja econômico ou até mesmo de status social –, o carro na garagem eterniza um momento, do qual faz parte o cheiro da graxa e o som grandioso de um V8 roncando.

Sem rodeios, Coraiola diz que os carros são parte da sua vida. "Não me vejo sem um automóvel. Desde que comprei o meu primeiro não sei o que é andar de ônibus", confessa. Pode ser um disparate para quem vê o carro como um objeto de lata que atrapalha o fluxo da vida nas ruas, mas também é uma justificativa legítima, tendo em vista o histórico familiar do entrevistado.

Para o comerciante Roberto Biesemeyer, a ligação íntima com o automóvel começa em escala menor, com a coleção de carros de brinquedo da Matchbox. Carros em miniatura povoavam tanto a estante do quarto quanto a cabeça daquele jovem, que comprou sua primeira "baratinha" (um Ford 1929) em 1960. "Sempre pensei em ter um de verdade", diz o colecionador, dono de três carros antigos. Novamente, a relação íntima com um objeto é o que faz com que o curitibano se dedique, às vezes, mais ao carro do que à própria família nos finais de semana.

"Descendo a estrada da graciosa com meus ‘carrinhos’, olhando aqueles painéis antigos, parece que estou na década de 1950", aponta o curitibano, também confirmando a possível efemeridade do automóvel nos tempos modernos – ou será que veremos coleções, nos moldes de hoje, de carrões com rodas metálicas e vidros escurecidos? "Os carros de hoje parecem que não conseguem te cativar", diz Biesemeyer.

O caso de Fernando Almeida é de paixão arrebatadora, mesclada a algum tipo de interesse específico pela velocidade ou originalidade. Tal qual um fã de banda que coleciona todos os discos do grupo, Almeida tem oito Gols GTI – um dos primeiros modelos esportivos do Brasil. Um de cada cor disponibilizada no Brasil, de 1989 a 1994.

Para achar novos exemplares do carro, o gerente de vendas já fez loucuras como voar pela manhã para Fortaleza para ver o estado de um automóvel e retornar para trabalhar no mesmo dia. E, para o gaúcho, uma relação interessante se estabelece. Sua explicação para o amor que nutre pelos carros vai além do mero colecionismo: "Serve como veículo para novas amizades". "Tenho amigos no Brasil inteiro", diz o gaúcho, dando créditos à sua circulação enquanto colecionador.

Os problemas que se desdobram – número de mortes em acidentes, tempo para deslocamento no trânsito, gastos com carros maiores do que com educação, – parecem estar lá fora. Mas, como em todo sentimento incontrolável, uma espécie de cegueira arrebata os apaixonados. Então, eles olham mais para o retrovisor do que para a estrada à sua frente.

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